Publicado em empautaufs, em 25/11/2009.
Para Lilian, imaginação é a palavra de ordem.
Por Morgana Brota/EmpautaUFS
Seus livros e roteiros atraem jovens e adultos, mas são
especialmente as crianças que mais se encantam com os seus trabalhos. São
roupas que falam, pratos da mesa que conversam e tempos verbais que ganham
vida. Dessa forma, Lilian como professora, roteirista e escritora consegue
transmitir para os seus leitores e telespectadores sua paixão pela Língua
Portuguesa.
Natural de Aracaju-SE, Lilian Rocha é pedagoga, radialista e
autora de vários projetos educativos, peças teatrais, roteiros para a TV e a
quarta dos seis filhos de Maria Noemi Gomes e do escritor Petrônio Gomes, de
quem herdou a paixão por escrever.
Teve sua estréia na literatura em 2004 com o livro
infanto-juvenil “Deu a louca no meu Guarda-roupa”, obra que lhe rendeu o prêmio
Banese de Literatura e que em 2007 tomou vida nos palcos, sendo adaptada ao
teatro. Desde então ela não parou mais, em 2006 publicou “O bilhete”, livro que
conta suas experiências em sala de aula, em 2007 publicou “O chá das oito”, seu
segundo livro infanto-juvenil que em 2007 também ganhou uma versão para teatro
e em 2008 lançou o seu primeiro livro da coleção Língua Solta, o “Rasgando o
Verbo”.
Mãe de cinco filhos, Lilian Rocha, 51 anos, esbanja simpatia
e bom humor. Trabalha numa sala decorada com incontáveis lembranças dadas por
pessoas que já foram seus alunos ou que simplesmente admiram seus trabalhos.
EmpautaUFS: Você sempre quis escrever um livro?
Lilian Rocha: Eu sempre gostei de escrever, mas nunca pensei
em escrever um livro.
EmpautaUFS: E como surgiu a paixão por escrever?
Lilian Rocha: Na minha adolescência eu fui passar umas
férias em Salvador. Eu tenho uma prima que mora lá e ela era cheia de amigos.
Então ela me apresentou uma grande quantidade de gente. Eu passei um mês e meio
lá e foi uma maravilha, mudou minha cabeça completamente. Eu já escrevia muito
pra ela, cartas de vinte, trinta, quarenta páginas. Mas eram cartas, uma coisa
muito intima, era como se fosse um diário. Naquele tempo não tinha e-mail, o
telefone era caro então pra conversar tinha que ser por carta mesmo. Quando eu
voltei de Salvador eu comecei a escrever pra todo mundo, porque todo mundo via
a nossa correspondência e queria se corresponder também. Daí eu tinha que
responder a essa montanha de gente e praticamente todo dia eu estava escrevendo
carta. Eu tinha uma estante com tudo catalogado com os nomes dos meus
correspondentes. Manter essas correspondências me exigia muito tempo porque as
cartas eram grandes e eu não sei escrever pouco. Hoje, olhando pra trás eu vejo
que foi maravilhosa essa experiência, talvez tudo que eu sei de português eu
pratiquei escrevendo. Toda a minha vontade de escrever nasceu das cartas.
EmpautaUFS: Então o gosto por escrever sempre existiu?
Lilian Rocha: Sempre. Até pra terminar com namorado tinha
que ser por carta. Pra mim era mais fácil, eu conseguia me expressar melhor
escrevendo.
EmpautaUFS: Você gosta de ler? Quais são os seus autores
favoritos?
Lilian Rocha: Eu gosto de ler tanto quanto escrever. Se você
entrevistar vários escritores vai ver que cada um tem seu estilo de escrever e
esse estilo de escrever foi normalmente fruto de alguma coisa que leu. O meu
estilo, por exemplo, de achar que as coisas têm vida são frutos da minha
imaginação e de coisas que eu li. Minha cabeça sempre foi muito fantasiosa e eu
sempre alimentei muito isso. Além dos contos de fada que me estimularam muito
quando criança, autores como Monteiro Lobato também me estimularam muito. Eu
adoro Monteiro Lobato, eu acho que ele é o rei da imaginação. Também gosto
muito de Maurício de Souza, apesar de ele não fazer livros, só revistinhas. Eu
acho que ele é o grande continuador de Monteiro Lobato. E os clássicos: Amo,
amo, amo de paixão Machado de Assis, eu sempre disse isso em sala de aula. A
partir de um livro que eu li, Dom Casmurro, me apaixonei tremendamente por ele.
