sábado, 26 de abril de 2014

Os 90 anos de Oviedo Teixeira, esse "Sujeito" Formidável (2000).

Foto de Oviedo Teixeira, retratado pelo artista Charles Henry.

Infonet - Cidade - Noticias - 10/05/2000.

Os 90 anos de Oviedo Teixeira, esse "Sujeito" Formidável (2000).

O Iate Clube de Aracaju abre suas portas hoje para uma festa de arromba, em comemoração aos 90 anos de idade do Sr. Oviedo Teixeira, uma das grandes personalidades sergipanas deste século, na área do comércio. A festa foi organizada por seus filhos e promete levar até lá a nata da sociedade sergipana para cumprimentar o "Sujeito" que, desde que começou a trabalhar há 81 anos, tem sido um inusitado propulsor do desenvolvimento de Sergipe. Não é Oviedo que está em festa - é todo Sergipe que se orgulha deste filho querido e o abraça comovido.

Oviedo nasceu em Itabaiana a 9 de abril de 1910, filho do casal João Teixeira e Maria São Pedro Teixeira, a d. Caçula. Ao todo, foram 14 filhos: Antônio, Sílvio, Manoel, Lourdes, Oviedo, Olívio, José, Albertina, Aderbal, Bernardete, João, Cecília, Hermes e Elpídio - este último foi o seu sócio nas primeiras investidas comerciais. Começou a trabalhar a partir dos 9 anos de idade, o que era comum não só entre os seus familiares, como na própria região de Itabaiana. Na Casa Mesquita, pertencente a Mesquita & Irmão, Oviedo fez de tudo: de 3ª a Sábado, atendia no balcão e na 2ª feira ia vender tecidos na feira de Saco da Ribeira, hoje Ribeirópolis. Era já gerente de compras, quando um desentendimento com a empresa, fez soar a hora de ir embora.

Como já conhecia o comércio profundamente, Oviedo pediu a mãe um dinheiro emprestado para comprar tecidos nas grandes lojas de Aracaju e levá-los a revenda no interior do Estado. A mãe dispunha de uma economia para os momentos de necessidade e não hesitou em emprestar-lhe 2 milhões e 400 mil réis. Com esta importância, Oviedo passou a comprar em Aracaju e viajar para Itabaiana usando os trens da Leste ou os saveiros até Laranjeiras, e, daí para lá, os poucos caminhões existentes. Foi no mesmo Saco da Ribeira que, quando a oportunidade surgiu, alugou uma casa e instalou a Casa Teixeira. Dois anos depois, em 1931, Oviedo trouxe a matriz para Itabaiana e deixou uma filial no povoado. Estava dada a largada. O próximo passo de Oviedo foi juntar-se ao irmão Antônio para a instalação de A Teixeira & Irmão, expandindo o comércio de tecidos.

Como os negócios iam bem, D. Caçula concorda em vender a fazenda Taquari, onde morava e empregar os 34 mil contos de réis no comércio. Oviedo toma uma atitude inédita no comércio sergipano: vai ao Rio e a São Paulo comprar diretamente da fábrica os produtos que aqui chegavam muito lentamente. Depois de casar-se com D. Alda, em 1935, Oviedo instala no número 13 da Rua João Pessoa, onde antes era um depósito de cerveja, a sua Casa Teixeira. Vendendo tecidos finos e os mais variados modelos de chapéu, a Casa Teixeira precisava de mais espaços e já em 1939 instala-se no número 75. Ao longo do tempo, a Casa Teixeira teve filiais em vários municípios e em Aracaju na ruas José do Prado Franco, Laranjeiras, Florentino Menezes. Até 1968 funcionou normalmente, sob a direção de "seu" Oviedo, seu irmão Elpídio e nos últimos tempos, pelo filho Tarcísio.

Muito ligado à família ajudou a todos no que foi possível. Gilza casou-se com José Lauro Menezes Silva, a quem Oviedo estimulou a compra de uma pequena empresa de ônibus, a Bomfim. Em 1962, Oviedo adquire a concessionária Ford e a Saboaria Celeste, que, sob a denominação geral de Cimavel, passou a ser dirigida pelo filho João. Quando Luiz Antônio voltou do Paraná, formado em Engenharia, Oviedo adquire uma pequena construtora, a Sociedade Nordestina de Construções, que passou a ser dirigida por ele e mais Luciano Barreto, casado com a sua filha Maria Celia. Posteriormente, a empresa passou a ser conhecida como Norcon, dirigida pelos irmãos Luiz e Tarcisio e Luciano Barreto foi dirigir a Construtora Celi. Já em 1970, Oviedo monta a Discar, e passa o comando ao irmão Elpídio e a Carlos Lyra, casado com sua filha Ana Maria. Ainda hoje, Oviedo é proprietário da Fazenda Salgado, adquirida em 1942 de Eronides de Carvalho, onde cria gado zebu.

O filho mais velho de Oviedo, José Carlos Teixeira, destacou-se como homem ligado a cultura (dirigiu a Sociedade de Cultura Artística de Sergipe) e elegeu-se deputado federal. O golpe militar de 1964 teve em José Carlos um decisivo contestador. O parlamentar ativo que honrou a política sergipana foi um dos fundadores do MDB, a "oposição consentida" pelos militares. Para atender aos apelos do filho, "seu" Oviedo foi candidato a Senador em 1966 (derrotado por Leandro Maciel) e em 1970 (derrotado por Lourival Baptista e Augusto Franco). Em 1974, elegeu-se Deputado Estadual, mas a derrota em 1978 fê-lo afastar-se da política. Apesar disso, Oviedo nunca deixou de ser querido de todos os sergipanos. D. Alda morreu em 1979, mas Oviedo prefere lembrar-se dela com alegria e entusiasmo. Os filhos o têm em carinho inusitado. As instituições de classe do comércio sempre ouvem Oviedo com respeito e admiração. 90 anos de uma vida digna e honrada, um exemplo a ser seguido.

Texto reproduzido do site: infonet.com.br/cidade

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 26 de abril de 2014.

Nos 100 anos do Bom Sujeito

Oviêdo Teixeira (foto) falando a seus Companheiros do RotarY Club Aracaju em 14/04/1999.

Infonet - Blog Odilon Cabral - 08/04/2010.

Nos 100 anos do Bom Sujeito.
Por Odilon Cabral Machado.

Seria Rosebud desprovido de importância abrangente ou só existem valores individuais e específicos que no coletivo apenas servem como lenha queimada ao léu?

Amanhã, 9 de abril, a família de Oviêdo Teixeira estará comemorando os cem anos do seu nascimento com a celebração de uma Missa em sua memória.

Oviêdo Teixeira, falecido em 2001, deixou uma lembrança que supera os limites do agasalho familiar estendendo-se por toda a sociedade sergipana e além fronteiras, pelo seu exemplo como profissional, empresário e cidadão.

Nada melhor, portanto, que reverenciar tudo isso na data que seria do seu aniversário com uma prece de alegria e agradecimento por sua vida.

Neste contexto de homenagem, ouso transcrever um artigo que publiquei quando ainda queimavam as candelas das suas exéquias. É uma nova oportunidade de relembrar o calor e o enternecimento daquela câmara ardente em que seu féretro recebia os encômios justos e verdadeiros.

Segue o texto:

O Rosebud do Sujeito

Os aficionados e estudiosos da arte cinematográfica colocam Cidadão Kane como um dos melhores filmes de todos os tempos.

Escrito, estrelado e dirigido por Orson Welles, o filme fala da vida de um célebre jornalista, digo, um grande empresário, dono de enorme cadeia de jornais, como o foram Randolph Hearst nos Estados Unidos e Assis Chateaubriand aqui no Brasil.

Se o Cidadão Kane foi concebido em cima da vida de Hearst, como muita gente o diz, o mote do filme se concentra na palavra Rosebud, pronunciada por Kane em seu último suspiro de vida. Quem é Rosebud? O que é Rosebud? Por que um grande homem como Kane, tão vitorioso, inteligente e poderoso pensaria em Rosebud no último suspiro de vida?

Esta reflexão surge sempre nos circunstantes que acompanham os últimos momentos de um moribundo qualquer.

Não creio ter sido diferente com Oviêdo Teixeira, o grande empresário sergipano, o bom amigo de todos, o nosso tão querido e bom Sujeito que nos deixou nestes vindos de julho.

Como todo homem, Oviêdo deixa o seu legado de realizações e saudades. Teria ele tido um Rosebud? Claro. Todos o temos.

