Oviêdo Teixeira (foto) falando a seus Companheiros do RotarY Club Aracaju em 14/04/1999.
Infonet - Blog Odilon Cabral - 08/04/2010.
Nos 100 anos do Bom Sujeito.
Por Odilon Cabral Machado.
Seria Rosebud desprovido de importância abrangente ou só
existem valores individuais e específicos que no coletivo apenas servem como
lenha queimada ao léu?
Amanhã, 9 de abril, a família de Oviêdo Teixeira estará
comemorando os cem anos do seu nascimento com a celebração de uma Missa em sua
memória.
Oviêdo Teixeira, falecido em 2001, deixou uma lembrança que
supera os limites do agasalho familiar estendendo-se por toda a sociedade
sergipana e além fronteiras, pelo seu exemplo como profissional, empresário e
cidadão.
Nada melhor, portanto, que reverenciar tudo isso na data que
seria do seu aniversário com uma prece de alegria e agradecimento por sua vida.
Neste contexto de homenagem, ouso transcrever um artigo que
publiquei quando ainda queimavam as candelas das suas exéquias. É uma nova
oportunidade de relembrar o calor e o enternecimento daquela câmara ardente em
que seu féretro recebia os encômios justos e verdadeiros.
Segue o texto:
O Rosebud do Sujeito
Os aficionados e estudiosos da arte cinematográfica colocam
Cidadão Kane como um dos melhores filmes de todos os tempos.
Escrito, estrelado e dirigido por Orson Welles, o filme fala
da vida de um célebre jornalista, digo, um grande empresário, dono de enorme
cadeia de jornais, como o foram Randolph Hearst nos Estados Unidos e Assis
Chateaubriand aqui no Brasil.
Se o Cidadão Kane foi concebido em cima da vida de Hearst,
como muita gente o diz, o mote do filme se concentra na palavra Rosebud,
pronunciada por Kane em seu último suspiro de vida. Quem é Rosebud? O que é
Rosebud? Por que um grande homem como Kane, tão vitorioso, inteligente e
poderoso pensaria em Rosebud no último suspiro de vida?
Esta reflexão surge sempre nos circunstantes que acompanham
os últimos momentos de um moribundo qualquer.
Não creio ter sido diferente com Oviêdo Teixeira, o grande
empresário sergipano, o bom amigo de todos, o nosso tão querido e bom Sujeito
que nos deixou nestes vindos de julho.
Como todo homem, Oviêdo deixa o seu legado de realizações e
saudades. Teria ele tido um Rosebud? Claro. Todos o temos.
Conheci Seu Oviêdo desde que me entendo como gente, afinal
nasci na Rua de Pacatuba, a poucos metros da sua residência, e durante toda
minha infância fui seu vizinho, sempre testemunhando o zelo com que ele e Dona
Alda criavam seus filhos.
Lembro da Casa Teixeira e de seu proprietário atencioso,
sempre um grande balconista, o melhor vendedor de tecidos da cidade.
Vejo também sua passagem na política partidária,
acompanhando o filho José Carlos no MDB. Num momento em que tinham tudo a
perder, os Teixeira assumiam em Sergipe a liderança oposicionista ao regime
revolucionário, dando palanques e microfones às esquerdas esfaceladas.
Desfraldava-se ampla bandeira na qual muitos se abrigariam e lograriam sucesso.
Nunca tantos deveram a tão poucos. Para si mesmo, Oviêdo só conseguiria um
mandato de Deputado Estadual. Os amigos que lhe eram tantos, talvez porque não
o quisessem distante, ou porque rareiam mesmo nos tempos amargosos, não lhe
concederiam o Senado da República.
Mas o bom Sujeito não nascera para a suja e desqualificada
política partidária. Ali com certeza não estava o seu Rosebud. Não valia a pena
o sacrifício de talento e patrimônio numa agremiação política ou na busca de
fugazes mandatos eletivos. Melhor seria abandonar as siglas e facções, sempre mutiladoras
de sonhos e de conceitos. Tornar-se universal e estender-se em todas as
dimensões. Ser ator em todos os cenários, desempenhando o seu verdadeiro papel
de Homem Político, no sentido aristotélico de promoção do bem comum de sua
Polis. Assim, torna-se presença marcante em todos os segmentos da sociedade,
manifestando sua opinião construtiva, sem a arrefecer diante dos pessimistas e
descrentes, repelindo com o seu exemplo de vida os pregadores de misérias que
ruminantemente vão e voltam nas vagas de cada plano econômico.
Oviêdo Teixeira falando a seus Companheiros do RotarY Club
Aracaju em 14/04/1999.
