Marcelo Déda.
Do Livro ‘Memórias de Políticos em Sergipe no Século XX:
Marcelo Déda’
Texto: Osmário Santos/Foto: Divulgação.
Marcelo Déda Chagas nasceu a 11 de março de 1960, em Simão
Dias, Sergipe. Seus pais: Manoel Celestino Chagas e Dona Zilda Déda Chagas.
O sr. Chagas era funcionário do Fisco Estadual na época em
que os postos fiscais da receita estadual consistiam numa pequena casa na beira
da rodovia e uma corrente em sua frente para liberar ou não o tráfego de
veículos. Ele tinha, como responsabilidade profissional, o posto localizado
entre a cidade de Simão Dias e Paripiranga, fronteira com a Bahia.
O processo da liberação da referida corrente era simples:
para os carros de passeio, trânsito livre. Já para os caminhões, sem dispensar
os que conduziam feirantes, o responsável do posto, ao avistá-lo, trancava a
porteira fiscal. Desse antigo processo adotado pela fiscalização estadual,
Marcelo Déda tem bucólicas lembranças, pois, em momentos de sua infância, vez e
outra, lá estava perto do pai, acompanhando-o no abrir e fechar a tal corrente.
Guarda, com carinho, até hoje, uma foto em que menino estava brincando com a
corrente do posto.
O sr. Chagas é de origem camponesa. O avô de Déda tinha uma
propriedade rural, um sítio na cidade de Paripiranga, perto de Simão Dias.
Dessa proximidade com a cidade baiana é que o sr. Manoel Celestino Chagas
conheceu D. Zilda. Contava com 17 anos de idade, e a jovem Zilda, com 16. O
namoro não recebeu o apoio do pai dela, mas não foi motivo de impedimento para
que o casamento fosse concretizado.
Marcelo Déda é o filho mais novo dos cinco filhos do casal.
Todos eles foram criados envolvidos em clima de muito amor e preocupação
permanente com os estudos. Seus irmãos são: Cláudio, conhecido na família como
Cacau, hoje é juiz de Direito em Aracaju; Maria Aparecida é casada com o primo
Aldo Déda; Selma e Maria do Carmo, esposa do advogado Edson Ulisses.
Homem simples, o sr. Chagas não teve acesso à educação
superior, embora tivesse concluído o primário. Sua caligrafia fascinava os
filhos. Era ele que, ao final da tarde, passava a limpo todos os pontos dos
filhos, passados pelos professores em sala de aula. O filho Marcelo que
acompanhou esse procedimento desde pequeno também foi beneficiado pela
caligrafia do pai. Meu pai teve uma noção muito perfeita do significado da
educação na vida de uma pessoa.
Houve um envolvente relacionamento entre pai e filho, que
até hoje persiste. Seu pai continua gozando de vida e saúde e Marcelo conta um
episódio interessante:
Até hoje, eu, já com quarenta anos de idade, não sei guiar.
Meu pai não tinha carro e ele dizia sempre: ‘não pegue carro de amigo, porque
se você provocar um acidente, vai ser difícil, vai complicar a nossa vida
aqui’. Até hoje terminei não aprendendo. Casei-me com a minha primeira esposa,
Márcia, e ela sabia dirigir. Depois me elegi deputado estadual, e a Assembleia
Legislativa tinha motorista. Terminei me esquecendo. Mas eu vou aprender. Eu
tenho dois desafios para o ano 2000: um é o de ganhar a prefeitura, e o outro,
é aprender a dirigir.
Déda sente muito orgulho do pai que sempre dizia aos filho. Eu
posso ir a qualquer estabelecimento comercial porque eu tenho crédito. Eu não
apenas compro à prestação, como sempre faço questão de quitá-las antes de seu
vencimento.
Os pais viveram até o ano de 1969 na cidade de Simão Dias.
Com a aposentadoria, sr. Manoel trouxe a família para a Aracaju, graças ao
direito de comprar a casa financiada outorgado aos servidores públicos
estaduais através de sorteio no governo de Lourival Baptista. Nessa época, as
irmãs de Déda já estavam casadas. Os outros três filhos vieram para Aracaju.
Mas isso não aconteceu, porque Déda resolveu ficar em Simão Dias, morando com a
sua tia Eunice, uma pessoa de grande importância na sua formação. Só deixou a
cidade em que nasceu no início de 1973.