Conheci Seu Oviêdo desde que me entendo como gente, afinal nasci na Rua de Pacatuba, a poucos metros da sua residência, e durante toda minha infância fui seu vizinho, sempre testemunhando o zelo com que ele e Dona Alda criavam seus filhos.

Lembro da Casa Teixeira e de seu proprietário atencioso, sempre um grande balconista, o melhor vendedor de tecidos da cidade.

Vejo também sua passagem na política partidária, acompanhando o filho José Carlos no MDB. Num momento em que tinham tudo a perder, os Teixeira assumiam em Sergipe a liderança oposicionista ao regime revolucionário, dando palanques e microfones às esquerdas esfaceladas. Desfraldava-se ampla bandeira na qual muitos se abrigariam e lograriam sucesso. Nunca tantos deveram a tão poucos. Para si mesmo, Oviêdo só conseguiria um mandato de Deputado Estadual. Os amigos que lhe eram tantos, talvez porque não o quisessem distante, ou porque rareiam mesmo nos tempos amargosos, não lhe concederiam o Senado da República.

Mas o bom Sujeito não nascera para a suja e desqualificada política partidária. Ali com certeza não estava o seu Rosebud. Não valia a pena o sacrifício de talento e patrimônio numa agremiação política ou na busca de fugazes mandatos eletivos. Melhor seria abandonar as siglas e facções, sempre mutiladoras de sonhos e de conceitos. Tornar-se universal e estender-se em todas as dimensões. Ser ator em todos os cenários, desempenhando o seu verdadeiro papel de Homem Político, no sentido aristotélico de promoção do bem comum de sua Polis. Assim, torna-se presença marcante em todos os segmentos da sociedade, manifestando sua opinião construtiva, sem a arrefecer diante dos pessimistas e descrentes, repelindo com o seu exemplo de vida os pregadores de misérias que ruminantemente vão e voltam nas vagas de cada plano econômico.

Oviêdo Teixeira falando a seus Companheiros do RotarY Club Aracaju em 14/04/1999.

Quantas vezes nas nossas reuniões almoço do Rotary Clube de Aracaju, e agora sou seu Companheiro Rotariano, vimos Oviêdo transformar preocupações e desencantos em esperança, estímulo e motivação para enfrentar obstáculos? Sua palavra extinguia qualquer temor. Suas crenças não se curvavam a dúvidas e frustrações. Pregava o futuro afirmando a força e o vigor transformador do trabalho. Era realmente um apaixonado pela atividade mercantil. Nunca perdia a oportunidade de afirmar sua fé no comércio como força dinâmica do progresso material e social. Nunca se eximia de bem servir, afinal servir era o seu lema de vida.

Oviêdo foi o Rotariano por excelência. O Rotariano 100%, isto é, aquele que nunca faltara a uma das reuniões almoço, todas as quartas-feiras, chovesse ou fizesse sol, com saúde ou sem ela, por mais de cinco décadas, inclusive carregando moléstia inexorável nos últimos 15 anos.

Seria o Rotary o seu Rosebud?

Quando das comemorações de seus 90 anos de vida quis que o nosso Clube lhe conferisse a nossa maior comenda anual. Fiz por escrito extensa e abalizada exposição de motivos, tudo dentro do prazo e do figurino do Clube, afinal o ideal rotário de servir confundia-se com a vida do velho Companheiro. O Conselho Diretor pensou diferente,... e o Rotary saiu perdendo.

Quem ganhou foi a nossa esquecida Universidade Federal de Sergipe. Num gesto de grandeza, o saber e a cultura curvaram-se em reconhecimento do trabalho e da experiência, louvando este Self Made Man. Das mãos do Magnífico Reitor José Fernandes de Lima, o Bom Sujeito recebe comenda de mérito universitário. Era o reconhecimento do valor de um homem de poucas letras que se doutorara nas estradas da vida, exemplificando-se para muitos, fazendo-se professor de gerações.

Não sei qual foi o Rosebud de Oviêdo, muito menos se chegou a assistir Welles e o Cidadão Kane. Dos seus 90 anos ficará a mensagem que transcrevo da Coluna de Osmário por Yara Belchior: “É bom dizer palavras de estímulo e consideração uns aos outros, que a consideração é uma beleza. Todo mundo fica satisfeito, principalmente velho e criança. Menos eu, que não me engano com as coisas da vida”.

Assim, a vida não é esfinge e Rosebud não é incógnita.

Na fita, Rosebud é apenas uma palavra inscrita num velho móvel, um trenó talvez, um traste inútil do espólio do Cidadão Kane, colecionador de suvenir, que é queimado no final do filme.

Seria Rosebud desprovido de importância abrangente ou só existem valores individuais e específicos que no coletivo apenas servem como lenha queimada ao léu?

Se Rosebud é algo importante para uns e desprezível para outros, desconfio que o Rosebud de Oviêdo foi o Rotary Clube de Aracaju. O Rotary era muito importante para o velho Sujeito. Para outros, o Rotary assemelha-se ao trenó Rosebud que queima no inquietante final do filme de Welles.

No filme, Kane morre balbuciando Rosebud e todo enredo se inicia. Na vida como na arte, sentindo as forças e a inteligência se esvaírem, Oviêdo, rebelando-se contra os médicos, exige-lhes a imediata alta hospitalar, dirigindo-se ao Rotary Clube de Aracaju para despedir-se de seus Companheiros. Ali faria seu último discurso reafirmando suas crenças como homem portador de esperanças, retirando-se depois para o seu leito de morte, para recebê-la como mais uma dádiva da vida, afinal agora só queria reencontrar a sua Alda querida. No seu sepultamento Aracaju vê apoteose pouco vista. Toda sociedade sergipana se representa no enterro deste sergipano exemplar.

Após as homenagens lojistas e políticas, o Companheiro Carlos Magalhães discursou despedindo-se em nome dos Rotarianos.

Como a multidão no cemitério era muito grande e a potente voz de Magalhães não conseguia alcançar a todos, sabia-se apenas que alguém falava pelo Rotary.

E a palavra Rotary parecia soar desconhecida e questionadora como o Rosebud do cidadão Kane.

Naquela tarde o Rotary se apequenava, pois perdíamos um grande Companheiro.

Como Rosebud é apenas um item do espólio de um grande homem, do sentimento de perda e da saudade, consolemos a nossa tristeza repetindo a mensagem daqueles que lhe foram mais próximos, os funcionários da Cimavel: “Na estrada da vida esse Sujeito deixou muita bagagem”.

Gazeta de Sergipe, 7 de julho de 2001.

Foto e texto reproduzidos do site: infonet.com.br/odilonmachado

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 26 de abril de 2014.

Oviedo, José Carlos, Luiz Antônio e Tarcísio


Oviedo, José Carlos, Luiz Antônio e Tarcísio
Por Jorge Carvalho.

Após o golpe militar, José Carlos Teixeira, o pai, Oviedo Teixeira, e os irmãos, Tarcísio e Luiz Antonio Teixeira exerceram um papel preponderante na política de Sergipe, liderando o processo de organização do partido que se opôs à ditadura no Estado. Segundo José Carlos Teixeira era fundamental criar o partido com a tarefa de lutar contra a ditadura e restabelecer a força da representação política, porque a política é o instrumento de realização da vontade do povo. Depende do povo a escolha dos seus melhores valores. Pessoas que possam representar o povo, pelo seu caráter, pela sua coerência, pela sua visão, sem postular nenhuma vantagem de ordem pessoal e sem buscar nenhuma forma vil de fisiologismo e clientelismo para exercer o mandato[1].

Nascido em nove de abril de 1910, Oviedo Teixeira foi empresário de muito prestígio, até a sua morte em dois de julho de 2001. Como cidadão, extrapolava os partidos e foi nesta condição que emprestou o seu nome para colaborar com o filho José Carlos no projeto de criar o partido de oposição à ditadura em Sergipe, num momento em que poucas pessoas se dispunham a correr o risco de divergir dos generais. Nascido no município sergipano de Itabaiana, o empresário Oviedo Teixeira foi agricultor, pecuarista, industrial e comerciante. Um dos 14 filhos de João Teixeira e de Maria São Pedro Teixeira era irmão de Antonio, Sílvio, Manuel, Lourdes, Olívio, José, Albertina, Bernadete, João, Cecília, Hermes e Elpídio. Católico militante, ele freqüentava a Catedral Metropolitana de Aracaju aos domingos, onde seu irmão Olívio era vigário-geral da Diocese, sempre acompanhado da mulher e dos seus sete filhos. “Oviedo era o homem que representava todo o pensamento econômico de uma geração, mas se envolveu como articulador da oposição e fez discursos muito corajosos”[2].

