Foto: Márcio Garcez
Publicado originalmente no site F5News, em 03/03/2013
“É difícil viver de teatro no Nordeste”, diz Jorge Lins.
Diretor teatral fala sobre paixão e desafios das artes
cênicas
Por Adriana Meneses
Criador e fundador do Grupo Raízes, o diretor teatral Jorge
Lins de Carvalho, às vésperas de completar 56 anos de idade, e 40 anos de
carreira artística, fala, nesta entrevista a F5 News, sobre a paixão pelas
artes cênicas e os desafios de lidar profissionalmente nesse segmento no
panorama cultural de Sergipe. Nascido em Aracaju, Jorge Lins é formado em
Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal de Sergipe.
F5 News: Quando surgiu a sua paixão pelo teatro?
Jorge Lins - Quando eu estudava no Colégio Atheneu
Sergipense, no início da década de 70, eu assisti a uma montagem sobre a vida
de Santos Dumont e despertei para esse universo mágico que é o Teatro.
Engraçado que quando criança nunca tinha ido ao teatro, sou de uma geração órfã
de espetáculos e projetos culturais aqui na cidade. Minha família sempre teve
uma ligação muito grande com as letras, com a leitura, mas Teatro eu nunca
tinha sonhado em fazer. Agora, é lógico que sempre tive uma tendência grande em
contar histórias, viver histórias... Quando menino, tinha 365 tampas de
garrafas e todas elas tinham nome e eu inventava histórias diariamente com
elas, brincando pelo chão. Mas Teatro mesmo, só aos 13, 14 anos...
F5 News:Você é formado em Ciências Jurídicas e Sociais,
porém nunca trabalhou na área. O teatro contribuiu para isso?
Jorge - Na verdade, quando eu comecei a estudar Direito na
UFS, não havia naquela época solução de sobrevivência vivendo do fazer cultural
em Aracaju. Há 36 anos, a opção para quem queria ser artista era ir para o sul
do País. Eu não queria sair da minha terra, aí na época me meti com jornalismo,
lecionava em escolas, Cursos de Pré-Vestibular e fazia teatro e música. Eu
sempre tive um envolvimento muito grande com a área da música. Não sei se o
Teatro contribuiu para que não seguisse a carreira jurídica. Na verdade, eu não
me considero assim um "homem do Teatro" embora, minha principal
linguagem seja realmente o teatro. Eu me acho mais um produtor cultural. Então,
se eu me perguntasse se a minha paixão pela cultura fez com que eu não seguisse
a carreira jurídica, eu diria que, assim que eu encontrei uma maneira de
sobreviver fazendo o que faço, não tinha como fazer mais nada.
F5 News: Ao longo dos seus 40 anos de carreira, quantos
espetáculos você já dirigiu ou participou? Teve algum que marcou especialmente
a sua trajetória artística?
Jorge – Como ator, acho que fiz mais de 40 espetáculos
diferentes e participei de mais de 20 shows. Como autor, eu tenho mais de 140
textos escritos. Agora que estou tentando resgatar todos os meus trabalhos e
criar um site só para isso. Tem uns 10 anos que não subo num palco, só dirijo e
produzo os espetáculos. Eu tenho a impressão que a peça que mais marcou a minha
trajetória e a que foi mais montada foi "Quem descobriu o Brasil?"
que já foi montada por vários grupos de vários estados.
F5 News: Como é trabalhar com o teatro em Sergipe? Existe
apoio do poder público?
Jorge - Trabalhar Cultura no Nordeste é muito complicado.
Não existe uma estrutura profissional por parte dos órgãos e instituições, que
estão acostumados a dialogar com grupos e propostas amadoras. Há uma carência
enorme de produtores e gestores de Cultura em Sergipe e em todo o Nordeste. Já
se ensaia algumas iniciativas por parte do Governo, nas três esferas (federal,
estadual e municipal), mas nada que possa ser lido como uma política cultural.
O nosso grupo trabalha quase que especificamente com o público, sem editais,
verbas de patrocínio e apoio estatal. As nossas iniciativas mantêm o nosso
trabalho, a nossa ação. Estreamos espetáculo atrás de espetáculo. Esse ano, já
foi "As mulheres de Hollanda" e agora "Quintal de sonhos".
Em abril, "Drummond, o poeta maior", "O menino do dedo
verde" e "A chegada de Lampião no inferno". E não paramos,
funcionamos como uma fábrica de ilusões.
F5 News: Que tipo de apoio poderia impulsionar a expansão do
teatro sergipano?
Jorge - Deveríamos ter projetos de circulação permanente de
espetáculos, adequar salas no interior do estado para que pudéssemos criar um
circuito pelos principais pólos das regiões, circular pelas escolas, levar as
escolas para o Teatro, as faculdades, fazer um trabalho gigantesco de formação
de platéias. Se um dia eu tivesse o poder nas mãos para decidir linhas e ações
dentro da área, a prioridade número um seria a formação de plateias. Formar
cidadãos conscientes e com envolvimento com a arte é fundamental para a
formatação de um novo Brasil, mais humano, justo e desenvolvido.
F5 News: Como o público sergipano se comporta diante das
produções teatrais dirigidas e apresentadas por artistas locais?
Jorge - Eu acho que mudou muito e isso é uma conquista de
várias gerações. Do pessoal que veio antes de mim - Amaral Cavalnati, Aglaé
Fontes, Bosco Seabra, Newton Lucas, Oto Cornélio, Vieira Neto, Walmir Sandes -,
ao pessoal da minha época - Tadeu Machado, Neu Fontes, Paulo Lobo, Luiz Eduardo
Oliva, Isaac Galvão, Lindolfo Amaral, Isabel Santos - e do pessoal que está aí
hoje na luta - Lindemberg Monteiro, Bruno Kelvernek, Raimundo Venâncio, Diane
Veloso, Flávio Porto, entre tantos. A luta de toda essa gente por tantos anos
foi criando uma plateia para a nossa produção. Hoje, já existe público para
espetáculos sergipanos. Eu me orgulho muito de ter um público caloroso e
gigantesco sempre nos meus espetáculos. Há algum tempo atrás, era impossível se
encher teatro com produção local, hoje encho constantemente. Acho que o
trabalho do Grupo Raízes é fundamental para esse público que se criou para
artistas da terra.
Texto e imagem reproduzidos do site: f5news.com.br
Postagem originária da página do Facebook/Grupo MTéSERGIPE, de 27 de setembro de 2014.
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