Foto: Alejandro Zambrana
LAMPIÃO EM SERGIPE - 1
Por Luiz Antônio Barreto
Virgulino Ferreira da Silva, o Capitão Lampião como
assinava, morreu em Sergipe em 28 de julho de 1938. Atacado de surpresa por
força alagoana na Gruta do Angico, município de Poço Redondo no sertão...
Virgulino Ferreira da Silva, o Capitão Lampião como
assinava, morreu em Sergipe em 28 de julho de 1938. Atacado de surpresa por
força alagoana na Gruta do Angico, município de Poço Redondo no sertão
“sanfranciscano”, seu corpo, depois de decepada e levada a cabeça como troféu
de guerra, ficou exposto naquela região sergipana com o da sua companheira
Maria de Déa, ou Santinha, a Maria Bonita, e cangaceiros- uma dezena deles -
que participavam da reunião dos grupos naqueles dias de desconfiança. A cena da
morte de Lampião aconteceu quase dez anos depois das suas primeiras e famosas
incursões em Sergipe, em 1929, que representam um capítulo especial na vida do
cangaceiro e das quais se ocuparam, mais recentemente, Oleone Coelho Fontes da
Bahia, Antonio Amaury de São Paulo e Vera Ferreira, filha de Expedita e neta de
Virgulino e de Maria Bonita, de Sergipe. Carira, no oeste sergipano, vizinho ao
sertão baiano, parece ter sido o primeiro ponto da presença de Lampião com seu
grupo, em Sergipe em 1º de março de 1829 e marcaria um roteiro de visitas por
vários municípios do Estado, no vai e vem cíclico que ainda não foi devidamente
mapeado e nem registrado textualmente como deveria. A visita de Lampião a
Carira foi rápida, precedida de uma comunicação ao Delegado e indicava uma
viagem maior chegando até Frei Paulo. Na madrugada do dia 2 de março, depois de
conversar com o povo, dar sua versão de como entrou no cangaço e zombar da
Polícia, que chegava nos lugares sempre depois de sua saída, Lampião acompanho
de 6 homens, voltou para o interior baiano passando pelas terras do Coronel
João Sá, chegando já com 10 homens na Fazenda Capitão, em Jeremoabo. A visita
seguinte, a Poço Redondo em 19 de abril de 1929, permitiu um encontro de
Virgulino Ferreira da Silva com o padre Artur Passos, Pároco de Porto da Folha
então celebrando missa naquele povoado como fazia periodicamente. Um diálogo
duro entre o cangaceiro e o padre, marcou a presença do grupo em frente da
Igreja quando Lampião pediu permissão para assistir missa com seus “rapazes”.
Para o padre celebrante, virando-se do altar para o povo viu além do sol fora
da capela, cabeças descobertas, sem armas, de braços cruzados, atentos,
respeitosos, olhos pregados nele (o Capitão), “Esses homens cujas vidas têm
sido um amontoado de crimes, delitos e abominações, mas homens todavia”.
Lampião tomou lápis e papel e fez uma lista dos seus homens informando nome,
apelido, idade e entregando-a ao padre com observações de defesa. Tinha Lampião
29 anos e estava acompanhado do seu irmão Ezequiel, o Ponto Fino, de 20 anos,
Virgínio Fortunato, o Moderno, com 28, Luiz Pedro da Silva, o Esperança, com
24, Cristino Gomes da Silva, o Corisco, com 23, Mariano Gomes da Silva, o
Pernambuco, com 25, Hortêncio Gomes da Silva, o Arvoredo, com 24, José Alves
dos Santos, o Fortaleza, sem indicação de idade, José Vieira da Silva, o
Lavareda, com 27, e Antonio Alves de Souza, o Volta Seca, com 18. Diante de
Virgulino Ferreira da Silva, o padre Artur Passos diz: “Alto, acaboclado,
robusto, andar firme e compassado, cabeça um tanto inclinada, o olho direito
inutilizado, com uma grande mancha branca, olhos brancos de aro de ouro, ou
metal dourado, um sinal preto na face direita. Na cabeça, grande, alto, vistoso
chapéu de couro, ainda novo, bem trabalhado, a imitar os antigos chapéus de
dois bicos, com as pontas para os lados, tendo as largas abas da frente e de
detrás erguidas e enfeitadas. Uma estreita tira de couro, ornada, o prende a
testa, uma outra à nuca, e uma terceira, o barbicacho, aos queixos. Este chapéu
fica, assim, bem seguro e apesar da altura não deve cair com facilidade.