Da tia Eunice, agradece o lado da sua formação religiosa.
Foi por suas mãos que foi conduzido à Igreja Católica Apostólica Romana. Eu
ajudava missa, eu fui coroinha, subia na imensa torre da igreja de Simão Dias.
Eu ia bater o sino lá em cima, às 5h30 a fim de chamar os fiéis para a primeira
missa da manhã que acontecia às 6h. Era uma aventura! A torre era cheia de
morcegos, a escada era antiga e rugia. Minha tia dizia que, de vez em quando,
aparecia a alma do Padre Madeira, um padre antigo de Simão Dias.
Déda confessa que não sentiu vocação para padre e diz que,
no momento atual, embora não seja católico praticante, dentro de si, tem
impregnado uma fé inabalável, graças a esse período de convivência com a tia. A
formação católica tem uma força muito grande em minha vida, porque, desde pequeno,
ela me fazia ler os evangelhos, fazia-me ler livros religiosos.
Sua primeira ideia de combate à injustiça, em defesa da
igualdade das pessoas, não foi uma ideia que adquiriu da política em sua
militância no PT, mas da formação cristã que teve na casa da sua tia Didi, como
carinhosamente chamava a tia Eunice.
A minha ideia é que o cristianismo é incompatível com a
miséria, é incompatível com a desigualdade, incompatível com a arrogância e com
a opressão. É uma marca de liberdade, de uma libertação muito forte.
D. Zilda era uma autêntica matriarca, mulher de personalidade
muito forte, muito bonita, muito inteligente e defensora ao extremo dos filhos.
Compara esse espírito de defesa dos filhos, como uma águia defendendo seu
ninho. É filha de José de Carvalho Déda que, para o neto, foi o homem mais
inteligente que conheceu em sua vida. Um advogado provisionado, um rábula de
reconhecimento além Sergipe. Na prática da advocacia, mesmo sem ter ido a
nenhuma escola, como era comum naquele tempo, ao lado de Dudu da Capela, eram
os dois maiores advogados criminalistas de Sergipe.
O convívio com o avô, Carvalho Déda, é mais outro ponto de
sua formação, principalmente, pelo acesso que teve a sua imensa biblioteca.
Meus primeiros livros foram lá na biblioteca de Carvalho Déda no período em que
estudei o ginásio. Eu o chamava de Papai Zeca.
Além do trabalho de rábula, seu avô tinha o jornal “A
Semana”, rodado em máquinas manuais do início do século passado.
Trabalhar com a impressora manual era serviço pesado, e, com
isso, meu pai dizia para os filhos: “quem não estudar vai para a tipografia”.
Isto significava rodar a imensa antiga impressora, que tinha uma roda onde era
colocada a tinta, de aproximadamente dois metros de diâmetro.
Um fato interessante sobre o jornal editado pelo avô é que
ele fazia o comentário do cotidiano através da charge que ele mesmo preparava
em processo de xilogravura. Enquanto estava à espera dos clientes de suas
causas jurídicas, ficava a manipular o canivete na madeira, graças a sua
habilidade com as mãos. Também fazia brinquedos em madeira, para os filhos e
para os netos. Déda não esquece da alegria quando recebeu um Mané Gostoso, um
boneco sustentado em duas varetas e que faz piruetas, quando é manipulado com
uma das mãos.
Outro lado forte do avô era o seu trabalho como folclorista.
Ele é o autor de um dos clássicos do folclore sergipano: “Brefaias e
Burundangas”. Também foi político, intendente de Simão Dias, cargo que hoje
corresponde a prefeito, além de deputado estadual por duas legislaturas. Da
passagem de seu avô pela política, Déda diz existir uma singularidade
envolvendo a ambos e as duas Constituições democráticas de Sergipe.
A primeira, elaborada em 1947, contou com a participação de
meu avô Zeca. A segunda, escrita em 1989, contou com minha presença. Teve um
Déda assinando em 1947 e um Déda assinando em 1989. O meu avô Zeca exerceu
grande influência em minha vida política, pelo peso intelectual que ele teve,
pela exigência e por seu comportamento na política de homem de palavra. Muitas
vezes, em minha passagem pela Assembléia Legislativa, o velho deputado Djenal
Tavares de Queiroz me dizia: “seu avô era assim como você. Ele dava a palavra e
cumpria”.