Pena que ele morreu sem eu ter conhecido, eu ia ficar batendo na porta dele pra
conseguir um autografo. (risos). Não são as histórias deles que são diferentes,
são histórias comuns, mas ele tem uma maneira incomum de contar. Ele tem um
estilo completamente diferente e um português que eu bebo. O português dele é o
máximo. Gosto muito de Rubem Braga como educador. Gosto de Luís Fernando
Veríssimo em termos de humor e de Fernando Sabino em termos de crônica. Eu não
tenho um estilo favorito, eu adoro livro de guerra.
EmpautaUFS: Você pretende se dedicar exclusivamente ao
publico infantil?
Lilian Rocha: Não, porque na verdade, eu não tenho um estilo
definido de literatura. O primeiro livro nasceu infantil por circunstância, por
causa do prêmio Banese. Havia 3 categorias: contos, poemas e literatura
infanto-juvenil. Por falta de contos e por não saber escrever poemas, resolvi
me inscrever nessa última categoria. Por sorte minha, as crianças gostaram da
minha história e eu resolvi fazer mais um nessa linha, ‘O Chá das Oito’. Mas já
escrevi outras coisas que não são infantis, como ‘O Bilhete’ e o mais recente,
‘Antes da Escuridão’. Portanto, não tenho um estilo definido, simplesmente
gosto de escrever e acredito que meus livros podem ser lidos por qualquer
pessoa.
EmpautaUFS: Como surgiu a idéia de escrever o livro “Antes
da escuridão”?
Lilian Rocha: Esse livro não nasceu da ideia de escrevê-lo.
Tinha voltado do oftalmologista, com notícias nada animadoras e estava muito,
muito triste. Quando estou assim, tenho que escrever pra ‘gastar’ minha
tristeza. Fui colocando pra fora o que estava sentindo e percebi que, no final,
eu já estava bem mais calma. Eu tinha conseguido até fazer graça com minhas
desgraças! Isso me animou e eu resolvi fazer uma retrospectiva, em forma de
diário, pra contar a ’trajetória de luta’ do meu olho esquerdo, o grande personagem
dessa história e a quem eu dedico esse livro.
EmpautaUFS: Como você divulga seu trabalho? Há dificuldades?
Quais são os incentivos?
Lilian Rocha: Essa talvez seja a maior dificuldade de um
escritor. Como não tenho uma editora, fica comigo também essa parte de
divulgação e distribuição. Coloco meus livros debaixo do braço e vou
pessoalmente visitando as escolas. Isso requer tempo, mas vale a pena, pois a
receptividade que encontro nas escolas é muito grande.
Nos últimos tempos, também tenho contado com a ajuda valiosa
de amigos jornalistas que têm divulgado bastante o meu trabalho. A eles, serei
sempre grata.
EmpautaUFS: Quando começa a escrever você sabe mais ou menos
qual vai ser o começo, meio e fim ou tudo vai surgindo ao longo da escrita?
Lilian Rocha: Quando escrevo, só tenho um comecinho da
história e mais nada. Mas à medida que vou escrevendo, a história vai fluindo
naturalmente, como se estivesse pronta e acabada dentro de mim. Muitas vezes,
enquanto estou escrevendo, fico rindo sozinha dos meus próprios personagens,
como se eles tivessem vida própria, é muito interessante. Por isso que o ato de
escrever é um ato solitário. Precisamos estar sozinhos, para ouvir-lhes a voz,
ouvir o que eles têm pra nos dizer. Por isso, jamais me sinto só, pois há
vários personagens morando dentro de mim.
EmpautaUFS: Quando costuma escrever?
Lilian Rocha: Quando ligo o computador. Como isso acontece
todos os dias, então eu escrevo todos os dias. Escrevo quando estou feliz,
triste, preocupada, ansiosa, confusa… Escrever, pra mim, é a minha terapia, o
meu trabalho e o meu lazer. Tenho necessidade de escrever, tanto quanto tenho
de comer ou de dormir. Por isso, sempre encontro uma brechinha dentro da minha
falta de tempo.
EmpautaUFS: Já existe um novo projeto?
Lilian Rocha: Sim, estou sempre cheia de projetos. Já estou
com outro livro pronto, “A conquista da Oração”, que vai ser lançado no
comecinho de dezembro. É o segundo volume da minha coleção paradidática de
português, chamada ‘Língua Solta’, mais um projeto contemplado pelo BNB de
Cultura.
Já tenho pronto também o terceiro volume dessa coleção que
pretendo lançar no próximo ano, mais dois infantis começados e até os primeiros
esboços de um futuro romance, quem sabe?
