segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Rua João Pessoa


Rua João Pessoa.
Por Mário Cabral.

"A Rua João Pessoa, por exemplo, é uma rua tipicamente aracajuana. Chamava-se, antigamente, a Rua do Barão. É uma rua em linha reta, como, aliás, quase todas as ruas de minha cidade. Começa na Praça General Valadão e termina na Praça Fausto Cardoso. A Rua João Pessoa equivale, em síntese, à Rua da Imperatriz, no Recife, ou a Rua do Ouvidor, no Rio de Janeiro.

Lá estão situadas as melhores lojas, os mais importantes magazines, da capital sergipana. Ali existe o comércio grã-fino, ali fazem as compras os burgueses e os novos ricos do pós-guerra. Tudo é mais caro. A classe média e o proletariado fogem, respectivamente, para o comércio da Rua Laranjeiras e da vizinhança do Mercado Modelo.

Você visitará a Casa Cristal, frente ao Cinema Rio Branco, no gênero, a melhor da cidade. No Prato Chinês e na Casa da Louça, você encontrará um sortimento moderno e de fino gosto. Na Casa Régia, A Capital e na Casa Vivinha, você encontrará modas e objetos de arte. Lá estão também a Casa Rochedo, de artigos de eletricidade; a Casa Imperial, Loja Oriente e Casas Mascarenhas, de calçados e artigos para homens; a Casa Alvorada e a Casa Aurora, de sedas; a Casa Ianque, de calçados, roupas e chapéus.

Ali estão situadas três grandes casas de automóveis: a Agência Ford, a Agência Chrysler e a Agência Chevrolet, como também a Drogaria Confiança, a Farmácia Maria, a Farmácia Sergipe, a Farmácia Santa Cruz, a Farmácia Popular, a Farmácia Ipiranga e a Farmácia Menezes.

O Bar Record, com serviços de cafés e gelados, possui também um vasto salão de snooker, o melhormente afreguesado da cidade. Também nessa rua estão situados os vários cafés: o City Bar, o Ponto Certo, o Bar Vitória e a Soverteria Chique, ponto exclusivo da sociedade elegante. A Moda de João Hora, é uma casa comercial que honra a cidade e ao seu fundador. Frente ao Hotel Marozzi, ficam o Edificio Cabral e as modernas instalações da Casa Singer e Ótica Santana.

Mas é preciso ir adiante. O Cine Rio Branco tem uma história de relevo na vida literária, política e artística da cidade de Aracaju. Juca Barreto, seu proprietário, é um nome muito simpatizado. O Rio Branco é tudo, serve para tudo. É cinema, é teatro, é recinto de conferência, salão de concerto, é local de comício político. Lá o aracajuano ouviu Bidu Saião e Tito Schippa, Plínio Salgado e Agliberto Azevedo, chefes integralistas e chefes comunistas, como também discursos democráticos e baboseiras literárias, versos infames recitados pelos corifeus da subliteratura provinciana. Juca Barreto, nisso tudo, é um abnegado: deseja, apenas, servir e ser agradável aos seus conterrâneos.

Na Casa Dois Irmãos, há farto e excelente estoque de artigos para homens. Há, também, a Casa Leal. Dalvo Leal é um centro de atração: verboso, dogmático, doutrinador, falando com autoridade entre a venda de um corte de seda e um vidro de perfume parisiense. Lá é o ponto da magistratura. Juízes e advogados, promotores e desembargadores discutem leis, comentam acórdãos, criticam sentenças, tudo sob o olhar aprovativo do dono do estabelecimento, orgulhoso da fauna judiciária que o envolve.

Adiante, na Rua José do Prado franco, ficam os mercados públicos. Ainda na Rua João Pessoa estão situadas várias livrarias. A Livraria Regina, a Gráfica Editora e a Livraria Monteiro exibem, em suas vitrines, as últimas novidades. A Livraria Regina é a principal, espécie, assim, da Livraria José Olimpio, do Rio de Janeiro. Suas portas, à tarde, ficavam cheias de literatos da terra, que, entre uma anedota fescenina e uma novidade política, olham os desfiles das jovens que fazem o footing. Lá você conhecerá Freire Ribeiro, José Amado, Mário Cabral, Walter Cardoso, Paulo Costa, Santo Souza, Marcos Ferreira, Manuel Cabral, José Cruz, Seixas Dória, muitos outros. Lá não estará, porém, o Poeta da Rosa Vermelha – Artur Fortes. E esse a morte levou, roubando-o, assim, ao nosso convívio e admiração. O Bar Apolo é o lugar certo do aperitivo diário. Vale ressaltar, ainda, o Palácio das Joias.

Assim é a Rua João Pessoa. Lojas, bares, sorveterias, hotéis, bancos, barbearias fazem, dessa rua, a mais movimentada da cidade, com seus transeuntes, com seus flaneurs à porta das livrarias, com os seus ônibus e seus automóveis, e, antigamente, com seus bondes, morosos e superlotados, rolando, indecisamente, em direção aos bairros distantes. A cidade de Aracaju, amiga, começa na Rua João Pessoa."

Texto e foto reproduzidos do Facebook/Linha do Tempo/Antônio Samarone.

Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 3 de febereiro de 2014.

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