De sua mãe, Déda herdou o lado da liderança e o de ter
orgulho do que se consegue ser e não abrir mão dos seus direitos.
Quando eu perdi a eleição em 1990, ela me disse: “meu filho,
no momento mais difícil, no momento em que estiver mais oprimido, não dê o
braço a torcer. Abra o seu guarda roupa, escolha a melhor roupa que você tiver
e saia. Mas lembre-se: não abaixe a cabeça”. E essa idéia de não desistir de
minha mãe foi vital para mim. Mais ainda, foi a lição de que você não deve
baixar a cabeça quando estiver certo. Ela completava esse sábio conselho
dizendo: “um dia as pessoas irão reconhecer que você hoje está certo”. E essa
coisa de fato tem sido, na minha vida, de muita importância.
A infância de Déda foi a de um menino do interior, com
brincadeiras da maior simplicidade, algumas delas já não mais conhecidas pelas
crianças de hoje. Jogou furão, bola de gude e não desprezou o futebol.
Estudou o primário no Grupo Municipal Fausto Cardoso.
Cecília foi a sua primeira professora. Passou um tempo nas Escolas Reunidas de
Simão Dias, onde teve uma grande frustração. A primeira vez em que fez uma
prova, a professora advertiu-lhe que iria ganhar cem se saísse bem na
avaliação. O menino Marcelo delirou, pensando que iria ganhar uma cédula de cem
mil réis.
Pensou que daria para comprar muitas balas. Fez a prova e,
ao recebê-la, cobrou pela nota. Quando a professora disse-lhe que a nota já
estava na prova, tamanha descoberta foi motivo de frustração. Muitas vezes a
coisa tem dois significados. Não é aquilo que você pensa.
Ainda em Simão Dias, conheceu toda emoção de um amor
platônico. Marta fez o coração de Marcelo bater mais forte, mas só de desejo.
Ela era a filha do gerente do Banco do Nordeste e tinha de doze a treze anos de
idade. Ele se apaixonou perdidamente. A paixão terminou em versos mal escritos,
em sofrimento sempre distanciado.
O programa do sábado do tempo vivido em Simão Dias era
comprar boi de barro na feira para brincar de fazenda. Também ia se divertir
com os primos na tipografia do avô Zeca ou na tenda do tio João Déda, uma
espécie de celeiro que, conforme a tradição da família da mãe, vendia couro.
Também não esquece das boas brincadeiras de correr na Praça São João e a de
brincar com tanajuras.
Simão Dias era o seu mundo. Naquele tempo, a coisa
interessante que marcava a cidade era o fato de que a cadeia pública, o hospital
e o cemitério eram todos vizinhos.
Como a cidade era marcada pela pecuária, a coisa mais bela
do mundo para Déda era ver, ao final de uma tarde de inverno, a boiada passar
pelas ruas da cidade, puxada por vaqueiros com suas roupas tradicionais de couro
e ouvir seus cânticos típicos do abôio. A imagem do sertanejo forte, habilidoso
no cavalo, conduzindo a boiada, correndo atrás da rês. Foi uma infância que me
deu uma grande força psicológica. Tive uma infância muito feliz.
Já tendo feito a quinta série no Colégio Carvalho Neto,
decidiu vir para morar com os pais em Aracaju, precisamente, na rua Socorro.
Matriculou-se no Atheneu na sexta série. Foi se adaptando à
cidade e ao colégio, até quando sentiu o mundo cair sobre suas costas. Por
falta de seriedade nos estudos e porque brincou demais, foi reprovado na oitava
série. O fato transformou-se em uma das maiores frustrações de sua vida, ao
perceber que os colegas se adiantaram e ele ficara na oitava série.
Na época, existiam alguns colégios particulares que
facilitavam o crédito. Ao fazer o pedido de transferência de matrícula, ouviu
de seu pai uma grande lição que não esquecerá jamais. “Não! Você perdeu, vai
ter que pagar pelo seu erro. Você vai repetir o ano, porque não vai adiantar
você ir para qualquer escola, pois não irá compreender o significado da
reprovação”.