Oviedo Teixeira começara a participar da vida política de Sergipe depois de 1955, durante o governo Leandro Maciel, em face das perseguições que a família Ceará sofreu no município de Ribeirópolis, em funçãodos conflitos que resultaram na morte de Josué Passos. Amigo do líder itabaianense Manoel Teles e procurador dos Cearás, que obrigados a se afastar de Ribeirópolis deixaram suas propriedades sob a sua guarda, Oviedo Teixeira começou a enfrentar dificuldades nos negócios e constrangimentos políticos causados pelos governistas ligados à União Democrática Nacional – a UDN. Em face desses acontecimentos Oviedo decidiu transferir definitivamente todos os seus negócios para a cidade de Aracaju, onde já atuava desde o ano de 1939 com a sua Casa Teixeira. Desde os nove anos de idade já trabalhava, ajudando os tios no comércio, em Itabaiana e no Saco do Ribeiro (Ribeirópolis). Foi no Saco do Ribeiro que instalou a Casa Teixeira, sua primeira loja de tecidos, que depois transferiu sua matriz para Itabaiana.

Desde a sua transferência para Aracaju colaborou politicamente e financeiramente com o PSD e influiu na política de municípios como Itabaiana, Frei Paulo e Ribeirópolis. Até que Oviedo iniciasse sua participação direta na vida política, o único membro da família que exercera forte influência partidária fora seu irmão Sílvio Teixeira, que em 1930 chegou a integrar a Aliança Liberal. A partir daí, Sílvio iniciou uma carreira política de sucesso, exercendo os mandatos de prefeito de Itabaiana, deputado estadual constituinte e depois deputado estadual. Na política de Itabaiana, Sílvio Teixeira se consolidou como o líder do Partido Republicano – PR e algumas vezes aliado do líder do PSD, Manoel Teles.

Demonstrando disposição para o diálogo, desde que conquistou o seu primeiro mandato, já como deputado federal, em 1962, pelo Partido Social Democrático – o PSD, José Carlos Teixeira compôs a chapa na qual João de Seixas Dórea se elegeu governador de Sergipe, derrotando Leandro Maciel.

José Carlos Mesquita Teixeira nasceu no dia três de maio de 1936, em Aracaju, mas foi registrado pelo pai como nascido em Itabaiana. Em 1950, estudando no Colégio Estadual Atheneu Sergipense, foi militante da União Sergipana dos Estudantes Secundaristas – USES, ao lado de Jaime Araujo e Tertuliano Azevedo. Anteriormente, vivera outra experiência no movimento estudantil secundarista, quando morou no Estado da Bahia, participando ativamente da campanha “O petróleo é nosso”, nos anos finais da década de 40 e no início da década de 50. De acordo com o entendimento de Wellington Mangueira, “José Carlos foi preparado para a vida no mundo do trabalho. O pai era empresário, mas ele começou ganhando a vida no balcão da loja, medindo e rasgando pano na empresa Tecidos Teixeira. Era um homem trabalhador, que pegava no pesado”[3]. Na verdade, inicialmente, o patriarca Oviedo Teixeira não via com bons olhos a predileção do filho pela atividade política:

Eu não queria que José Carlos fosse político. Eu quis que José Carlos fosse um comerciante. Ele já estava iniciando muito bem no comércio. Era o meu sucessor, eu não tinha dúvida. Mas, entrou na política, junto com a campanha de Seixas Dórea. Seixas Dórea com aquele entusiasmo e José Carlos saiu logo candidato a deputado federal[4].

Alguns depoimentos dão conta de que mesmo antes da sua filiação ao PSD, José Carlos Teixeira mantinha contatos em Sergipe com a militância do antigo Partido Socialista Brasileiro – o PSB:
Ouvi relatos de José Rosa de Oliveira Neto, que sempre foi um homem sério, informando que antes de se filiar ao PSD José Carlos Teixeira conversou com alguns líderes do Partido Socialista e recebeu ajuda de alguns deles durante a sua campanha. José Carlos era um homem aberto a novos conceitos e isso entusiasmava alguns líderes do PSB. Como deputado federal pelo PSD ele conseguiu verbas para vários diretórios acadêmicos nos quais as lideranças do PSB eram muito atuantes. A participação dele na Cultura Artística e a divulgação dos artistas, compositores e intelectuais do mundo socialista em Sergipe foi um trabalho muito importante que José Carlos Teixeira desenvolveu. Ele era um homem progressista[5].

[1] Cf. TEIXEIRA, José Carlos Mesquita. Entrevista concedida a Jorge Carvalho do Nascimento no dia 10 de março de 2008.
[2] Cf. LIMA, Jackson Barreto de. Entrevista concedida a Jorge Carvalho do Nascimento no dia 17 de maio de 2008.
[3] Cf. MARQUES, Wellington Dantas Mangueira. Entrevista concedida a Jorge Carvalho do Nascimento no dia 15 de agosto de 2008.
[4] Cf. TEIXEIRA, Oviedo. Depoimento. In: Memórias do Sujeito. Documentário em DVD. Aracaju: Grupo Cimavel, 2007.
[5] Cf. MARQUES, Wellington Dantas Mangueira. Entrevista concedida a Jorge Carvalho do Nascimento no dia 15 de agosto de 2008.

Texto reproduzido do blog: carvalho.nascimento.zip.net

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 26 de abril de 2014.

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Senhora dos bordados


 (Senta que lá vem poesia)

Senhora dos bordados

Desde que sentei aqui tento acomodar
o meu roliço travesseiro de bilros
entre as pernas.

É no chão onde exerço a função de feiticeira,
ágil senhora dos complicados labirintos,
onde se entrelaça o destino das anáguas.

Mal consigo esconder o inchaço das coxas,
o dedo rombudo de espiar espinhos,
o olho furado de espetar estrelas.

Tão velha,
já não consigo matraquear os bilros
ruídos que tecem o branco esplendor dos meus bordados.

Vim fazer alvos bicos de fino lavor,
peças de cambraia para o colo das matronas,
beiradas de califon,
guarnições núbias de irresistíveis tentações
e porta moringas também.

De cócoras, gemendo os reumatismos, enfio uma tirinha Gaudí de góticos furinhos no velho travesseiro e,
mais ágil do que nunca,
matraqueio nos velhos bilros cansados de inventar belezas
os fios finais da minha arte velha,
aqui sentada neste chão com meus tortos alfinetes
tontos.

Vocês me desculpem a bocetona exposta.

Desde que cheguei aqui
tento acomodar o meu roliço travesseiro de bilros entre as pernas.

Amaral Cavalcante.

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 22 de abril de 2014.

quinta-feira, 24 de abril de 2014

Roteiro Antigo

 Foto: Facebook /José Clementino.

Foto: Carllos.costa/panoramio.com/photo

Roteiro antigo. 
Por Petrônio Gomes.

Quando se fala do desenho quadriculado das ruas de Aracaju, muitos ainda pensam que somos a única cidade assim traçada em sua parte antiga. Na realidade, o desenho em xadrez foi usado em outras cidades mais velhas do que o próprio Brasil, além do fato de não estarmos sós quanto a este aspecto. Entretanto, podemos afirmar que o desenho em xadrez, aliado à topografia de nossa capital, faz desta cidade a mais simpática assim esboçada, em que pese nosso olhar suspeito de coruja...

Existirão vantagens práticas no traçado em linhas uniformes? Sim e não. O Dr. Fernando Figueiredo Porto, figura ilustre e estimada, foi um engenheiro civil e professor universitário que já prestou excelentes serviços na Prefeitura de Aracaju. Em suas aulas de Geografia Física, costumava comentar os problemas de nossa capital, sendo um grande estudioso do assunto.

“Uma ambulância que partisse do centro da cidade poderia chegar mais rapidamente ao Hospital de Cirurgia, se houvesse que percorrer uma rua em diagonal.” E não é verdade? Se o caminho mais curto entre dois pontos é uma linha reta, como podemos economizar tempo fazendo volta em torno de quarteirões? E ainda comentando sobre nossas ruas, o dr. Fernando Porto confessou: “Além do mais, a série de quadrados torna a cidade monótona, pelo menos para mim. A rua mais simpática de Aracaju é a rua da frente, que por ser tão desprezada, ficou sendo a rua de trás”.

