quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Manoel Cabral Machado.


Publicado originalmente no site Osmário Santos, em 05/02/2009.

Manoel Cabral Machado.
Por Osmário Santos.

Manoel Cabral Machado nasceu a 30 de outubro de 1916, em Rosário do Catete, Sergipe.
Quem nunca avistou Manoel Cabral Machado nos arredores da cultura sergipana, sem dúvida, não circula, pouco sabe e bem que parece alheio às coisas da terra.

Cabral Machado é um político com uma longa carreira, professor e advogado. É também um grande intelectual que não deixa o tempo passar sem registrar, com seus trabalhos literários, as coisas e a gente da nossa cidade.

De tradicional família sergipana, Cabral Machado passou sua infância no interior, solto, livre, brincando com os demais meninos, com todas as peraltices que tinha direito. “Meu pai não limitava meus amigos de infância e, nisso, brinquei à vontade e aproveitei bastante, até chegar o tempo de internato no colégio Salesiano”.

Cabral Machado era um péssimo jogador de futebol. Mesmo assim, fazia um esforço e participava das horas de recreação, embora não se sentisse realizado com a bola. Seu negócio era outro e, logo na primeira oportunidade, os padres e os seus companheiros de colégio puderam perceber o talento do jovem Cabral, quando deu os seus primeiros passos no campo literário, fazendo uma crônica no jornal que circulava no colégio com o nome de “A Tebaidinha”. O nome do jornal representava a lembrança do sítio dos salesianos que tinha o nome de Tebaida.

Depois passou a ser o orador da turma de alunos nas festas do colégio. Confessou que, no início, aceitou as idéias dos padres naquilo que ele tinha de falar, mas logo deu um basta e suas idéias ficaram livres. Do tempo do Salesiano, lembra que enfrentou o palco e interpretou inúmeros personagens, fazendo teatro, uma das boas coisas da sua época de internato.

Depois, chegou ao Atheneu, que foi pequeno para comportar o estudante Cabral Machado. Sempre com boas notas, não se contentava somente com o ambiente de sala de aula. Suas produções literárias, crônicas, poesias já eram publicadas na imprensa. Já despertava a política, até então, hibernada por muito tempo. Chegava a época do Cabral Machado, certeiro nas críticas e fiel às suas convicções.

Cabral Machado, no seu tempo de Atheneu, conviveu com um colega de grande valor. Seu nome: Lises Campos. Era uma revelação no cenário artístico sergipano. “Um jovem poeta modernista, muito inquieto, amigueiro, escrevia bem e era de Capela. Naquele tempo, em Aracaju, a febre tifo era uma coisa terrível e o Cabral nos disse que perdeu vários colegas por causa dela, inclusive o Lises”.

“Lises pegou a tifo e lutou muito, chegando a falecer. Então, a sua morte foi um trauma enorme. Nós levamos o corpo. No enterro, a estudantada toda acompanhou. Levamos até o campo santo e, lá no cemitério, eu fiz um discurso. Foi a primeira vez que eu falei em público, de improviso.

Antes, eu falava nas solenidades do Salesiano, mas sempre lendo. Lembro que foi um choro enorme, porque toquei a sensibilidade dos estudantes, mostrando quem era o Lises, a sua inteligência, o companheiro das nossas jornadas. Então, eu passei a ter destaque a partir daí”.

No ano de 1934, Cabral Machado tomou uma posição quanto ao seu envolvimento com a política estudantil. “Eu fui com Fernando Maia, irmão do médico Lauro Maia e Luciano Mesquita, sobrinho de Jacinto Figueiredo, assistir a uma sessão integralista. Fiquei entusiasmado e entrei no Partido Integralista Brasileiro. A mocidade daquele tempo estava assim dividida: ou era integralista ou era comunista. O Lises não era nem comunista nem integralista. Mas Joel era da linha comunista e terminou integralista.

