Lampião e o Fogo da Maranduba.
Por Archimedes Marques.
O ferrenho combate denominado “Fogo da Maranduba”, ocorreu
no dia 9 de janeiro de 1932, na Fazenda Maranduba, na época município de Porto
da Folha, hoje de Poço Redondo, aqui no nosso querido Estado de Sergipe, cujo
intenso e sangrento tiroteio é considerado um dos três maiores enfrentamentos
entre cangaceiros e policiais volantes na história do cangaço. Dizem os
pesquisadores e historiadores que esse combate só é comparado à sangrenta
batalha de Serra Grande, em Pernambuco e ao não menos cruento embate de Serrote
Preto, nas Alagoas. As baixas em Maranduba foram muitas e das polícias volantes
comandadas pelos valentes e audazes combatentes perseguidores, Tenente Manuel
Neto e Capitão Liberato, contabilizaram-se oito mortos e diversos feridos,
enquanto que, por parte dos perseguidos cangaceiros somente três mortos
(Sabonete, Catingueira e Quina-Quina) e um ferido (Bananeira).
Sem sombra de dúvida, os três combates acima citados se
notabilizaram por seus aspectos grandiosos e pela engenhosidade de um líder
inconteste, o famigerado estrategista Lampião, o verdadeiro “General das
Caatingas”. O famoso bandoleiro à frente de seus cangaceiros, sempre em
inferioridade numérica viria a alcançar essas três vitórias fragorosas,
imprimindo vergonha às hostes governamentais, provando assim que as Forças
Policiais Volantes agiam mais com a emoção transpondo a própria razão, que na
verdade não passavam de atrapalhados soldados de guerra e apesar das diversas
batalhas desenvolvidas com os cangaceiros em aproximadamente vinte anos de
atuação, nunca conseguiram atingir os seus objetivos, a não ser em 28 de julho
de 1938, mesmo assim por conta da traição do coiteiro Pedro de Cândido –
torturado ou não – que levou o então Tenente João Bezerra da Força policial
alagoana até a grota do Angico, em Sergipe, massacrando o bando de surpresa em
uma madrugada e pondo fim à carreira criminosa do maior dos cangaceiros da
nossa história.
Adentrando na questão dos personagens policiais militares
que participaram do “Fogo da Maranduba”, bem verdade é que o Tenente Zé Rufino
da Força policial baiana, o “grande caçador de cangaceiros”, se fez presente
nessa refrega, mas não em comando e sim comandado pelo Capitão do Exército
Brasileiro, Liberato de Carvalho. Das baixas fatais da Força pública, quatro
pertenciam à tropa do Capitão Liberato de Carvalho, da Bahia, e quatro da tropa
do bravo nazareno Tenente Manoel Neto, de Pernambuco. Do pelotão sob o comando
do Capitão Liberato sucumbiram Elias Marques, João de Anízia, Pedrinho de
Paripiranga e Manoel Ventura. De Nazaré, ou seja, dos nazarenos comandados por
Manoel Neto, morreram no combate Hercílio de Souza Nogueira e seu irmão
Adalgiso de Souza Nogueira, João Cavalcanti de Albuquerque e Antônio Benedito
da Silva.
Da batalha que teve início por volta do meio dia e se
estendeu até o por do sol, consta que ali estavam os cangaceiros se preparando
para comer, para depois nas pias existentes, ou seja, nas águas empoçadas entre
as pedras, abastecerem os seus cantis e seguirem sertão adentro nas suas
tristes sinas de crimes de todos os tipos e eterna fuga. Naquele dia, pensando
surpreender o bando, os policiais volantes no escaldante sol, se aproximaram
pela caatinga da Fazenda Maranduba, mas terminaram cometendo os mesmos erros de
combates anteriores. Contando como vitória certa os policiais subestimaram os
adversários, principalmente por se encontrarem em supremacia numérica de homens
que era de aproximadamente três vezes mais acabaram envolvidos por várias
linhas de tiros engenhosamente armadas por Lampião e seus comandados.
Desse sangrento combate, em rápida análise, qualquer um pode
imaginar, que a despeito das batalhas de Serra Grande e Serrote Preto, mais uma
vez, os comandantes das Forças policiais presentes em Maranduba, acreditaram
que a superioridade que detinham em homens e armas seria um fator de
desequilíbrio no embate, dando provas de que a inteligência que deveria haver
inerente aos verdadeiros líderes sempre ficou abaixo dos arroubos das suas valentias.
A raiva, a fúria e a arrogância foram confrontadas com o sangue-frio, a
paciência e a inteligência de Lampião.
Assim, cautelosamente Lampião, como grande estrategista de
guerrilhas que era, postou seus homens entrincheirados em sete Umbuzeiros ali
existentes, de modo que os soldados ao entrarem arrojadamente no campo de fogo,
ficaram cercados, encurralados, ou seja, em fogo cruzado, feito baratas tontas,
alvos fáceis dos cangaceiros.
Ressalta-se que nesta batalha, para a importância na
história das lutas sociais do Nordeste, outro ponto há de ser ressaltado, ou
seja, referente à participação efetiva dos aguerridos e temíveis nazarenos, os
homens de Nazaré, uma Força policial pernambucana dedicada em tempo integral na
caça a Lampião e seu bando, corajosos policiais lendários dos sertões
nordestinos, famosos pela persistência de não desistirem nunca do seu objetivo,
destemidos cabras-machos que andaram nos rastros dos cangaceiros por cerca de
vinte anos. Meninos se tornaram valentes homens na caçada sem fim ao “Rei do
Cangaço”.
Em recente visita ao cenário da batalha notei que pouco se
conservou. A casa sede da Fazenda Maranduba toda ruiu, a vegetação típica da
caatinga da época virou uma grande roça de palma para alimentar o gado, as pias
secas, apenas três dos enigmáticos Umbuzeiros ainda persistem em viver, além da
Cruz que marca o local do sepultamento dos policiais, testemunham contra o
tempo, aquela que foi uma das mais significativas vitórias de Virgulino
Lampião.
Fontes:
*CHANDLER, Billy Jaynes. Lampião: O Rei dos Cangaceiros. Rio
de Janeiro: Paz e Terra, 1981.
*CONRADO, Juarez. Lampião. Assaltos e morte em Sergipe.
Aracaju: Editora J. Andrade, 2010.
*COSTA, Alcino Alves. Lampião em Sergipe. Aracaju: Editora
Diário Oficial, 2011.
*COSTA, Alcino Alves. Lampião além da Versão. Mentiras e
Mistérios de Angico. Aracaju: Sociedade Editorial de Sergipe, 1996.
*FERRAZ, Marilourdes. O Canto do Acauã. Recife: Gráfica
Falangola, 1978.
*GÓIS, Joaquim. Lampião o último cangaceiro. Aracaju: SCAS,
1966.
*GUEIROS, Optato. “Lampeão” Memorias de um Oficial
ex-comandante de Forças Volantes: Linográfica Editora. São Paulo, 1953.
*NETO, Hildebrando de Souza Nogueira. Recado dos Nazarenos.
Artigo.
*SEVERO, Manoel. Maranduba... e a Caravana Cariri Cangaço.
Artigo.
*SEVERO, Manoel. A Cruz dos Nazarenos. Artigo.
*SOUZA, Jovenildo Pinheiro de. Sertão Sangrento: Luta e
Resistencia. A Batalha de Serra Grande/ A Batalha de Maranduba. (Tese de
Mestrado em História pela Universidade Federal de Pernambuco.
Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, de 21 de dezembro de 2013.
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