quarta-feira, 8 de julho de 2015

Os sapatos do Padre Pedro


Publicado originalmente no Facebook/Carlos Alberto Déda.

Os sapatos do Padre Pedro.
Por Carlos Alberto Déda.

Recentemente, ao comentar minhas lembranças do Ginásio Jackson de Figueiredo, meu amigo e colega Ubiratan Mendes fez referência à memória da Professora Zamor de Melo e aproveitou a oportunidade para lembrar outro sergipano inesquecível: o Padre Pedro.

A Professora Zamor de Melo tinha origem em Aquidabã e era tia dos amigos benebeanos Antônio Carlos Melo Maynard, que foi meu colega nas Agências do Banco do Nordeste, em Simão Dias e em Aracaju, e Alberto Maynard, que foi o Chefe do Departamento de Auditoria na Direção Geral daquele banco, em Fortaleza.

O padre Pedro (Pedro Alves de Oliveira) era de Riachão Dantas. Aqui em Aracaju ele notabilizou-se por sua fé e por seu trabalho de dedicação ao próximo. Seguia cuidadosamente os ensinamentos de Cristo, dedicando-se aos menos favorecidos. Ele foi considerado o sergipano mais importante dos últimos 100 anos, em enquete patrocinada pela TV Sergipe, no ano 2000. Seus familiares são personalidades do meio cultural sergipano: os artistas plásticos J. Inácio, seu irmão, e CAÃ, seu sobrinho; e o professor da Universidade Federal de Sergipe: Rafael Oliveira, também seu irmão.

O padre e a professora tinham em comum o respeito e a admiração do povo sergipano.

Conheci o Padre Pedro quando eu era aluno do Ginásio Jackson de Figueiredo, um colégio de ensino católico. Os alunos internos frequentavam a missa dominical na Catedral, ministrada pelo Bispo Dom Távora, conhecido como o bispo dos operários. O Padre Pedro ajudava nas festas da principal igreja do bispado. Todo ano, na véspera do domingo de páscoa, os estudantes faziam a confissão para comungarem na missa pascal. A Catedral ficava repleta de juventude e o confessionário do Padre Pedro era logo identificado pela longa fila de jovens. A moçada preferia se confessar com o padre que não esmiuçava nem procurava detalhes das faltas reveladas, ouvia de relance os pecados e recomendava que o pecador rezasse três padre-nossos e três ave-marias na contrição de não mais pecar, pedindo a absolvição dos erros cometidos. Padre Pedro era o exemplo de um verdadeiro sacerdote.

Certa vez, comentando sobre o comportamento de um vigário do interior sergipano, disse-me meu tio Paulo Déda que conhecera muitos padres, a maioria dedicados à religião, mas que um deles se distinguia por sua dedicação em seguir os ideais humanitários pregados por Jesus, especialmente no que dizia respeito à solidariedade aos indefesos e o amor aos pobres e humildes. Dizia ele, com absoluta razão, que esse padre chamava-se Pedro, seu conterrâneo de Riachão do Dantas. E, então, contou-me um fato curioso que repasso aqui.

Em um dia de inverno, estava meu tio em sua loja, Esquina da Economia, a conversar com o Sr. Camilo, que também era proprietário de uma casa comercial ali próximo. Observaram que em frente à loja o Padre Pedro prestava ajuda a um faminto mendigo. Com seu alhar perspicaz de sapateiro, o tio Paulo percebeu que o padre usava sapatos rotos, velhos mesmo. Convidou-o a entrar na loja e o convenceu a aceitar um par de sapatos novos como presente. O padre não teve como evitar a oferta, porque os sapatos velhos e furados causavam dores em seus pequenos pés devido a umidade, ocasionada pelas pisadas em calçadas molhadas, e as pedrinhas que entravam pelos buracos no solado. Agradecido, o padre aceitou o presente.

Na semana seguinte, meu tio constatou que o padre voltara a usar sapatos rotos. Não se conteve e perguntou o que tinha acontecido. E o bondoso padre disse que, em sua caminhada pelas ruas de Aracaju, deparou-se com um pobre trabalhador que usava sapatos velhos, ruins mesmo, e não se conteve: passou-lhe seus sapatos novos em troca dos velhos. Meu tio, sentindo a solidariedade aflorar na expressão do humilde conterrâneo, pegou novo par de calçados e relutou para que o padre os recebesse. Somente depois de muita conversa é que o bom Pedro concordou com o novo presente.

Mas foi a última vez porque, poucos dias depois, em passos ligeiros, o Padre Pedro passava em frente à loja, usando as inseparáveis batina preta e bolsa ao lado, calçando sapatos velhos e rotos.

E concluía meu tio:

- Esse era realmente um padre “santo”.

Aracaju, 29/06/2015
Beto Déda.

Texto e imagem reproduzidos do Facebook/Carlos Alberto Déda.

Postagem originária da página do Facebook/GrupoMTéSERGIPE, de 30 de junho de 2015.

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