O meu integralismo morreu na Bahia quando chegou a guerra. Foi pela tomada de posição do partido, pois toda a vida fui contra Mussoline. Lembro que, nesse tempo, Seixas Dória era integralista, e foi o meu chefe lá na Bahia. Ele fazia uma pilhéria quando dizia que o chefe era eu. Quando passei a estudar na Bahia, já encontrei o Seixas no integralismo. Mas a guerra acabou com o integralismo”.
Por não ter o curso complementar de Direito em Aracaju, Cabral foi passar uma temporada em Salvador. Fez vestibular e sua grande satisfação foi ter obtido o honroso segundo lugar. Formou-se e chegou a ter planos de trabalhar em Ribeirão Preto, em São Paulo. Essa idéia surgiu depois de participar de um congresso de Direito do Trabalho no ano de 1941, um ano antes de sua formatura. Pensou em morar em Itabuna, participando de um escritório de advocacia, junto com colegas de curso, mas terminou mesmo por aqui. Em 1943, seu pai faleceu, ficou muito
entristecido e, já formado, foi à luta.

Cabral Machado conta que a sua família tinha boas relações com o interventor do Estado de Sergipe, Maynard Gomes.

“Minha mãe falou com a mãe de Maynard. Eu fui criado, chamando a mãe de Maynard de vovó Iaiá, lá em Rosário. Então, ela fez uma carta para o filho, pedindo uma colocação para mim. Com a carta, eu me apresentei ao interventor Augusto Maynard Gomes. Daí, o genro dele, Zezé Garcez, convidou-me para ser secretário do prefeito José Garcez Vieira. Eu comecei minha vida como secretário do prefeito. Antes, eu tinha sido nomeado promotor público substituto da cidade de Neópolis.

Todos os promotores substitutos em Sergipe eram leigos. Eu, cheguei formado, bacharel, com o título, dizendo que eu passei com distinção no segundo lugar, e não consegui tomar posse no cargo, mesmo sendo nomeado, pois me exigiram inscrição na Ordem dos Advogados. Na OAB, eu só podia me inscrever com a carta e minha carta de bacharel tinha sido encaminhada para o Ministério da Educação para o devido registro. Mesmo assim, não consegui o registro provisório e não pude tomar posse do cargo”.

“Em minha vida, isso foi bom, pois iria para Neópolis e quem sabe. Aqui, fiquei como secretário do prefeito e, em pouco tempo, estava eu falando por aí, fazendo discurso. Nesse cargo, lembro-me que o primeiro discurso foi na inauguração de uma rua com o nome de general Augusto Medeiros Chaves. Coincidência das coisas: esse general foi o herói sergipano da Guerra do Paraguai. Ele era amigo de meu pai e, uma certa feita, deu-me de presente um brinquedo do qual eu não me esqueço nunca – um navio de corda”.

Na ocasião em que ocupava o cargo de secretário da prefeitura, Cabral Machado foi convidado por Leite Neto, que era o secretário geral do governo Maynard Gomes, para ser o diretor do departamento de serviços públicos, que hoje corresponde à Secretaria de Administração. Na política sergipana, surgiu o Partido Social Democrático. Com Leite Neto, Cabral foi aos palanques em plena campanha do PSD, contribuindo com a sua inflamada oratória nos comícios. Em 1945, caiu o poder de Maynard.

“Veio o golpe, Getúlio caiu. O Poder Judiciário assumiu o governo de Sergipe, com Hunaldo Cardoso. O PSD caiu e nós fomos para a planície e ainda fomos para a batalha a fim de eleger o General Dutra. Em 1946, nós elegemos José Leite para o governo do Estado e eu fui candidato a deputado estadual, perdendo a eleição por cinco a dez votos”.

Não sendo eleito deputado e com a vitória de José Leite, foi convidado a assumir o cargo de secretário da Fazenda, fazendo uma grande revolução. “O Estado não tinha crédito no comércio.
Devia bilhões, mais que o orçamento. Eu assumi a responsabilidade de colocar em ordem as finanças públicas, sendo o maior trabalho que tive. José Leite chegava preocupado para construir o Colégio Estadual e me perguntava se eu conseguiria o dinheiro. Eu respondia que ele podia fazer o Colégio e eu arranjaria o dinheiro”.