Déda chorou muito, sentiu muita dor dentro de si e, a partir
daí, resolveu enfrentar os estudos de uma outra forma.
A dor na minha vida serviu para me ensinar. Nunca foi um
sofrimento desperdiçado. Sempre tinha uma grande lição, e, dessa lição, eu
tirei força para dar passos significativos depois.
Como não havia vagas no Atheneu para alunos repetentes, foi
estudar em curso noturno, no Colégio 8 de julho, também da rede estadual de
ensino, que funcionava na Rua Vila Cristina, onde hoje é a Secretaria de
Administração.
Estudar aos dezeseis anos de idade, junto de pessoas mais
velhas do que ele, alunos de vinte, trinta, quarenta anos que iam sentar num
banco escola pela noite após uma longa jornada de trabalho, provocou-lhe um
grande choque. No íntimo, estava sempre a refletir: meu pai me dá condições de
eu viver sem trabalhar, e eu perco um ano. É muita irresponsabilidade.
Esse período de estudos no 8 de julho foi o seu primeiro
contato com a classe trabalhadora de uma forma mais direta.
Fiz belas amizades. Assisti a uma tragédia. Era colega meu
um funcionário da Energipe, cujo nome não me lembro. Numa bela noite, nós
chegamos à sala de aula e vimos que sua carteira estava vazia. Ele era um homem
casado, tinha uns vinte e sete anos. Tinha sido eletrocutado ao fazer uma
manutenção de uma linha viva. Isso foi muito marcante para mim, pois mostrou
que, se alguns faziam todos os esforços e ainda tinham tempo para estudar, eu
tinha era mesmo que mudar minha maneira de encarar os estudos.
Na esquina da rua Socorro, bem na proximidade de sua casa,
havia a barbearia do sr. Edgar Ribeiro, um comunista histórico. Um barbeiro que
cortava o cabelo em plena época da ditadura, ouvindo, à noite, a Rádio BBC de
Londres. Uma figura que, segundo Déda, pelo seu lado belo, se confundiu com a
esquerda de Sergipe. Sempre de bem com o rádio, nele acompanhava as seções da
Assembléia Legislativa, transmitidas, na época, por uma das emissoras de
Aracaju.
Exatamente na barbearia do sr. Edgar, Déda teve contato com
a política e com a história da esquerda em nossa terra, bem contada pelo amigo
barbeiro.
As histórias de prisões dele, a história da organização do
Partido Comunista em Sergipe nos anos 1940, a história de grande líderes e
intelectuais: de Careca, de Agonaldo Pacheco, de Wellington Mangueira, do
médico Renato Mazze Lucas, que esteve preso com ele na penitenciária na década
de 1950. Contava como se pichava um muro pela noite. Foi o primeiro comunista
que eu conheci. Olha que ele era um comunista tipicamente brasileiro: livros de
Marx escondidos, uma guia no pescoço, um quadro de Iemanjá na parede da
barbearia e, ainda mais, era espírita kardecista. Era essa coisa bonita que é
pluralidade da alma brasileira. Mesmo aqueles que militam na esquerda, que
estudaram os princípios do Maxismo, não perderam sua ligação com a fé, com as
crendices populares, com as religiões populares e com as marcas da vida
brasileira.
Estudando à noite, tinha todo o tempo para ouvir histórias
do sr. Edgar. A partir daí, Déda começou a ler livros de Jorge Amado, textos de
esquerda e acompanhou a eleição de 1974 quando viu pela televisão Jackson
Barreto e Jonas Amaral. Foi o início da sua paixão por política. Quando tinha
no bolso o resto da mesada, eu comprava o Pasquim, o Movimento e Opinião,
jornais alternativos da época.
Quando chegou em Aracaju, o bairro São José era de
transição. Chegou logo após da inauguração do Batistão. Encontrou um bairro que
ainda tinha área de mangue. Não era um bairro como é hoje, de classe média, que
abriga muitas clínicas. Seu lado popular ainda prevalecia.
Outro aspecto de importância na vida de Déda, foi o da
felicidade de ter, como vizinho da residência de seus pais na rua Socorro, a
família Paixão, liderada por sr. Manoel. Uma família de negros extremamente
positivos, a ponto de ter muito lhe influenciado. Trabalhando no comércio, mesmo
com todas as dificuldades que tinha para manter a família, era fonte permanente
de otimismo.
