sábado, 21 de fevereiro de 2015

Eita perruche!

Foto reproduzida do Facebook/MTéSERGIPE/Clóvis Franco.

Eita perruche!
Por Amaral Cavalcante.


(Para D. Caçula Valadares)

Bolinhas de um verde encabulado que estalam no céu da boca os trincos do tatu peba
coisa de sertão brabo
alpercata rangendo o couro cru na caatinga.

-Gosto de quê?
- De nada não, não tem parecença.

Não tem cereja que lhe tome a formosura
nem outro doce assim
tão carinhoso que afague com maciez e ternura
boca
paladar
e coração sertanejo.

-Ela nasce como os gravatás no mistério das pedras, ou será como o umbu, mais pertinho do rio?

-Isto eu não lembro. Sei que só dá na trovoada.

Teimosa, só brota quando a chuva é festa na mata
e na aguada o sapinho de rabo anuncia
danado de contente
que lá vem fartura de Deus molhando a plantação.

Enquanto cataplum ratratá o céu relampeia
Ploc, Ploc, o olho verde perruche espia.

Seu Tiburcio grandão como uma rês de cria amanhece no telheiro
ajeita o cinturão no cós da calça
cospe o primeiro catarro no caco da galinha
e palita contente:

- Ê mundão d’água! Este ano dá!
E volta a escarafunchar um restinho de rapé que é pra mostrar
espirrando
que também verte água pelas ventas.

– Ê ba! Thibum!

Lá dentro, Nanã areia uma bacia grande pra colher maracujá perruche.

-O danadinho é sestroso, só sai do galho se for numa bacia d’água e é assim mesmo que vai pra feira, vendido por lata.

- E o doce, como é que faz?

-Despela uma por uma e cozinha em caldo grosso de açúcar,
com cravo e uma ou duas pitadas de canela.

Se comer quente disunera a barriga.

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De Marcelo Déda:

Maravilha das maravilhas. Doce e agreste como o perruche, esse seu texto, Amaral, meu velho! Não lhe direi mais: risco de parecer adulação o que é deleite, prazer estético, alumbramento de memória, enganando os neurônios, fazendo das letrinhas digitadas em trançados remates de emoção e saudade, o fruto falado (o significado incorporando quânticamente o significante) no gosto verde do doce de peluche que adoçou minha infância na casa de Teté Tefinha - cara de índia velhinha de fundos sulcos arados pelo tempo na placidez da face (o sol de dia de trovoada mandando lascas de luz do fundo dos olhos antigos).
Morava na rua do Coité na minha cidade de Simão Dias.

Marcelo Déda.

Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, de 20 de fevereiro de 2014.

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