De perfeito acordo, Dr. Fernando. A Avenida Rio Branco, seguida da Avenida Ivo do Prado, uma divisão que nunca chegou a ser decorada pelo povo, compõe de fato a rua mais poética e mais bonita de Aracaju: a Rua da Frente, que assim deveria ser batizada nos registros da Prefeitura. Tanto isto é verdade, que todas as fotografias que exportamos para mostrar a beleza da cidade são aquelas que trazem a Rua da Frente em primeiro plano.

Desde criança, tem sido ela o meu roteiro, muito antes que houvesse chegado para nós essa torrente de automóveis. Para cumprir minhas ordens domésticas, eu seguia pela calçada vizinha ao rio e gostava de ver as canoas que iam e vinham. Por qualquer razão difícil de se explicar, havia um tráfego mais movimentado do que hoje, várias dezenas de anos depois. Quando chegavam as horas da maré baixa, era uma aventura gostosa continuar a caminhada pela areia, observando a corrida medrosa dos siris que se afastavam dos nossos pés.

Eram também fascinantes as marés de março para os olhos infantis, pois as crianças preferem admirar, sem procurar entender. Talvez por isso mesmo fosse mais risonho o mundo, mais alegre a vida.
E ainda prefiro seguir meu roteiro antigo de criança quando tenho que cumprir os deveres externos de sempre, agora enfadonhos e sem graça. Mas continuo falando a sós com o rio, meu silencioso amigo que me viu de calças curtas.

Quando passam por mim os automóveis ruidosos e zangados, esbaforidos e mal educados, olho as águas mansas do rio e respiro a tranquilidade do seu caminhar perene. Quando o mormaço começa a abafar a cidade com o seu hálito quente e indesejado, procuro o abraço fresco do rio, como um segredo de velho companheiro.

E sinto-me, outra vez, com vontade de chutar as pedrinhas da calçada...

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 22 de abril de 2014.

domingo, 20 de abril de 2014

O ator Orlando Vieira

Foto: Marcos Rodrigues/ASN

Medalha do Mérito Cultural Tobias Barreto (09 de Julho de 2009).

Grandeza sergipana

Nascido em Capela, o ator Orlando Vieira é o tipo de personalidade mais que habituada a homenagens. Cada instante de sua carreira, permeada de atuações bissextas, é pontuado por consagrações e demonstrações de reconhecimento pelo seu trabalho. Mas como bom conhecedor da história de Sergipe e do significado da Emancipação Política do Estado, o ator, que também é funcionário público há quase 60 anos, vislumbrou o recebimento da medalha do Mérito Cultural como se fosse a primeira honra que estaria recenbendo. “Essa homenagem tem um significado muito grande para mim”, declarou, ao seu modo simples.

Também para Vieira, Sergipe segue em um processo constante de afirmação. “Acho que a grandeza conquistada por Sergipe, aquela mesma grandeza proporcionada pelo próprio processo da emancipação, está sendo mantida hoje em dia. O trabalho que está sendo feito hoje no Governo é só de crescimento. Hoje, nosso nome é destaque lá fora”.

O ator ressaltou ainda que as dificuldades, naturais no comando de um estado, estão sendo bem contornadas pelo governador Marcelo Déda. “Sabemos o quanto é difícil administrar a partir dos cuidados que temos com nossa a própria família. Não é fácil. Mas, mesmo assim, Sergipe tem dado grandes passos. O crescimento está à altura da expectativa do sergipano. E me refiro também à cultura. Hoje temos uma distribuição de manifestações culturais impressionante, temos universidade em São Cristóvão, Itabaiana e até em Laranjeiras, que aos poucos está voltando a ter sua memória cultural resgatada”.

Imagem e texto reproduzidos do site: agencia.se.gov.br

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 19 de abril de 2014.

O historiador Ibarê Dantas, presidente do IHGS

Foto: Marcos Rodrigues/ASN

O historiador Ibarê Dantas, presidente do IHGS. (09 de Julho de 2009).

Representante do Instituto Histórico Geográfico, entidade também contemplada com as homenagens concedidas pelo Governo do Estado, o historiador Ibarê Dantas ressaltou que o reconhecimento consagra o esforço do órgão em preservar a memória e, portanto, a própria afirmação de Sergipe diante do país. “O Instituto talvez seja a única instituição que tem entre seus objetivos estatutários a celebração da Emancipação Política de Sergipe. Considero esta a data cívica de maior relevo do estado, pois aponta para a conquista da nossa soberania. Sempre é importante lembrar que a soberania não é dada, é construída a partir das ações, da consciência que um povo tem de seus feitos culturais, econômicos, sociais e do fato de fazerem parte de um estado”, pontuou.

Segundo Dantas, todo esse processo de construção da soberania está sendo mantido pelo Governo de Sergipe. “Quando o estado se desenvolve dessa maneira que estamos acompanhando, a identidade sergipana vai se afirmando. E isso tem muito a ver com as administrações. Uma administração equivocada afeta a autoestima do sergipano, pois uma sociedade mal governada se desgasta. E o Governo atual tem sido muito cuidadoso em zelar pelos valores republicanos, pelos valores da sergipanidade, e isso é muito importante para a solidificação da nossa soberania, da nossa identidade”.

Imagem e texto reproduzidos do site: agencia.se.gov.br

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, 19 de abril de 2014.

A terra da Clemilda

Foto: Marcos Rodrigues/ASN.

Medalha do Mérito Cultural Tobias Barreto (09 de Julho de 2009).

A terra da Clemilda.

Só pelos números que ajudam a descrever sua trajetória, Clemilda Ferreira da Silva, uma das homenageadas com a medalha do Mérito Cultural Tobias Barreto, já seria uma lenda em qualquer lugar: aos 72 anos, a alagoana gravou mais de 40 discos, apresenta um programa de rádio e outro de TV há mais de 35 anos e soma mais de 45 anos de carreira. No entanto, foi depois que uma canção sua começou a estourar em Sergipe que a forrozeira decidiu se estabelecer no estado.

“Eu morava no Rio de Janeiro, onde tinha muitos amigos, estúdios, produtores, tudo. Mas para o artista nordestino, o Nordeste sempre será o Nordeste. Posso viajar o mundo todo, mas meu lugar sempre será Sergipe. Tanto que me contaram que, quando alguém ouve falar de Aracaju lá pras bandas do sul, costumam até dizer ‘é a terra da Clemilda’”, conta.

A irreverente cantora também exaltou a homenagem que recebeu do Governo de Sergipe. “Não tenho palavras para agradecer este reconhecimento. O que posso dizer é que Sergipe é a minha casa. Foi onde me abriram as portas. Costumo dizer que só saio daqui se for direto para o cemitério”, graceja. Ainda para Clemilda, o estado passa por um grande momento cultural. “A cultura está sendo muito bem valorizada pelo Governo do Estado. Vejo muitos artistas que andaram abandonados sendo lembrados, chamados para tocar. O Forró Caju é um exemplo desse esforço. Se eu não toco em um, acho que eu morro. Espero que tudo continue sempre assim”.

Foto e texto reproduzidos do site: agencia.se.gov.br

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 19 de abril de 2014.

Visita a Santo Souza

Foto reproduzida do site: jornaldesergipe.com

Visita a Santo Souza.

O poeta me recebeu de bengala e majestade, sentado numa vetusta cadeira de general como se à frente dele, perfiladas, as falanges divinas o aguardassem. Era como uma ilustração do Bhagavad Gita, uma santidade em seu elefante de guerra a comandar o destino dos homens na mítica batalha entre as forças do bem e as hostes do mal, majestoso na varanda mais sergipana dos Aracajus, na Avenida Rio Grande do Sul, no coração do Aribé.

Gestos alados, o andar tolhido pelo costume de voar, o poeta deu três pulinhos de pássaro e me abriu o portão. Era bonito ele, com a barba por fazer, o torso nu e o olhar tão nascituro, lindo senhor de elegâncias guerreiras: um rei núbio de cabelos anelados, brancos, meio assanhados para traz, com o seu cajado cravejado de suores.

Juro que vi um Avatar.

Ajoelhei a cabeça em conversa miúda, enquanto, olho no olho, nos reencontrávamos. O mais moderno e venerável poeta da nossa história me reconheceu, declamou para mim, levou-me às suas estantes e me serviu o mel de sua convivência doméstica. O galáctico guerreiro Santo Souza, eu o vi se cumprindo em humanidades, traçando nos mapas da casa suas estratégias amorosas:

- Um poema para minha filha, presente de Natal. E o leu.

Era um poema de paternos segredos, desses que perdem o cheiro e secam nos baús da casa cheio de perdões e abraços deixados para mais tarde.