Não me esqueço nunca de um conselho que ele me dava quando
saía para pescar siri no Colodiano, onde hoje é o Shopping Riomar. Ali tinha
uma barraquinha e o pessoal ia pescar siri na frente da Sementeira. O sr.
Manoel, um dia, depois que eu lhe dei bom dia e perguntei se tudo estava bem,
respondeu-me: ‘Déda, nunca esqueça: quem corre pelos campos não aprecia a
beleza das flores’. Essa era a sua filosofia de vida. A cada momento da vida, a
pessoa tem que compreender que não precisa se apressar demais, pois precisa de
tempo para ver a beleza da vida.
Junto com os meninos do bairro São José, sem faltar Luís, um
vizinho parecido com Pelé, Tonho, Evandro, Mestre e outros, o jovem Marcelo
saía de casa aos sábados para o lazer.
Nós íamos jogar bola, onde é o bairro Jardins hoje, local
que tinha o campo do Alambique. Às vezes, íamos jogar na Praia 13 de Julho ou,
simplesmente, pegávamos carona nos caminhões para irmos jogar na Atalaia. Minha
adolescência foi com essa turma.
Só saiu do bairro São José para casar. Em sua mente, ainda
hoje, só existem boas lembranças.
O Bariri, por exemplo, era o campo de futebol onde hoje é o
Supermercado G. Barbosa. Por isso, quando o prefeito Gama dizia que eu não
conhecia Aracaju, só posso dizer que eu tenho vinte e sete anos nessa cidade.
Eu vivi essa cidade, malhando para entrar no Iate, porque não era sócio,
malhando para entrar na Atlética, no carnaval, pulando muro para entrar no Cotinguiba,
pedindo carona para Atalaia, indo pescar siri na 13 de Julho, indo participar
dos jogos de bairros contra bairros, jogando como lateral esquerdo pela turma
do São José, assistindo a sessões de Cinema no Plaza, no Vera Cruz, ou no
bairro Siqueira Campos. Ia ao cinema de tamanco e voltava pela Baixa Fria,
pegando a Rio de Janeiro, batendo tamanco no asfalto. Eu assisti filmes no Cine
Vitória e no cinema na colina do Santo Antônio.
Também conta que, aos sábados, chegava na Padaria Santo
Antônio, perto de sua casa, para saber se tinha alguma festa. Confessa que
foram muitas as que foi como “penetra”. Nunca foi violento, nem de brigar, mas
não escapou das tradicionais brigas de turmas. Eu já tomei carreira de sair
correndo da Atlética até o bairro São José. Fui salvo por Tarciso da Tasvídeo.
Concluída a oitava série, voltou ao Atheneu e encontrou o
colégio sob a direção da professora Maria da Glória. Assistia à aula de farda
de gala. Estava com dezessete anos de idade. Desse tempo do Atheneu, diz que não
existia escola particular para rivalizar em Aracaju. Talvez, no seu ponto de
vista, só as tradicionais escolas de São Paulo, Rio de Janeiro, a exemplo de
Dom Pedro II. Os laboratórios eram impecáveis e o corpo de professores era de
fazer inveja. Turmas organizadas, consultórios médicos e material de ensino.
Juntava-se a isso tudo, o que mais gostava: a parte de educação artística.
Nós tínhamos cinema com Djaldino Mota Moreno, César
Macieira; teatro com Bosco Scaf, Bosco Seabra, Jorge Lins e Luís Eduardo Oliva.
Antônio Maia ensinava artes plásticas, tudo com material à disposição. Também
tinha dança com a professora Nelma Fontes. O Atheneu era o centro da
organização cultural no final da década de 1970.
Nesse envolvimento cultural, teve sua primeira experiência
como integrante de uma agremiação. Junto com os professores de cinema e alunos
adeptos da sétima arte, tornou-se fundador do Clube de Cinema do Atheneu. Eu
fiz documentário sobre os festejos da rua São João em 1977. Nesse tempo eu já
estava nas ruas de Aracaju, filmando o São João.
Na sua segunda fase no Atheneu, já voltou bom aluno. Sabia
como ninguém se organizar nos estudos. Logo às 7h já saía de casa para estudar
com os colegas Evandro e Aronaldo, que o pegavam de carro, para juntos irem à Biblioteca
Pública Epihânio Dória. Tinha salas de estudos e ficávamos lá até às 11h30.
