(Crônica de Luciano Correia publicada na Folha da Praia por
ocasião do falecimento do Professor João Costa, em 30/01/2011)*
João Costa, o Mestre.
Por Luciano Correia.
Foi-se embora desta, no domingo passado, o professor João
Costa, do departamento de Letras da UFS. João era velho de guerra, desde os
cursinhos e colégios de Aracaju até sua brilhante passagem pelo curso de
Letras. Aliás, mirando bem, brilhante onde passou. João era um casca grossa,
dos bons, daqueles que perdem o amigo, se preciso fosse, mas nunca deixava de
dizer sua fala. Na juventude, fez teatro numa Aracaju culturalmente
adolescente, tentando dialogar com o teatro moderno que vicejava nas matrizes
do Rio e SP. Um homem culto, afetuoso e delicado. E bruto e indelicado, se
precisasse.
Tive a sorte de conviver com João nos três anos que
trabalhei na assessoria da Reitoria da UFS, numa sala com Gilvan Manoel, Rian
Santos e os professores Gilvan Trustra e Murilo Navarro. João, teatral, era o
próprio showman, todos os dias nos brindando com surpresas: ora um humor fino e
cáustico, ora o mau humor puro, servido nas doses que o freguês quisesse
comprar. Não havia uma só manhã que ele não chegasse à nossa assessoria/redação
com uma grande história, um comentário inteligente,malandro, cheio de segundas,
terceiras e múltiplas intenções. João Costa era, afinal, um grande leitor e
conhecedor da melhor literatura mundial.Como ator, não poderia deixar de
incorporar isso à sua vida, como se fosse mesmo um personagem.
Quando o encontrava pelas ruas da cidade ou em alguma
livraria dos shoppings, me aproximava silencioso e pespegava um insulto:
“Veiiiiinhooooo”. Ele logo abria um sorriso infinito e retomávamos, pela
milésima vez, a história do folgado caixa da padaria perto da casa dele, que
costumava recebê-lo com essa sem cerimônia. Só que ele contava isso em
detalhes, com seu ar teatral, encenando e já amaldiçoando um caixa de padaria
que, sem eira nem beira, se referia àquela celebridade acadêmica com o mais
desprezível dos tratamentos: veinho. Ele, vaidoso que sempre foi, até poucos
dias antes de morrer, quando o encontrei pela última vez, detestava o
tratamento íntimo que, ademais, não era do feitio de um homem que, apesar de
toda a cultura e sabedoria, era um assumido conservador e possivelmente dado às
hierarquias.
João, assim, foi uma lição diária de mestre para todos
aqueles da reitoria da UFS que conviveram com ele. No começo, quando ele se
juntou à nossa equipe, eu, tomado de preconceitos contra a figura que eu já
sabia conservadora, fiquei de pé atrás, disposto mesmo a não trocar com o
Mestre mais que as palavras “bom dia” e “até logo”. Pois!! No segundo dia eu já
era íntimo de suas adoráveis molecagens, trocando, com ele e Gilvan Manoel,
velhas piadas de charada, comentários críticos de livros, filmes, da política,
da vida, enfim.
Ontem, quando soube da sua morte, não tive nenhuma reação.
Sabia que o câncer que o consumia há alguns meses fatalmente o levaria logo.
Hoje, pensando nas histórias do João e da grandiosidade de sua alma, chorei de
saudade. A partir de agora, João Costa será para mim esse belo rosário de
histórias.
* Texto reproduzido do Facebook/Amaral Cavalcante
Foto reproduzida do blog jornaldesaodomingos
(Postada para ilustração por MTéSERGIPE).
Postagem originária da página do Facebook/GrupoMTéSERGIPE, de 14 de junho de 2015.
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