Li-o em voz alta em postura coreográfica, perseguindo o ritmo inusitado nas estrofes (eram somente duas) tão inesperadamente rituais e belas. O verso doméstico do poeta Santo Souza, tão simples quanto o elegante arrastar de uma cadeira na mesa do jantar para que sua filha sentasse confortável, foi-me a confirmação da humanidade dele, um poema tão belo e coreográfico que me pôs a dançar, enquanto o poeta ria da minha inadequação.

Depois, percorri meio perdido a babel da sua estante, batendo cabeça nos livros que o trouxeram à intimidade com a literatura universal: mimos de autores consagrados em profusas loas à sua poesia, uma profusão de filósofos gregos, pensadores essenciais à compreensão da agônica posição do homem como criador e criatura, alguns originais seus aguardando publicação, livros e mais livros amontoados no cultivado universo literário do poeta, na preciosa biblioteca daquela casa simples no Bairro Siqueira Campos, em Aracaju, o vórtice ideal de onde emerge a melhor poesia de Sergipe a comover o mundo.

Santo Souza é um poeta reconhecido, considerado “orfico” para quem precisa de classificações, mas é, sobretudo, uma voz ímpar na poesia moderna, um observador consciente da condição humana diante da agônica contradição do seu destino.

Bebo uma taça de Rum ao poeta Santo Souza, argonauta a perseguir em mares desconhecidos o velocino da poesia dourada, um poeta universal a remover-se sempre entre os vaticínios que nos moldam poetas e a poesia que nos humaniza.

Amaral Cavalcante – 20/12/2009.

(Publicado em 2009).

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 19 de abril de 2014.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Lygia Prudente - Ex-aluna do Atheneu Sergipense



Publicado originalmente na página do Facebook/Ex-colegas do Atheneu Sergipense.

Isso é Atheneu  Sergipense # Personalidade de Hoje. 
Ex-Aluna Lygia Prudente.

Nascida em Aracaju, em 04 de agosto de 1952, Lygia Menezes Prudente, a quarta filha de Maria Lúcia Tereza de Menezes Prudente e Carlos Souza Prudente, meus pais biológicos. Por motivos de saúde de minha mãe, fui levada, ainda recém-nascida, por uma sua irmã, Maria de Lourdes Menezes Oliveira e seu esposo, Luciano Fontes Oliveira, até que ela estivesse recuperada. Eles não tinham filhos, até então, e com eles eu fui ficando. Depois de três anos da minha chegada, o casal teve 3 filhos, homens. Criada como filha, efetivamente, somente aos 12 anos tomei conhecimento da minha verdadeira história. Mudou porque eu avoquei para mim mais uma mãe e um pai e 7 irmãos, mas continuei morando com os meus pais adotivos, meus “tios”, à Rua Lagarto, 1664, no Bairro São José e era a única filha ( mulher) do casal, por eles muito querida. Aos 17 anos, perdi a minha “mãe” Maria de Lourdes. Nessa época eu já estudava no Atheneu, onde entrei em 1968 até 1971, quando conclui o curso Clássico, me submetendo ao Vestibular da Universidade Federal de Sergipe - UFS, aprovada para o curso de Pedagogia, concluído em julho de 1976. Sempre desejei ser professora e me realizei como tal. No Atheneu passei a minha adolescência, fase marcante na minha vida pessoal e profissional. Quando da conclusão do ginásio, senti o maior orgulho quando fui escolhida, dentre tantos, para ser a oradora na “formatura”. Tive oportunidade de ter excelentes professores, citá-los é um risco porque posso esquecer de alguém, mas ressalto a minha admiração pela Professora Maria Augusta Lobão com quem aprendi a gostar de História. Sofri para gostar de Matemática e Professor Antônio Freitas quebrou esse tabu. Professora Conceição Ouro estimulou o meu prazer pela escrita reforçando sempre com palavras incentivadoras. Professora Rosália Bispo despertou em mim o gosto pela Língua Francesa. E assim, tantos outros. Aprendi a respeitar a metodologia dos Professores Franklin, de Inglês e Poderoso, de Literatura, no Curso Clássico. O convívio com os colegas era maravilhoso e, dessa época, cito Núbia Matos, Nadir Santos, Nadja, Regimary, Carlos Alberto Menezes, Eduardo Cabral, Gervásio, Osmário e muitos outros. Lembro bem da vigilância de D. Valdice e de Manezinho, dos quais escapávamos sempre que podíamos. Um outro fato marcante dessa minha história escolar, foi a comemoração do Centenário do Atheneu, tendo sido escolhida para representar a minha turma como candidata à Rainha do Centenário, junto com outras tantas meninas. Esta lembrança é caracterizada por sentimentos antagônicos: de alegria pela contribuição que pude dar à minha turma porque consegui chegar à fase final do concurso e de tristeza porque eu e Armando Maynard rompemos, por cerca de 15 dias, um namoro já maduro, considerando que ele se posicionou contrário à minha participação, não entendendo o meu compromisso com meus colegas, reconciliado logo depois e estamos casados há 41 anos, quando passei a ser Lygia Prudente Maynard Vieira. Por conta disso, não fiquei com fotos do desfile para não avocar esse lado negativo sempre que víssemos as fotos. Hoje, tudo passado, procuro fotos que por acaso, tenham o registro da minha participação. Muitas e muitas histórias vão surgindo à medida que escrevo, mas, como já fui prolixa demais, quero reafirmar o meu orgulho em ser uma ex-aluna do Colégio Estadual Atheneu Sergipense, instituição que formou uma juventude cujo futuro demonstrou em que bases sólidas foi formalmente educada.

Foto e texto reproduzidos de postagem feita por Wagner Aragão Souza,
na página do Facebook/Ex-colegas do Atheneu Sergipense.

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE.

Poeta Santo Souza


Poeta Santo Souza *
'Santo Souza: Pássaro de Pedra e Sono, na transversal do tempo

A fértil criação poética de Santo Souza, hoje aos noventa e três anos, com uma lucidez que nos impressiona foi traduzida em dezesseis livros, alguns reeditados e um único traduzido para o espanhol. Nosso poeta é provavelmente o mais antigo militante da arte poética em Sergipe, e continua sonhando... Porque viver é difícil pra todo mundo'. (Gilfrancisco) *

..................................