Para enfrentar o vestibular, fez, durante um mês, o curso
“intensivão” de um curso pré-vestibular chamado Visão, somente duas matérias:
matemática e física. Déda sempre gostou de boêmia e de serenatas. Era
freqüentador do bar Cancela que ficava nas proximidades do Atheneu. Teve tempo
para fazer teatro, cinema e artes plásticas dentro do movimento cultural
implantado por Maria da Glória no Atheneu. Disse que foi autor de muitos
quadros a óleo.
Foi por isso que, quando eu cheguei em 1985 à televisão, as
pessoas viram uma revelação na eleição a prefeito. Nada cai do céu, nada nasce
pronto. Eu devo isso a essa experiência que eu tive em minha vida, graças a
Deus, a do bairro São José e a experiência do Atheneu, principalmente, na área
de teatro e cinema. Isso me ensinou postura, noção de tempo, compreensão da
importância da dicção. Tudo isso eu devo a quem? Ao povo de Sergipe, que pagou
a minha escola.
Foi aprovado em segundo lugar no vestibular de Direito da
UFS.
Embora seu pai, desde a infância, tivesse preparado o filho
para ser médico, e se entusiasmasse com as notas dez em Biologia no primeiro
ano científico e média nove no ano seguinte, Déda tomou a decisão de não optar
por Medicina diante de um episódio da morte de um menino por afogamento.
Eu fui ver, com a turma do bairro, o corpo do menino no IML.
Confesso que depois que vi o cadáver na mesa de necropsia, traumatizei-me e eu
percebi que não dava para Medicina. Daí comecei a pensar em fazer Psicologia,
Sociologia ou Jornalismo. Nenhum desses três cursos existiam em Aracaju nessa
época. Já estava com dezessete anos e já estava me aproximando do movimentos
políticos.
Já conhecia Chico Buchuinho, já estava próximo do DCE.
Também já conhecia Clímaco. Queria alguma coisa na área de Ciências Sociais.
Não tinha por aqui. Os mais próximos eram Direito ou História. Não me arrependo
de ter feito a escolha para Direito. Deus foi muito bom comigo. Na época que
tomei a definição, tomei a definição certa. Eu não me imagino em outra
atividade profissional, que não advocacia.
Entrou na Faculdade de Direito no primeiro semestre de1980 e
saiu no segundo semestre de 1984.
Fui aluno do ministro Luís Carlos Fontes de Alencar, do
desembargador Antônio Góes, que foi o meu paraninfo; de Luís Bispo; do meu tio
Artur de Oliveira Déda, em Prática Forense. Também fui aluno da professora
Eugênia em Criminologia; de Moacyr Motta em Direito do Trabalho; de Itamar,
Direito Administrativo; do professor Monteirinho em Direito Previdenciário.
Em Ciência Política, como matéria optativa, tive o professor
Ibarê Dantas, um homem que foi fundamental em minha formação. Ele trouxe
autores da Ciência Política que eu nunca tinha lido. Eu lia muito mais nos
manuais clássicos do Marxismo. Ele me trouxe Gramsci, que foi fundamental para
que eu mudasse a minha imagem de mundo, aprender melhor como é a disputa
política no Ocidente. Ibarê é um homem conhecido plenamente na vida pública
sergipana.
É autor de um clássico “Tenentismo em Sergipe”, uma obra
citada por Francisco Weffort, citada por todos os estudiosos do tenentismo. Eu
tive a oportunidade de não tê-lo apenas como professor, mas como um grande
amigo meu. Divergi de 60 a 70% das vezes que a gente discutiu, mas Ibarê com
sua conduta de intelectual, de acadêmico, de cidadão engajado, contribuiu para
a minha formação. Até hoje eu peço a ele conselhos.
Homenagem a Marcelo Déda pelo seu novo mandato à frente do
Governo de Sergipe. Este material mostrando a sua vida política, foi publicado
há 10 anos. Hoje, Marcelo Déda já tem muito a contar para a memória de Sergipe.
Texto e foto reproduzidos do site: usuarioweb.infonet.com.br
Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, de 8 de dezembro de 2013.