Quantas vezes nas nossas reuniões almoço do Rotary Clube de
Aracaju, e agora sou seu Companheiro Rotariano, vimos Oviêdo transformar
preocupações e desencantos em esperança, estímulo e motivação para enfrentar
obstáculos? Sua palavra extinguia qualquer temor. Suas crenças não se curvavam
a dúvidas e frustrações. Pregava o futuro afirmando a força e o vigor
transformador do trabalho. Era realmente um apaixonado pela atividade
mercantil. Nunca perdia a oportunidade de afirmar sua fé no comércio como força
dinâmica do progresso material e social. Nunca se eximia de bem servir, afinal
servir era o seu lema de vida.
Oviêdo foi o Rotariano por excelência. O Rotariano 100%,
isto é, aquele que nunca faltara a uma das reuniões almoço, todas as
quartas-feiras, chovesse ou fizesse sol, com saúde ou sem ela, por mais de
cinco décadas, inclusive carregando moléstia inexorável nos últimos 15 anos.
Seria o Rotary o seu Rosebud?
Quando das comemorações de seus 90 anos de vida quis que o
nosso Clube lhe conferisse a nossa maior comenda anual. Fiz por escrito extensa
e abalizada exposição de motivos, tudo dentro do prazo e do figurino do Clube,
afinal o ideal rotário de servir confundia-se com a vida do velho Companheiro.
O Conselho Diretor pensou diferente,... e o Rotary saiu perdendo.
Quem ganhou foi a nossa esquecida Universidade Federal de
Sergipe. Num gesto de grandeza, o saber e a cultura curvaram-se em reconhecimento
do trabalho e da experiência, louvando este Self Made Man. Das mãos do
Magnífico Reitor José Fernandes de Lima, o Bom Sujeito recebe comenda de mérito
universitário. Era o reconhecimento do valor de um homem de poucas letras que
se doutorara nas estradas da vida, exemplificando-se para muitos, fazendo-se
professor de gerações.
Não sei qual foi o Rosebud de Oviêdo, muito menos se chegou
a assistir Welles e o Cidadão Kane. Dos seus 90 anos ficará a mensagem que
transcrevo da Coluna de Osmário por Yara Belchior: “É bom dizer palavras de
estímulo e consideração uns aos outros, que a consideração é uma beleza. Todo
mundo fica satisfeito, principalmente velho e criança. Menos eu, que não me
engano com as coisas da vida”.
Assim, a vida não é esfinge e Rosebud não é incógnita.
Na fita, Rosebud é apenas uma palavra inscrita num velho
móvel, um trenó talvez, um traste inútil do espólio do Cidadão Kane,
colecionador de suvenir, que é queimado no final do filme.
Seria Rosebud desprovido de importância abrangente ou só
existem valores individuais e específicos que no coletivo apenas servem como
lenha queimada ao léu?
Se Rosebud é algo importante para uns e desprezível para
outros, desconfio que o Rosebud de Oviêdo foi o Rotary Clube de Aracaju. O
Rotary era muito importante para o velho Sujeito. Para outros, o Rotary
assemelha-se ao trenó Rosebud que queima no inquietante final do filme de
Welles.
No filme, Kane morre balbuciando Rosebud e todo enredo se
inicia. Na vida como na arte, sentindo as forças e a inteligência se esvaírem,
Oviêdo, rebelando-se contra os médicos, exige-lhes a imediata alta hospitalar,
dirigindo-se ao Rotary Clube de Aracaju para despedir-se de seus Companheiros.
Ali faria seu último discurso reafirmando suas crenças como homem portador de
esperanças, retirando-se depois para o seu leito de morte, para recebê-la como
mais uma dádiva da vida, afinal agora só queria reencontrar a sua Alda querida.
No seu sepultamento Aracaju vê apoteose pouco vista. Toda sociedade sergipana
se representa no enterro deste sergipano exemplar.
Após as homenagens lojistas e políticas, o Companheiro
Carlos Magalhães discursou despedindo-se em nome dos Rotarianos.
Como a multidão no cemitério era muito grande e a potente
voz de Magalhães não conseguia alcançar a todos, sabia-se apenas que alguém
falava pelo Rotary.
E a palavra Rotary parecia soar desconhecida e questionadora
como o Rosebud do cidadão Kane.
Naquela tarde o Rotary se apequenava, pois perdíamos um grande
Companheiro.
Como Rosebud é apenas um item do espólio de um grande homem,
do sentimento de perda e da saudade, consolemos a nossa tristeza repetindo a
mensagem daqueles que lhe foram mais próximos, os funcionários da Cimavel: “Na
estrada da vida esse Sujeito deixou muita bagagem”.
Gazeta de Sergipe, 7 de julho de 2001.
Foto e texto reproduzidos do site:
infonet.com.br/odilonmachado
Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 26 de abril de 2014.
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