Sabemos que um poeta não nasce poeta. Ele se faz ao longo de sua obra, aprimorada na luta diuturna com as palavras e na madureza do homem e das técnicas composicionais. Quando saiu Pássaro de Pedra e Sono (1964), o poeta Santo Souza, trazia consigo quatro obras publicadas: Cidade Subterrânea (1953), Caderno de Elegias (1954), Relíquias (1955), Ode Órfica (1956) e uma fortuna crítica invejável a qualquer poeta da terra assinada pelos melhores jornalistas da época: Luiz da Câmara Cascudo (RN), Nélson de Araújo (BA), Sérgio Milliet (SP), Valdemar Cavalcante (RJ), Renato Bonfim (RJ) e Álvaro Pinto (RJ).
Pássaro de Pedra e Sono representa um momento único de intenso lirismo, onde encontramos o espírito mais fundamente criador da poesia de Santo Souza, sobre o rumo dos homens. Qual pássaro em vôos da linguagem, totalmente livre, o poeta nos remete a espaço, longos vôos. Pedra é poder, rigidez e Sono justiça, a bem aventurança, conservação da reatividade aos estímulos externos. Pássaro, Pedra e Sono são expressões das dimensões humanas. Com essa publicação sua poesia ganha um novo corpo uma nova aura, agora na revelação da metalingüística do poeta que experimenta outras linguagens. Sua poesia social, agudamente original, capaz de condensar todo o destino do homem, retrata suas próprias emoções e não existiria sem a riqueza e o brilho da poesia de José Sampaio (1914-1956), e do aracajuano Enoch Santiago Filho (1919-1945) com seu lirismo espontâneo, poderoso. A busca do consolo para essa poesia confessional, a projeta do âmbito pessoal e limitado, dando-lhe um caráter universalizante. O poeta Santo Souza, resistiu à pressão, conservou-se diferente de todos, não perdeu nunca a esperança de um mundo melhor em que lágrimas se transformarem em sementes capazes de rebentarem na vida da nova geração.
O livro, Pássaro de Pedro e Sono produzido lentamente sob forte pressão do tempo, interrogam a existência, o homem e o mundo, mostrando-lhes os verdadeiros caminhos para se chegar à utópica humanidade, onde o poeta ressalta o fato de que sua criatividade poética convoca o leitor a segui-lo, numa atitude reveladora do percurso percorrido na busca da palavra poética. Por exemplo, Pode-se observar através da própria estrutura do poema Decreto-Lei nº13, o dizer revela o mundo, não o seu mundo interior, mas um mundo real captado por sua lente durante o processo de criação, ultrapassando seculares barreiras.
Depois de ter sido anunciado na imprensa local desde o início do mês de janeiro o lançamento do livro, Pássaro de Pedra e Sono: “o poeta Santo Souza esta aguardando apenas que o Movimento Cultural de Sergipe marca a data pra o lançamento de seu próximo livro, intitulado Pássaro de Pedra e Sono, já no prelo, na Livraria Regina.” 1 Finalmente a tão esperada manhã de autógrafos aconteceu às 10 horas do dia 25 (sábado) de janeiro de 1964, na Livraria Regina à Rua João Pessoa nº137 que através da qualidade gráfica de suas publicações marca o cenário cultural de Aracaju. A edição era mais uma realização do Movimento Cultural de Sergipe, dirigido pelo escritor José Augusto Garcez. 2
Pássaro de Pedra e Sono, Aracaju, 105 p., 1964 (capa de Lev Smarcevski; Desenhos de Jenner Augusto, Lênio Braga, Leonardo Alencar), Edição do Movimento Cultural de Sergipe: 3 “A volta do autor de Ode Órfica ao mundo editorial sergipano será abrilhantada com um coquetel, oferecido pela Divisão de Difusão Cultural da Prefeitura de Aracaju, a realizar-se às dez horas de sábado.” 4
A Rádio Jornal de Sergipe esteve presente no dia do lançamento e entrevistou vários intelectuais sergipanos, entre eles falou o professor e cronista Garcia Moreno (1910-1976), o jornalista Ezequiel Monteiro e o crítico e poeta Alberto Carvalho (1932-2002), que em primeira mão fez comentários sobre o livro Pássaro de Pedra e Sono. Vejamos as palavras de Garcia Moreno:
“È com muita alegria que me encontro presente à esta manhã de autógrafos em torno desse povo. Na minha opinião já manifestada de maneira mais amiga e escandalosa, é o maior poeta de Sergipe, lança seu último livro Pássaro de Pedra e Sono.” 5
Em seguida falou Ezequiel:
“Antes de mais nada meus cumprimentos aos ouvintes da Rádio Jornal e meus agradecimentos do entrevistado ao repórter Antônio Lopes, meu prezado e querido amigo pela oportunidade que me dá neste instante, consternar a minha grande satisfação e a minha grande alegria, pelo fato de está assistindo ao lançamento deste novo livro do poeta Santo Souza, Pássaro de Pedra e Sono.
Numa opinião despretensiosa, considero o lançamento do livro novo de Santo Souza um conhecimento significativo não só para a cultura sergipana, como para o próprio processo da literatura brasileira, onde a contribuição de Santo Souza aparece com uma involumia, todo original quer seja, a mínima contribuição para o simbolismo no norte e nordeste do país. É preciso que um especialista, um crítico de poesia como é o caso do nosso ilustre e companheiro Alberto Carvalho. É possível que ele conheça outro caso no norte do país, mas eu como leigo desconheço outra contribuição dessa natureza. Além de que a posição de Santo Souza, seguindo informações que obtive acerca desse novo livro, está oferecendo uma passagem, uma evolução para uma poesia, para visitante. Considero isso também um dado altamente auspicioso.” 6
E finalmente falou Alberto Carvalho:
“Senhores ouvintes da Rádio Jornal de Sergipe: tenho a dizer, primeiramente, que sou um crítico aposentado, ultimamente. Mas isso não impede que diga que, sobre o livro de Santo Souza, ainda não lido porque afinal de contas estamos no lançamento e eu não tive o prazer de lê-lo no original, tenho a dizer apenas que Santo Souza se constitui na maior voz poética de Sergipe, isso sem favor nenhum, mesmo porque eu sou até suspeito de falar do livro, porque tive uma surpresa hoje pela manhã: eu li (agradabilíssima, como está dizendo aqui o poeta, Clodoaldo Alencar) que o livro também está oferecido a minha pessoa. De maneira que, mesmo sob esta suspeita que não invalida o meu depoimento, tenha a dizer que espero, com a certeza que tenho que Santo Souza ao lançar esse livro se impôs mais uma vez como a maior voz poética de Sergipe. Esperamos dar uma opinião mais adiante, se para tanto aparecer alguma página em que eu possa voltar a escrever.” 7
Devido à repressão política, a partir do movimento militar de 64 que censurou centenas de livros, sob os mais variados pretextos, a receptividade crítica de Pássaro de Pedra e Sono é mínima, salvo algumas pequenas notas no decorrer da semana do seu lançamento:
“O Movimento Cultural de Sergipe, após vários meses inativo reiniciou suas atividades editoriais na manhã de ontem, aliás com mérito. Lançou novo livro de José Santo Souza, um dos mais comentados da moderna poesia sergipana, e figura respeitável nos círculos intelectuais do País. Pássaro de Pedra e Sono tirou do ostracismo o Movimento de José Augusto Garcez, movimento esse que lançou no mundo literário o próprio Santo Souza.” 8
Um mês após o lançamento aparece na Gazeta de Sergipe o artigo Mais um Pássaro de Pedra e Sono, apesar de não está assinado é de autoria de Hunald Alencar onde cita alguns poetas bem sucedidos a nível internacional: Maiakóvski, Neruda, Nicolás Guillén e Brecht, no Brasil João Cabral de Melo Neto, Moacyr Félix, Paulo Mendes Campos e Vinícius de Moraes, para justificar sua semelhança no processo criativo de Santo Souza: “assemelha-se ao desses poetas notadamente em João Cabral de Mello Neto, pela mais integral recriação popular, não só pelas imagens como pela metrificação da literatura de cordel, enfim motivos do artista popular.” 9
Em março, Pássaro de Pedra e Sono foi censurado pela ditadura militar e retirado das prateleiras da Livraria Regina e exposto pela força pública como livro subversivo. Tivemos notícias através dos jornais da época, que Gizelda Moraes, apresentada em seu livro de estréia, Rosa do Tempo (1958) por Santo Souza que disse: “mal acorda para a vida e já preocupada com o eterno problema do homem em face do universo.” Pois bem essa discípula do poeta escreveu sobre o livro no número 2 do Boletim Literário da Prefeitura. 10
Somente em outubro vai aparecer uma crítica significativa, Pássaro de Pedra e Sono, na coluna O Vitral e o Espelho, dirigido pelo poeta Alberto Carvalho:
“Pássaro de Pedra e Sono, anunciado havia algum tempo foi, em parte, uma obra feita no dia-a-dia do poeta. Explico: mesmo durante a impressão do seu livro, Santo Sousa foi refundindo, criando e incluindo novos poemas acicatados pelo momento histórico em que vive, neste tempo que todos procuramos tornar em tempo brasileiro. Assim, o livro foi engravidando e, nas dores de cabeça dos editores, surgiu o poeta em nova linha.” 11
Pássaro de Pedra e Sono, além da repercussão em Sergipe entre os intelectuais, o livro repercutiu nacionalmente, recebendo crítica de Walmir Ayala (Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 24.04.64) 12 e José Condé (Correio da Manhã, Rio de Janeiro. 28 e 29.03.64). Um ano após o lançamento, o poeta Hunald Alencar em sua coluna Arte do Sergipe-Jornal registra a publicação de um artigo de Walmir Ayala no Correio da Manhã do Rio de Janeiro, edição de 1º de janeiro do corrente mês, sobre o livro de Santo Souza, Pássaro de Pedra e Sono, como um dos melhores livros do ano: “De Aracaju recebemos um livro de Santo Souza, um poeta surpreendente pelo canto compacto de apelo social. Título do livro, Pássaro de Pedra e Sono. Uma experiência que se externa sem ludibriar, que convence pela sinceridade, que não repudia a beleza.” 13
Pássaro de Pedra e Sono, composto por vinte dois poemas com temática universal marcada por aqueles dias de tormentas, como Macumba, Paus de arara, João o Semeador, Ciranda, Noite de Natal, Decreto-Lei nº13, Canção de Condenados Canção para os Famintos, qualquer um desses poemas poderiam está presente num dos três volumes de Violão de Rua (1962/1963), Cadernos do Povo Brasileiro, poemas para a liberdade, publicados pela Editora Civilização Brasileira, uma poesia humanista, de episódios da vida política brasileira. Vários participantes da antologia se projetaram nacionalmente: José Carlos Capinan. Moacyr Felix, Geir Campos, Jacinta Passos, Affonso Romano de Sant’ana, Ferreira Gullar e outros.
Vemos bem o que nem sempre é muito claro em seus livros anteriores, não escapa a regra. Santo Souza vive num tempo podre de podres poderes, tempos de guerra: Renúncia de Jânio Quadro, posse de João Goulart, greves, mortes, prisões, Volantes do CPC (Centro Popular de Cultura), soldados nas ruas. A Liga Camponesa de Francisco Julião, os comunistas em favor da reforma agrária, desagradando aos representantes dos interesses dos grandes proprietários de terras. A atmosfera, portanto, era de confronto.
O livro sinaliza uma busca, uma necessidade o desejo de encontrar a serenidade, a Pedra primeira para o conhecimento pleno da sua revelação, do exercício do viver que aprende o mundo e o traduz em poesia. Ou seja, Pássaro de Pedra e Sono é o grito da terra, uma amostra de sua trepidação diante da vida e da poesia. Há que se observar, segundo José Augusto Garcez que o livro “é um grito dentro da vastidão deste cenário. Um grito para todos os ouvidos, espécie de clamor endereçado a todas as consciências. Há nele o cheiro da terra que serviu de ponto de partida na sua elaboração. O gosto amargo da paisagem onde seus homens se movem sem, contudo, abdicar à linha demarcativa daquele universalismo que tem sido a tônica mais alta na poesia do autor de Ode Órfica.” 14
Autor de diversos títulos consagrados, nome reconhecido por todos os que se interessam por poesia, Santo Souza é um poeta voltado para as indagações e as paixões mais próprias das oficinas do fazer poético. Ele próprio é quem diz:
Antes, mal reuníamos o susto 
com que o desviver nos amealha.

