sexta-feira, 25 de julho de 2014

Uma Fotografia



Uma fotografia

O Baixinho do meio é Mané Roncôio, filho de seu Bida da caminhonete, tido como o maior punheteiro da vida. Mané sabe contar umas histórias de bucetinhas raspadas como ninguém. Até que um dia Dona Madalena pegou ele descascando uma na intenção de Dulcinete, gostosona do quarto ano, grande jogadora de peteca.

Era bainha demais na saia plissada, a cada pulo mostrando a calcinha suada, as cochas cobertas de rara penugem loura, o montinho de pentelhos extravasando o elástico. Dulcinete sabia que era galada nos trezentos e sessenta dias do ano. O pobre do Mané foi alvo de rebaixamento moral na formatura do Hino Nacional, ao final das aulas, posto num canto do Ginásio como exemplo de degradação ao vicio da punheta, prática proibida pelo pároco local e pela ciência vigente como deletéria e condenável. Pra nós ele confessou que nem gozava, ficava nos estertores do primeiro soluço, na coceirinha da primeira lágrima.

Ao lado dele, chupando manga pelo furinho vem Cacáio, os filetinhos de catarro escorrendo do nariz. Cabra bom esse Cacaio. A vó dele, D. Santinha, doceira pras bandas do Caiçá, compra latas de leite ninho e goiabadas vazias pra botar seus doces batidos. Vendi muitas. Cacaio tem uma caixa de charuto Suerdieck cheia de dinheiro de cigarro, tudo dobradinho em camaços. Tem Yolanda que vale mil, um bolo de Columbia que deve dar uma baba e o resto é Continental e Astória, valendo merreca.

Todo domingo, na porta do Cine Brasil, a gente leva o dinheiro que tem para apostar no pio, comprar gibi velho ou trocar por estampas Eucalol, que também rendem bem. Uma Eucalol de passarinho conhecido Valia dez Hollywood.
Eu tinha uma Camel de valor incalculável que ganhei de um gringo na pensão de Raimunda Filipe, mas troquei com Cacaio por uma latona de araçá batido e duas cascas de bala 38. Saí ganhando. O araçá eu o comi em dois dias e as cascas de bala, enfiadas na cartucheira, davam-me o direito de escolher o papel de Hopalong Cassidy nas brincadeiras de Cowboy. Nunca mais tive de fazer o papel de doidelo, nunca mais.

Doidelo era papel para Carlinhos de Zé do Arroz, aquele ali de camisa cáqui faltando dois botões. Só vive assim destratado, com os fundilhos sujos a barriga sobrando pelo cós da calça. Dizem que não conhece o pai, mas é Zé do Arroz cagado e cuspido. Olha a cara de bolachão dormido, o olhar esbruguelado de quem viu o cão, as pernas muito curtas para tanta bunda. Só pode ser filho de quem é.

A mãe dele vende gasosa na feira. Tem de maçã e baunilha, em dois frascos de vidro enormes, onde ela enfia uma mangueirinha engatada num fole de pedal. Quando ela pisa no pedal a espuma sobe nos frascos, uma maravilha! Tentei fazer isto em casa com uma bomba de bicicleta, mas acabou numa melação danada! Faltou o bicarbonato, que eu nem sabia o que era. Na feirinha do Natal a gasosa de D. Mariinha passa a se chamar Amorosa e sai que é uma beleza, porque todo mundo no Natal come um prato de arroz de galinha e tem que

Ali, sentadinhass na calçada alta, estão as meninas do Mestre Gregório. São três negras vitalinas dignas do mais absoluto respeito, a conferir pelo camafeu que ostentam, todas elas, com a efígie do venerando pai, saudoso mestre da filarmônica local. Nunca casaram, porque escolheram demais. Uma não queria se entregar a um pretendente menos apetrechado que os das outras. Valquíria, a caçula, inda rolou numa história escandalosa que teria acontecido no muro do Hospital com um caixeiro viajante de “A. Fonseca” chamado Miro, mas a história ficou encubada. Miro mudou de praça e todo mundo fez de conta que nada houve. Valquíria é aquela que está sorrindo na fotografia.

a rabada, ostentando um ar de príncipe das Astúrias, estou eu com a calça tergal que me distingue e um sapato Vulcabrás, novinho. Tenho a cara escovada e o ar empertigado. O queixo proeminente e um malajambrado pimpão ameaçando derramar-se sobre a testa. A brilhantina o mantém ereto.

Aquele sou eu com o peito juvenil arfando sob o escapulário, um misterioso rapaz se achando a esperança do mundo.

Amaral Cavalcante – 04/02/2013

Crédito maluco, mas obrigatório: O Clic Rolleiflex teria sido feito por Barbosa Guimarâes, o moderno fotógrafo de Simão Dia,s nos idos 60.

Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, 4 de julho de 2013.

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