EmpautaUFS: Dos livros que escreveu qual é o favorito?
Lilian Rocha: Eu não saberia dizer. Livros são como filhos,
não há um predileto. Cada um ocupa um espaço próprio, representa um momento
especial de nossa vida.
Há livros que foram mais trabalhosos, como esses
paradidáticos. Muito mais que livros de ficção, eles ensinam português. E pra
isso, os diálogos são mais pensados, mais elaborados. Gosto muito deles, da
forma divertida que criei pra ensinar português. Mas isso não quer dizer que
sejam eles os meus preferidos. Cada um deles tem um pouco de mim.
EmpautaUFS: De onde vem a inspiração para os seus livros?
Lilian Rocha: Do meu dia-a-dia. Normalmente as minhas
histórias têm como pano de fundo uma família grande, cheia de irmãos e
parentes. Deve ser a influência de minha própria família. Meus pais tiveram 6
filhos, meu marido vem de uma família de 6 filhos, eu e meu irmão mais velho
tivemos 5 filhos, enfim, sou cercada por uma família enorme, muito unida, que
me enche de orgulho. E numa família grande, tudo acontece, é muito divertido.
EmpautaUFS: Fale um pouco sobre seu programa de TV.
Lilian Rocha: Como tudo na minha vida, também nasceu por
acaso. Fui convidada por Marlene Calumby, pra fazer um programa educativo,
envolvendo uma repórter, um ator e eu, uma professora. Dessa estranha mistura,
nasceu o ‘Palavrear’, que nada mais era do que uma nova versão de um programa
que eu fazia na rádio, em 92. Eu escolhia um tema qualquer e contava a história
dele, desde a sua origem até os dias de hoje. Na TV, enquanto eu contava a
história, o grande e saudoso ator César Macieira, ia representando os
personagens, o que tornava o programa muito mais leve e divertido, sem perder,
contudo, a característica de cultural.
EmpautaUFS: Como você define a experiência que teve em sala
de aula?
Lilian Rocha: Sala de aula foi um laboratório. Eu comecei
com escolas primárias e quando eu me formei, fiz o concurso do estado e passei.
Como eu não tinha o curso pedagógico eu fui trabalhar na Escola Normal, ou
seja, minha formação como pedagoga só me permitia ensinar as futuras
professoras. Então eu pulei do primário para o que hoje seria o Ensino Médio.
Apesar de eu gostar de crianças a experiência na escola normal foi ótima.
Depois disso eu fui pro Atheneu trabalhar com o Ensino Fundamental II. Quando
eu estava na Escola Normal eu criei amizade com Marlene, alguém que me
incentivou muito e quando ela foi convidada a ser diretora do Atheneu me
convidou para dar aulas de português. Minha paixão era dar aulas de português,
mas eu não tinha formação em português. Eu sou formada em pedagogia. Então eu
estudava para dar aula e fui criando uma intimidade muito grande com Análise
Sintática.
EmpautaUFS: Conte um pouco sobre a sua experiência na rádio
Aperipê.
Lilian Rocha: Marlene foi convidada para ser superintendente
da Aperipê e me convidou para trabalhar lá também. Era um trabalho totalmente
diferente, lá eu passei 4 anos e eu também comecei sem saber nada de rádio. Ela
me entregou o setor de produção educativa. Então transformamos a rádio Aperipê
numa rádio educativa, como deveria ser. Eu comecei a inventar um bocado de
programas. Já existiam programas na rádio, mas eram só de músicas. Os locutores
ficavam falando, mandando abraço… (risos) Então eu comecei a colocar
informação, cultura, dicas de saúde e um monte de coisa. Depois criei meu
próprio programa. O tempo que eu passei lá foi profissionalmente excelente,
desenvolveu muito minha criatividade. O rádio assim como a sala de aula também
foi pra mim um grande laboratório. Mas na sala de aula acontece uma coisa
interessante, na rádio a gente faz o programa, mas nunca pode medir a
quantidade de pessoas que estão ouvindo, na sala de aula o público é presente.
O resultado é imediato então tudo que você ensina percebe na hora se eles
aprendem, a sintonia é imediata. Na rádio você acha que as pessoas estão
ouvindo, mas não tem certeza de nada. Mesmo o IBOPE não tem como medir, o que
ele oferece é uma amostragem o real não consegue.
Fotos: Morgana Brota.
Texto e imagens reproduzidos do blog:
empautaufs.wordpress.com
Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, em 23 de agosto de 2013.
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