sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Lampião e o Fogo da Maranduba




Lampião e o Fogo da Maranduba. 
Por Archimedes Marques.

O ferrenho combate denominado “Fogo da Maranduba”, ocorreu no dia 9 de janeiro de 1932, na Fazenda Maranduba, na época município de Porto da Folha, hoje de Poço Redondo, aqui no nosso querido Estado de Sergipe, cujo intenso e sangrento tiroteio é considerado um dos três maiores enfrentamentos entre cangaceiros e policiais volantes na história do cangaço. Dizem os pesquisadores e historiadores que esse combate só é comparado à sangrenta batalha de Serra Grande, em Pernambuco e ao não menos cruento embate de Serrote Preto, nas Alagoas. As baixas em Maranduba foram muitas e das polícias volantes comandadas pelos valentes e audazes combatentes perseguidores, Tenente Manuel Neto e Capitão Liberato, contabilizaram-se oito mortos e diversos feridos, enquanto que, por parte dos perseguidos cangaceiros somente três mortos (Sabonete, Catingueira e Quina-Quina) e um ferido (Bananeira).

Sem sombra de dúvida, os três combates acima citados se notabilizaram por seus aspectos grandiosos e pela engenhosidade de um líder inconteste, o famigerado estrategista Lampião, o verdadeiro “General das Caatingas”. O famoso bandoleiro à frente de seus cangaceiros, sempre em inferioridade numérica viria a alcançar essas três vitórias fragorosas, imprimindo vergonha às hostes governamentais, provando assim que as Forças Policiais Volantes agiam mais com a emoção transpondo a própria razão, que na verdade não passavam de atrapalhados soldados de guerra e apesar das diversas batalhas desenvolvidas com os cangaceiros em aproximadamente vinte anos de atuação, nunca conseguiram atingir os seus objetivos, a não ser em 28 de julho de 1938, mesmo assim por conta da traição do coiteiro Pedro de Cândido – torturado ou não – que levou o então Tenente João Bezerra da Força policial alagoana até a grota do Angico, em Sergipe, massacrando o bando de surpresa em uma madrugada e pondo fim à carreira criminosa do maior dos cangaceiros da nossa história.

Adentrando na questão dos personagens policiais militares que participaram do “Fogo da Maranduba”, bem verdade é que o Tenente Zé Rufino da Força policial baiana, o “grande caçador de cangaceiros”, se fez presente nessa refrega, mas não em comando e sim comandado pelo Capitão do Exército Brasileiro, Liberato de Carvalho. Das baixas fatais da Força pública, quatro pertenciam à tropa do Capitão Liberato de Carvalho, da Bahia, e quatro da tropa do bravo nazareno Tenente Manoel Neto, de Pernambuco. Do pelotão sob o comando do Capitão Liberato sucumbiram Elias Marques, João de Anízia, Pedrinho de Paripiranga e Manoel Ventura. De Nazaré, ou seja, dos nazarenos comandados por Manoel Neto, morreram no combate Hercílio de Souza Nogueira e seu irmão Adalgiso de Souza Nogueira, João Cavalcanti de Albuquerque e Antônio Benedito da Silva.

Da batalha que teve início por volta do meio dia e se estendeu até o por do sol, consta que ali estavam os cangaceiros se preparando para comer, para depois nas pias existentes, ou seja, nas águas empoçadas entre as pedras, abastecerem os seus cantis e seguirem sertão adentro nas suas tristes sinas de crimes de todos os tipos e eterna fuga. Naquele dia, pensando surpreender o bando, os policiais volantes no escaldante sol, se aproximaram pela caatinga da Fazenda Maranduba, mas terminaram cometendo os mesmos erros de combates anteriores. Contando como vitória certa os policiais subestimaram os adversários, principalmente por se encontrarem em supremacia numérica de homens que era de aproximadamente três vezes mais acabaram envolvidos por várias linhas de tiros engenhosamente armadas por Lampião e seus comandados.

Desse sangrento combate, em rápida análise, qualquer um pode imaginar, que a despeito das batalhas de Serra Grande e Serrote Preto, mais uma vez, os comandantes das Forças policiais presentes em Maranduba, acreditaram que a superioridade que detinham em homens e armas seria um fator de desequilíbrio no embate, dando provas de que a inteligência que deveria haver inerente aos verdadeiros líderes sempre ficou abaixo dos arroubos das suas valentias. A raiva, a fúria e a arrogância foram confrontadas com o sangue-frio, a paciência e a inteligência de Lampião.

Assim, cautelosamente Lampião, como grande estrategista de guerrilhas que era, postou seus homens entrincheirados em sete Umbuzeiros ali existentes, de modo que os soldados ao entrarem arrojadamente no campo de fogo, ficaram cercados, encurralados, ou seja, em fogo cruzado, feito baratas tontas, alvos fáceis dos cangaceiros.

Ressalta-se que nesta batalha, para a importância na história das lutas sociais do Nordeste, outro ponto há de ser ressaltado, ou seja, referente à participação efetiva dos aguerridos e temíveis nazarenos, os homens de Nazaré, uma Força policial pernambucana dedicada em tempo integral na caça a Lampião e seu bando, corajosos policiais lendários dos sertões nordestinos, famosos pela persistência de não desistirem nunca do seu objetivo, destemidos cabras-machos que andaram nos rastros dos cangaceiros por cerca de vinte anos. Meninos se tornaram valentes homens na caçada sem fim ao “Rei do Cangaço”.

Em recente visita ao cenário da batalha notei que pouco se conservou. A casa sede da Fazenda Maranduba toda ruiu, a vegetação típica da caatinga da época virou uma grande roça de palma para alimentar o gado, as pias secas, apenas três dos enigmáticos Umbuzeiros ainda persistem em viver, além da Cruz que marca o local do sepultamento dos policiais, testemunham contra o tempo, aquela que foi uma das mais significativas vitórias de Virgulino Lampião.

Fontes:
*CHANDLER, Billy Jaynes. Lampião: O Rei dos Cangaceiros. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
*CONRADO, Juarez. Lampião. Assaltos e morte em Sergipe. Aracaju: Editora J. Andrade, 2010.
*COSTA, Alcino Alves. Lampião em Sergipe. Aracaju: Editora Diário Oficial, 2011.
*COSTA, Alcino Alves. Lampião além da Versão. Mentiras e Mistérios de Angico. Aracaju: Sociedade Editorial de Sergipe, 1996.
*FERRAZ, Marilourdes. O Canto do Acauã. Recife: Gráfica Falangola, 1978.
*GÓIS, Joaquim. Lampião o último cangaceiro. Aracaju: SCAS, 1966.
*GUEIROS, Optato. “Lampeão” Memorias de um Oficial ex-comandante de Forças Volantes: Linográfica Editora. São Paulo, 1953.
*NETO, Hildebrando de Souza Nogueira. Recado dos Nazarenos. Artigo.
*SEVERO, Manoel. Maranduba... e a Caravana Cariri Cangaço. Artigo.
*SEVERO, Manoel. A Cruz dos Nazarenos. Artigo.
*SOUZA, Jovenildo Pinheiro de. Sertão Sangrento: Luta e Resistencia. A Batalha de Serra Grande/ A Batalha de Maranduba. (Tese de Mestrado em História pela Universidade Federal de Pernambuco.

Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, de 21 de dezembro de 2013.

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