Cabelos estirados, cortados à Nazarena, inteiramente bem barbeado. Blusa e
calças - perneiras de caqui. Aos pulsos – guarda – pulsos – de couro, de uns
quatro dedos de largura. Anéis em todos os dedos, teria na ocasião uns 5 ou 6
na mão direita e uns 6 ou 8 na mão esquerda.” Padre Artur Passos dá em seu
testemunho dos jornais, longa descrição da figura quase cavalheiresca do
cangaceiro, já integrada ao imaginário do povo brasileiro, especialmente nos
estados do Nordeste, onde era tido como governador” e como “interventor” do
sertão. O vigário de Porto da Folha continua construindo a imagem que fez de
Lampião: “Duas grandes cartucheiras de um lado e duas iguais do outro,
cruzam-se sobre o peito. A cintura, à quisa de cinturão, uma larga cartucheira
com dois ou três ordens de cartuchos. Tudo bem enfeitado de ilhoses e placas de
metal. Na mão, inseparavelmente, a arma terrível que tantas mortes já vomitou,
no rápido crepitar, no lampejar contínuo do qual, segundo consta, se origina o
seu nome de guerra. Esta arma não é rifle. É sim um mosquetão de cavalaria, ou
coisa semelhante, arma de cinco tiros que tem o ponto curvo. A frente, passando
entre as cartucheiras, o já conhecido punhal, de uns três palmos, cabo e bainha
de metal branco, arma forte, bonita, mau grado a aplicação que tem, de ótima
têmpera. Ao lado e às costas, pendentes de fortes bandoleiras, as sólidas
mochilas, bem recheadas de balas, formando uma larga e saliente roda, de grande
peso. Tudo isto liga-se ao corpo de modo tal, que forma uma couraça fixa, sem
lhe prejudicar os movimentos rápidos. Ao voltar-se para qualquer parte e em
qualquer posição, nada desse arsenal se desloca. Usa uma espécie de sapatos de
grossas solas e bem feitos. Traz esporas e rebenque e, ao montar, calça umas
luvas de pano marrom que cobrem apenas as costas das mãos. Anda sempre bem
barbeado. Em tudo guarda serenidade e presença de espírito. Este o homem.”
Descrevendo todo o bando, padre Artur Passos diz: “Estes dez homens, moços,
fortes, robustos, musculosos, formam um verdadeiro esquadrão sui generis,
assim, mais ou menos, igual e formidavelmente uniformizados. Diversos deles,
nomeadamente o Moderno, trazem, além dos guarda – pulsos de couro, pulseira nos
pulsos e pendentes dos dois bicos quue formam as abas dos grandes, altos e
vistosos chapéus. Cabelos bons, cortados à Nazarena, barbeados todos. Trazem
muitos anéis em todos os dedos, mas nem os anéis e nem as pulseiras são de
grande valor. Alguns trazem cobertas, ou cobertores, bem bordados, sob as
cartucheiras, ornadas, bem como as correias das armas, de ilhoses brancos e
rodelas de metal. Tal a sua disciplina, que formam um tanto compacto e
homogêneo. Alguns são calados e reservados. Não mostram, porém, face
carrancuda, nem os vi com maus modos. Não têm, inclusive Lampeão, cara
repelente, como imaginamos nos bandidos em geral, devendo frizar, porém, o
olhar especial de um deles, o fedelho de 16 a 18 anos, que os acompanha. Estão
bem armados, todos, trazendo alguns 2 ou 3 revólveres e, ao que parece, bem
municiados. Apenas uns 3 ou 4 estão armados a rifles, os demais, como Lampeão,
trazem mosquetão de cavalaria. Observei bem que são destemidos e valentes.”
(continua).
Trecho do ensaio: "O Encontro de Lampeão com o
Padre"
Do livro: O Incenso e o Enxofre.
Fonte: Pesquise - Pesquisa de Sergipe / InfoNet.
Texto reproduzido do site: infonet.com.br/luisantoniobarreto
Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, 15 de Dezembro/2012.
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