segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

João Firmino Cabral (1940 - 2013)

Foto reproduzida do site: et7ra.com.br

João Firmino, cinco décadas de versos.
Por Lu Almeida · Aracaju, SE - 18/9/2006.

Por detrás das lentes, os olhos azuis fitando cada olhar mais curioso sobre as palavras. Nos pés sandálias de couro. As pernas inconstantes pra toda gente que passa e acaba ganhando um verso tirado. De ponta a cabeça se conversa sobre todo tipo de coisa: desde o problema de saúde mal-resolvido ao amigo entregue à cachaça. E até mesmo de poesia. Assim é a banca de João Firmino Cabral, 66 anos e 50 de versos. Da história miúda a nota no jornal, Seu João aproveita de tudo um pouco como mote para criar. Cordel é sua dedicação maior, instrumento de lida diária e parte de sua própria história.

Na Passarela das Flores passa de moça virgem a dona de casa, de bêbado a turista distraído. De verso de cordel, a margarida e criança largada. Cheiro de rosa vermelha, voz de repente, acorde de viola e passo de alpercata. É logo na entrada do Mercado Antônio Franco, nas palavras de Seu João “a boca do inferno”, onde fica o seu balcão de livrinhos. Nada mal chegar pelas bandas do capeta, lendo de aprumo.

“Meu ofício foi ser cordelista toda vida”, fala de início esse itabaianense nascido em Belo Jardim. Sua infância era ir de São Cristóvão para Aracaju no trem suburbano na linha Aracaju/Salgado ou Aracaju/Capela. Logo pela manhã vinha pegar carrego e depois começou a vender noz-moscada, pixilim e BHC. Já pelos 14 anos, sempre dava uma paradinha para observar o versado dos cordelistas Pedro Armando dos Santos, Genésio Gonçalves de Jesus, Zé Aristides e o famoso Manuel d’Almeida Filho. “Eu ficava vendo o dia todinho, achava aquilo bonito. Um dia eu fiquei olhando até que perdi o trem. Daí um deles me chamou pra pernoitar na sua casa”, conta ele, todo menino.

Pois foi aí que a coisa mudou. Seu João trocou as vendas e o trabalho com carrinho de mão pelos cordéis. Chegando na morada de Manuel d´Almeida, um dedo de prosa e a vontade de entrar no ramo do cordel. “O Mestre me cedeu uns 300 a 400 folhetos pra revender. Fui então pra feira vender e cantar os livretos. Da sexta pra terça-feira eu tinha vendido uns 400 e poucos livrinhos. Nem Seu Almeida acreditou no meu feito”, fala orgulhoso o homem que naquele momento deixava o agreste. Depois, morando na capital, lança seu primeiro cordel “As Bravuras de Miguel, Valente Sem Igual” nos idos de 1956.

Na sua mais recente produção, “Os corruptos do Brasil, o mensalão”, feito em parceria com Juraci Medeiros, João Firmino versa sobre o retrato político brasileiro “políticos sem escrúpulos/ dizem ser os defensores/ mas são como sanguessuga, corruptos/ sonegadores do direito e liberdade/ dos nossos trabalhadores”. Com essa mesma inteligência, o filho do cantador de feira e embolador Pedro Firmino Cabral e da roceira Dona Cecília Conceição aprendeu a ser letrado através desses pequenos livros. Alfabetizou-se pelas “cartilhas” que o ensinaram mais que o bê-a-bá.

Meio século dedicado ao cordel, mais de cinco dezenas de títulos publicados, esse João Firmino bateu do Rio Grande do Norte, a Pernambuco, Maranhão, Alagoas e Bahia de feira em feira. Deu de sustento aos sete filhos nos quarenta anos de casamento com Dona Carmelita Cabral. Catedrático sobre essa literatura, foi revisor de 1970 a 2005 da Editora Luzeiro e já foi laureado pelos quatro cantos do Brasil. Mas quando fala de prêmios, Seu João atenta mesmo é para o ganho com a leitura. Saca então um trechinho “A cultura adulatória/ falsifica a popular/ com palavrões e conchavos/ de narrativa vulgar / agredindo ao cordel/ que tem muito mais a dar”. ( Na história da literatura do cordel ... cuidado cantor para não dizer palavra errada. Abdias de Campos - 2005).

Onde ler & comprar

Barraca de Seu João Firmino, no Mercado Albano Franco, centro de Aracaju, logo depois da Passarela das Flores. Aberta de segunda a sábado das 9h às 17h. É um ponto de encontro da turma da poesia. Um bom dia é o sábado, vai de aboiador até repentista. Depois faça uma refeição, logo ao lado, no restaurante de Seu Zé Américo. Uma sanfoninha sempre chora-chora enquanto os pratos são servidos.

Biblioteca Clodomir Silva, onde fica localizada a Cordelteca “João Firmino Cabral”. Rua Santa Catarina, número 314, Bairro Siqueira Campos.

Reza uma lenda que na Biblioteca Epifânio Dória há uma sala para cordéis, chamada “Poeta Manuel d´Almeida”. Arrisque e depois me conte. Rua Vereador João Calazans, número 609, Bairro 13 de Julho.

Vale fazer uma visita ao poeta Gilmar Santana Ferreira, mais conhecido como o caçador de poetas. Na sua casa há um arquivo extenso sobre cordelistas, principalmente, daqueles que residem no interior de Sergipe. Rua Nelson Maynard (antiga Rua F-2), número 98, Conjunto Bugio.

Fotos e texto reproduzidos do site: overmundo.com.br

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, em 3 de fevereiro de 2013.

Um comentário:

  1. Todas as vezes q eu cruzava o mercado, pela passarela das flores, eu olhava logo a banca de 'seu' Firmino com os olhos mais abertos q ficava logo ali num canto onde tem o comércio das flores. Realmente é uma perda irreparável e q o mesmo seje um dos anjos lá no céu

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