Não foi brincadeira para Cabral Machado enfrentar a estrutura fazendária do governo naquela época. Apertou o cinto demais para conseguir aumentar a arrecadação do Estado.

“Eu mandei botar posto fiscal onde meus amigos de partido passavam com contrabando. A pressão foi grande. José Leite chegou a falar que iria fazer falta. Quando eu senti que a barra estava pesada demais, cheguei à conclusão que estava na hora de me afastar do cargo. Eu fui fazer uma revisão no imposto territorial que, naquele tempo, pertencia ao Estado. Mandei fazer uma revisão do cadastro do valor das propriedades. Todo o interior se revoltou contra mim por essa reavaliação. Deixei o cargo de secretário da Fazenda e passei a exercer o cargo de secretário de Governo”.

Em outra campanha política, Cabral Machado disputou, novamente, a cadeira de deputado na Assembléia Legislativa e conseguiu eleger-se. Na época, era governador do Estado Arnaldo Garcez e Cabral passou a ser o líder do governo no Legislativo estadual. Passou para uma segunda legislatura com um episódio histórico. “No dia da posse de Leandro Maciel, fui vaiado, por ter dito que a eleição tinha sido fraudulenta na Assembléia Legislativa. Foi uma vaia”.

Passou para uma terceira legislatura, já no governo Luís Garcia. Depois de um bom período como deputado estadual, chegou a pensar no seu futuro. “Eu não tinha nada no Estado. Mais adiante eu não seria eleito deputado. Ficaria sem nada, só com o meu empreguinho vagabundo, que não dava para viver. Eu, casado, com cinco filhos. Pensando nisso, fui fazer o concurso de Consultor Jurídico, Procurador do Instituto do Açúcar e do Álcool. Passei em primeiro lugar, sendo nomeado. Fiz a campanha de Seixas Dória, já sendo procurador, porém sem me candidatar mais a deputado. Veio a queda de Seixas Dória e o Celso de Carvalho me convidou para ser secretário de Educação. Em seguida, saí vice-governador do Estado no governo de Celso. Depois, como vice de Lourival”.

Durante o governo de Lourival Baptista, foi criado o Tribunal de Contas, e o governador ofereceu ao seu vice o cargo de conselheiro. Eu fiquei sem aceitar, não queria. Meus amigos insistiam para que eu aceitasse. Meus amigos políticos pediam para que eu não aceitasse. Como estava meio chateado com o meu partido, o Social Democrático, pelo fato de Lourival ter feito uma constituição, colocando uma emenda onde o vice-governador só assumiria o governo depois de dez dias, eu aceitei. Antigamente, o governador só saía do Estado, passando o cargo para o vice.

Este cargo era importante. Então, eu queria que o meu partido votasse contra essa emenda. Mas, o partido, com um medo danado do governo, votou com o governo. Daí, aceitei o cargo no Tribunal de Contas. Fui eleito o seu primeiro presidente e, durante quinze para dezesseis anos, fui eleito presidente pela terceira vez, aposentando-me”.

Deixando o Tribunal de Contas, Cabral Machado recebeu o convite para o cargo de consultor jurídico do Tribunal da Justiça. “Quando estava ainda como consultor jurídico, o governador Valadares me convidou para ser o procurador geral do Estado e, até hoje, eu estou aí. Esta, em síntese, é a minha vida política.

Em minha vida política, sempre fui um idealista. Acredito no político reto, que sirva para o bem do povo. Acho que só há duas atividades importantíssimas no homem: primeira, a atividade religiosa. Segunda, a atividade política, atividade que o homem vai servir ao seu próximo, o seu irmão. Sempre tive vocação para a vida política e sempre dou de mim o que posso dar de trabalho, de dedicação, de esforço de seriedade. Sou um homem que faz tudo dentro da minha consciência para dormir feliz com a minha família”.

Em 1944, casou com Maria de Lourdes no mês de dezembro.

Texto reproduzidos do site: usuarioweb.infonet.com.br/~osmario
Foto reproduzida do blog iconografiaamado.blogspot.com.br

Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, de 17 de setembro de 2014.

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