Ponte armada entre o agora e o amanhã, 
o sono transportava o nosso esforço 

ao esquecimento, nos repartia 

o sono e a calma, em paz e liberdade.

A boa imagem da sua extensa e importante obra, toda ela saudada pela comunidade intelectual, tingida dos tons fortes das lembranças de uma Riachuelo dos tempos dos canaviais. O livro retoma o velho tema, sempre novo, costurando com uma poesia aparentemente casual e despretensiosa, mas na verdade intencional. Pássaro de Pedra e Sono é um hino de louvor ao homem, no confronto com os poderosos mortais. A força da poesia santosouzeana está sempre em desobediência, considera-se sempre um aprendiz, porque esta é a sua palavra de ordem, palavra de honra. Portanto, Santo Souza se inclui sem a menor dúvida entre as vozes mais coerentes e merecedoras de respeito e atenção da nossa contemporaneidade, quer pela convulsiva beleza de sua poesia, quer pelo humanismo do cidadão do mundo. 15
O Decreto-Lei nº 13 de Santo Souza, teria inspirado os
Estatutos do Homem de Thiago de Mello?
Escrito em 13 de maio de 1962, o poema Decreto-Lei nº13 foi publicado no livro Pássaro de Pedra e Sono, em 1964, que se encontra dividido em quatro artigos e um parágrafo. 16
Um fato curioso aconteceu dois ou três dias após o lançamento de Pássaro de Pedra e Sono, quando Santo Souza foi procurado em sua residência por Ester sua vizinha, uma jovem ligada aos movimentos sociais da época que desejava outro exemplar do livro para presentear um companheiro, segundo ela um poeta do sul do país que se encontrava em Aracaju e havia lido alguns dos poemas e ficado muito impressionado pela proposta apresentada. Pois bem, esse poeta dias depois seguira para Pernambuco, estava envolvido no movimento das ligas camponesas de Francisco Julião, levando consigo um exemplar de Pássaro de Pedra e Sono. Até aquele momento Santo Souza desconhecido o nome daquele anônimo poeta. Tempos depois lendo os Estatutos do Homem, de Thiago de Mello, percebeu que seu poema Decreto-Lei nº13, escrito em 1962 que se encontra no livro Pássaro de Pedra e Sono, publicado em janeiro de 1964, havia influenciado ou induzido o poeta amazonense a escrever os Estatutos do Homem, poema mundialmente conhecido. Este depoimento, revelado por Santo Souza em várias ocasiões em que estivemos juntos, sempre me deixou intrigado. 17 Na qualidade de pesquisador não que desacreditasse em Santo Souza, mas era preciso localizar o registro da passagem de Thiago de Mello em Aracaju. Retomei as pesquisas em periódicos da época na esperança de consegui nas colunas literárias, políticas ou sociais, alguma informação, ao mesmo tempo em que enviei correspondência ao poeta amazonense solicitando alguns esclarecimentos sobre sua passagem por Aracaju.
O poema Os Estatutos do Homem, 18 de Thiago de Mello, escrito em Santiago do Chile, abril de 1964 e publicado no livro Faz Escuro mais eu Canto, Editora Civilização Brasileira, 1965. 19 O Prefácio escrito em espanhol pelo poeta chileno Pablo Neruda, data de março de 1965: Desde que Thiago llegó a Chile..., era o texto de apresentação que foi lido na homenagem prestada ao poeta brasileiro Thiago de Mello pelos intelectuais, artistas e amigos chilenos por ocasião do seu afastamento do posto de adido cultural do Brasil no Chile.
Os Estatutos do Homem é uma obra de arte, um livro em que a poesia se apresenta simples e profunda, para marcar o compasso do dia-a-dia, em tempos tão urgentes. Thiago de Mello se afirma pelo trato da linguagem moderna, onde o poeta declara sua fé na arte e na poesia, no homem, no amor e na ternura, com sua poesia de forte expressão lírica, moderna, ágil e dinâmica.
Segundo Thiago de Mello, o poema Estatutos do Homem foi escrito em 31 de abril de 1964, onde o autor chama à atenção do leitor para os valores simples da natureza humana. Este é seu poema mais conhecido e foi traduzido para mais de 30 idiomas. Thiago de Mello afirma que os Estatutos do Homem “não me pertencem mais. Pertencem a tantas esperanças. Vou atender de maneira muito singular o pedido do Altino. Eu não gosto e dizer esse poema. Ele me comove. Não sei se terei mais dias para cumprir essa esperança de ser o homem que eu canto. Altino, eu espero, quando te façam um pedido com a naturalidade que tu fizestes, que tu atendas. Tá bem? Eu não direi todo o poema. Eu direi algumas estrofes.” 20
Além de editado separadamente em livro, gravado a fogo sobre couro, encontrados em feiras de arte popular de vários países da América, em poster, transformado em ballet e em Cantata pelo cantor erudito belga Peter Janssens foi lançado em 1977 em oito universidades alemãs. Em novembro de 1985, durante visita com Hélio Dutra a Casa de las Americas, em Habana, adquirir o LP Thiago de Mello – Poesía, editado pelo Centro de Investigaciones Literarias, coleção Palavra de esta America nº44 (1980), e entre os poemas estava Los Estatutos del Hombre e recentemente consegui por intermédio do amigo radialista Paulo Correa o LP Thiago de Mello – Estatutos do Homem & Poemas Inéditos, produzido pelo Instituto Alberione para o Selo CSP Records (SP), com trilha sonora de Alexandre Manoel Thiago de Mello (Manduku), 1989.
Não sendo possível localizar nenhum registro nas coleções de periódicos sergipanos do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e da Biblioteca Epifânio Dória, referente à estada do poeta Thiago de Mello em nossa capital, o que não anula a afirmativa de Santo Souza, nem ter recebido a correspondência tão esperada de Thiago, informando sobre sua passagem por Aracaju, em janeiro de 1964. Por este motivo, reproduzimos no final do ensaio, o poema Decreto Lei nº13, do poeta sergipano, Santo Souza, para avaliação do leitor.
Biografia
O poeta Santo Souza, tão admirado por nós sergipanos, com suas edições de circulação local e nacionalmente injustamente esquecido pela crítica, felizmente teve sua biografia e alguns poemas recentemente publicados pela professora, Doutora em Literatura Comparada, Marlene Hernandez Leites, num dos quatros volumes da Literatura e Afrodescendência no Brasil: antologia crítica. 21 Nessa oportuníssima consideração da professora Marlene, ao comentar em seu texto a quarta publicação do poeta, afirma que: “Pássaro de Pedra e Sono, além de enunciar a repressão política, pode ser considerado um clamo ao despertar de consciências, e visam tanto aos políticos que dirigem nosso país como aqueles que vivem e não enxergam a miséria e a fome.” 22
José Santo Souza nasceu a 27 de janeiro de 1919 em Riachuelo (SE), filho de Manoel Raimundo Vasconcelos e Hermínia Araújo, teve uma infância sofrida, devido à origem familiar humilde. Freqüentou a escola primária da professora Maroca Marafuz, encerrando seu ciclo escolar. Num dia de feira sua mãe foi surpreendida pela professora, lhe avisando que o menino não poderia ser matriculado no próximo ano, esta “grande” sabia demais, estava pronto e como professora não tinha mais nada para ensinar-lhe. Dotado de uma inteligência privilegiada, Santo Souza aprendeu a ler muito cedo, através das bulas (prospectos) que vinham em quatro idiomas: francês, italiano, inglês, espanhol, e nos almanaques, encontrados com facilidade nas farmácias da época. Autodidata, poeta órfico, começou a escrever muito jovem, aos oito anos incursionando pelo mundo das letras e já escrevia um jornal para a escola em que estudava. Aos onze anos, Santo Souza escreveu um poema que o impressiona até hoje:
A origem do amor é um fanal 

