terça-feira, 16 de junho de 2015

João Costa, o Mestre


(Crônica de Luciano Correia publicada na Folha da Praia por ocasião do falecimento do Professor João Costa, em 30/01/2011)*

João Costa, o Mestre.
Por Luciano Correia.

Foi-se embora desta, no domingo passado, o professor João Costa, do departamento de Letras da UFS. João era velho de guerra, desde os cursinhos e colégios de Aracaju até sua brilhante passagem pelo curso de Letras. Aliás, mirando bem, brilhante onde passou. João era um casca grossa, dos bons, daqueles que perdem o amigo, se preciso fosse, mas nunca deixava de dizer sua fala. Na juventude, fez teatro numa Aracaju culturalmente adolescente, tentando dialogar com o teatro moderno que vicejava nas matrizes do Rio e SP. Um homem culto, afetuoso e delicado. E bruto e indelicado, se precisasse.

Tive a sorte de conviver com João nos três anos que trabalhei na assessoria da Reitoria da UFS, numa sala com Gilvan Manoel, Rian Santos e os professores Gilvan Trustra e Murilo Navarro. João, teatral, era o próprio showman, todos os dias nos brindando com surpresas: ora um humor fino e cáustico, ora o mau humor puro, servido nas doses que o freguês quisesse comprar. Não havia uma só manhã que ele não chegasse à nossa assessoria/redação com uma grande história, um comentário inteligente,malandro, cheio de segundas, terceiras e múltiplas intenções. João Costa era, afinal, um grande leitor e conhecedor da melhor literatura mundial.Como ator, não poderia deixar de incorporar isso à sua vida, como se fosse mesmo um personagem.

Quando o encontrava pelas ruas da cidade ou em alguma livraria dos shoppings, me aproximava silencioso e pespegava um insulto: “Veiiiiinhooooo”. Ele logo abria um sorriso infinito e retomávamos, pela milésima vez, a história do folgado caixa da padaria perto da casa dele, que costumava recebê-lo com essa sem cerimônia. Só que ele contava isso em detalhes, com seu ar teatral, encenando e já amaldiçoando um caixa de padaria que, sem eira nem beira, se referia àquela celebridade acadêmica com o mais desprezível dos tratamentos: veinho. Ele, vaidoso que sempre foi, até poucos dias antes de morrer, quando o encontrei pela última vez, detestava o tratamento íntimo que, ademais, não era do feitio de um homem que, apesar de toda a cultura e sabedoria, era um assumido conservador e possivelmente dado às hierarquias.

João, assim, foi uma lição diária de mestre para todos aqueles da reitoria da UFS que conviveram com ele. No começo, quando ele se juntou à nossa equipe, eu, tomado de preconceitos contra a figura que eu já sabia conservadora, fiquei de pé atrás, disposto mesmo a não trocar com o Mestre mais que as palavras “bom dia” e “até logo”. Pois!! No segundo dia eu já era íntimo de suas adoráveis molecagens, trocando, com ele e Gilvan Manoel, velhas piadas de charada, comentários críticos de livros, filmes, da política, da vida, enfim.

Ontem, quando soube da sua morte, não tive nenhuma reação. Sabia que o câncer que o consumia há alguns meses fatalmente o levaria logo. Hoje, pensando nas histórias do João e da grandiosidade de sua alma, chorei de saudade. A partir de agora, João Costa será para mim esse belo rosário de histórias.

* Texto reproduzido do Facebook/Amaral Cavalcante

Foto reproduzida do blog jornaldesaodomingos
(Postada para ilustração por MTéSERGIPE).

Postagem originária da página do Facebook/GrupoMTéSERGIPE, de 14 de junho de 2015.

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