Que ilumina a fonte de nossa amargura 

Tornando nosso coração cheio de ternura 

Semelhante à luz espiritual

Aos treze anos começa a trabalhar na Farmácia do tio Francisco Vasconcelos Prado. Em 1937 muda-se para Aracaju e trabalha como prático numa farmácia. Três anos depois, casa-se com d. Maria Ana, com quem teve oito filhos, época em que recebe orientação do professor José Franklin, orientando a leitura dos clássicos da literatura portuguesa e ele começa com Os Lusíadas, de Camões, passando em seguida para os gregos:Platão, Sócrates, Aristóteles, Esquilo, passando por Shakespeare, Dante Alligiere e por fim chega aos românticos da literatura brasileira. Este homem culto era capaz de ler grego, espanhol, francês, italiano e logo se integra aos movimentos culturais da cidade.
Em 1952 Santo Souza passa a trabalhar no Banco do Comércio, somente seis anos depois ingressaria no serviço público trabalhando na Previdência Social, de onde é aposentado. Santo Souza redigiu, de 1953 a 1966, a Crônica da Cidade apresentada diariamente nas: Rádio Liberdade, Difusora e Jornal de Sergipe. Colaborou nas principais Revistas e Jornais de Sergipe. Membro da Academia Sergipana de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe e da Associação Sergipana de Imprensa – ASI.
Publicações
Cidade Subterrânea -1953 
Caderno de Elegias – 1954 

Relíquias – 1955 

Ode Órfica (1955/1956/1968) 

Pássaro de Pedra e Sono – 1964 
8 Poemas Densos – com Hunald Alencar, Alberto Carvalho e Renato Nunes – 1965 
Concerto e Arquitetura – 1974 
Pentáculo do Medo – 1980 
A Ode e o Medo – 1988 
Obra Escolhida – 1989 
Âncoras de Argo – 1994 
A Construção do Espanto – 1998 
Antologia Poética – CD – 1998 
Roda de Fog e Lágrimas – 2004 
Réquiem para Orfeu – 2005 
Ésquilo na Tormenta – 2006 
Vultos & Vozes de Sergipe – 06 - Antologia 
Deus Ensangüentado - 2010

Notas
1.Aracaju. Gazeta de Sergipe, 19 de fevereiro, 1964. 
2. Segundo informações do escritor Jackson da Silva Lima, o livro Pássaro de Pedra e Sono já se encontrava impresso desde novembro de 1963, apesar de constar no frontispício o ano de 1964. 

3. Pássaro de Pedro e Sono, Santo Souza. 2ª edição, Sociedade Editorial de Sergipe, 2002, 75 p. (capa Jenner Augusto), apresentação de Luiz Antonio Barreto: 

4. Aracaju. Gazeta de Sergipe, 25 de janeiro, 1964. 

5. Vultos & Vozes de Sergipe – 05, Santo Souza CD, faixa 15 (org. Jackson da Silva Lima). Aracaju, 2006. 
6. Vultos & Vozes de Sergipe – 05, Santo Souza CD, faixa 16 (org. Jackson da Silva Lima). Aracaju, 2006 
7. Vultos & Vozes de Sergipe – 05, Santo Souza. CD, faixa 17 (org. Jackson da Silva Lima). Aracaju, 2006. 
8. Informações Culturais. Aracaju, Gazeta de Sergipe, 26 de janeiro de 1964. 
9. Aracaju. Gazeta de Sergipe, 23 de fevereiro de 1964. 
10. Este Boletim Literário da Prefeitura não foi localizado. Consultando a escritora Gizelda Moraes, informa desconhecer a publicação. 
11. Pássaro de Pedra e Sono, Aberto Carvalho. Aracaju, Sergipe-Jornal, 11 de outubro de 1964. 
12. Esse artigo foi reproduzido no livro de Walmir Ayala (1933-1991), A Novíssima Poesia Brasileira, Rio de Janeiro, 1965. 
13. Pássaro de Pedro e Sono, Hunald Alencar. Aracaju, Sergipe-Jornal,08 de janeiro de 1965. 
14. Pássaro de Pedro e Sono, Santo Souza (contracapa, José Augusto Garcez). Aracaju, Livraria Regina/Edição Movimento Cultural de Sergipe, 1964. 
15. Santo Souza, o poeta órfico, GILFRANCISCO. Aracaju, Jornal da Cidade, 14 de setembro, 1999. 
16. Decreto-Lei é o Decreto com força de lei baixado pelo Poder Executivo, quando este acumula funções do Poder Legislativo. 
17. A última vez em que estive com o poeta em sua residência foi no dia 21 de setembro de 2012, com a equipe de reportagem da TV Alese, para a realização do vídeo Prazer em Conhecer. 
18. Estatutos, Lei orgânica ou regulamento de um Estado, uma associação. É um texto que regulamenta o funcionamento de uma associação por exemplo. 
19. Faz Escuro mais eu canto, aparece como publicidade de lançamento nas páginas da Revista Civilização Brasileira, Ano I, nº4, setembro, 1965. 
20. 11 de outubro, 2009, palavras ditas por Thiago de Mello para uma platéia de 200 estudantes do ensino médio, que participavam de um dos eventos do Festcine Amazônia, no Teatro Banzeiros – Porto Velho (RO). 
21. Literatura Afrodescendência no Brasil: antologia crítica, Vol. I, Eduardo de Assis Duarte (org.). Belo Horizonte, Editora UFMG, 2011. 
22. Literatura Afrodescendência no Brasil: antologia crítica, Vol. I, Eduardo de Assis Duarte (org.). Belo Horizonte, Editora UFMG, 2011.

Decreto Lei nº13
Santo Souza
Pescadores, camponeses, mineiros e tecelãs 

(condutores de cansaço, desespero e madrugadas); 

e operários – doadores de força, vida, agonia e suor para o cimento das soberbas construções, depois de muito lutar, depois de muito sofrer;

Considerando que a terra, 

na magia de seus atos 

transforma em frutos e seiva 

o sangue vivo dos homens;

Considerando que o vento, 

pastor das ondas do mar, 

e de todos os que lutam 

se quiserem respirar;

Considerando que os rios 

(o mundo livre dos peixes) 

são de todos que têm sede 

nesta dura escravidão;

Considerando que a noite 

(a semeadora de estrelas) 

é de todos que semeiam 

sementes e construções;

Considerando, por fim, 

que a lei diz textualmente 

no artigo primeiro e único: 

“quem não trabalha não come”.

Revestidos dos poderes 

que lhe confere a Lei 13, 

De maio de qualquer tempo, 

aprovada pelo povo 

em assembléia,
Decretam:
Art. 1º - Fica abolida a miséria 

nos lares todos do mundo 

e os frutos vindos da terra 

serão para os que têm fome.

Art. 2º - Os ventos serão mantidos 

à altura das mãos humanas, 

como símbolos maduros 

da liberdade dos homens.

Art. 3º - Os rios serão o espelho 

que há de sempre refletir 

as cores arco-irisadas 

da total felicidade

Art. 4º - As noites serão o ventre 

na imensa fecundação 

da luz mansa do futuro, 

da redenção dos que sofrem.

§ único - Para sossego geral 

hoje serão fuzilados 

miséria, fome, opressão. 

fabricadores de guerra, 

empresários da desordem, 
pilotos negros da morte 
destruindo gerações, 
ódio, trustes, latifúndio 
- tudo e todos que ora vivem

Sugando as forças do mundo 

Bebendo o sangue do mundo.


*Foto e texto reproduzidos do blog: professorgilfrancisco

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 12 de dezembro de 2012.