Publicado pelo Portal f5news, em 15/09/2012.
"Falta sensibilidade na expansão de Aracaju"
Arquiteta mostra que patrimônio histórico da capital está se
perdendo
Por Fernanda Araujo
O centro de Aracaju (SE) e o bairro São José são lugares
onde basicamente se concentra a maior parte dos patrimônios históricos da
capital. Porém, o crescimento imobiliário desenfreado vem destruindo boa parte
dessa história. Preciosidades como o Cine Rio Branco e a Associação Atlética de
Sergipe foram perdidas. Casarões antigos têm sido demolidos para
empreendimentos imobiliários, na construção de estacionamentos, lojas, prédios
e etc. Tudo em favor da chamada modernidade urbana.
A arquiteta e urbanistaTainá Sousa, professora do Curso de
Arquitetura da Universidade Tiradentes, defende a necessidade de a população
ser mais crítica e exigente e que todos estejam engajados no processo de evitar
as demolições. Ela fala ao F5 News sobre o crescimento imobiliário e a
importância da preservação dos patrimônios históricos.
F5 News – Quais os lados positivos e negativos do
crescimento imobiliário em Aracaju?
Tainá Sousa – O crescimento deve existir, em qualquer cidade
- até porque espaços urbanos são dinâmicos e feitos para serem alterados,
renovados e expandidos. Porém, o que se vê em Aracaju é uma total falta de
sensibilidade ao se promover essa expansão. O interesse que prevalece é dos
agentes imobiliários (construtoras, incorporadoras, e até imobiliárias) que têm
como único objetivo lucrar com a comercialização do solo urbano. Porém, existem
leis que regem esse crescimento da cidade para que ele não ocorra de maneira
insustentável e garanta a preservação de bens de interesse histórico e cultura,
assim como espaços naturais que merecem proteção ambiental. O que precisa ser
feito é exigir o cumprimento dessas leis, de maneira que se permita a promoção
da expansão imobiliária, sem prejuízo aos elementos que compõem a paisagem
urbana da cidade e que faz parte do imaginário histórico, cultural e ambiental
de seus habitantes.
F5 News – A história vai se perdendo ao longo dos anos por
conta desse crescimento e das demolições?
Tainá – Sim! O que se percebe é uma total descaracterização
do espaço edificado da cidade ao longo desses 157 anos. Poucos são os edifícios
particulares que ainda se mantém de pé para contar nossa história, sobrando
basicamente aqueles de propriedade pública, mas que, por falta de políticas
públicas de preservação, estão em péssima situação.
F5 News – Casas, museus, clubes, cinemas, colégios. Quanto
já se foi perdido por conta das demolições?
Tainá – Vários exemplares da nossa arquitetura já foram
demolidos. Desde residências ao Cine Rio Branco, citando a Associação Atlética
de Sergipe, o Colégio das freiras sacramentinas Nossa Senhora de Lourdes, entre
outros.
F5 News – Em sua carta de repúdio ao processo de demolições
do Patrimônio Histórico de Aracaju, no dia 14 de maio deste ano, você fala em
falta de identidade e desvalorização cultural. Você realmente acredita que
“nossa sociedade sergipana não está apta a receber e conservar o patrimônio
edificado por nossos ancestrais”?
Tainá – A sociedade sergipana de hoje em dia realmente não
está apta! Talvez os mais antigos, sintam muito por essa onda de demolições,
mas acredito que mais por saudosismo dos velhos tempos do que pela consciência
de que a preservação é necessária para transferir a importância da nossa
história e cultura para as gerações que se seguem. Falta educação, interesse
pelo que é daqui - e isso é muito citado pelos artistas da terra - e
comprometimento do poder público em preservar nossa história.
F5 News – Já dizem que o sergipano gosta de valorizar as
novidades. Como a sociedade pode ser mais atuante na manutenção do velho em detrimento
do novo?
Tainá – Acho que a questão não é deixar de construir o novo
para manter o velho. Essa discussão vai muito mais além dessa simples
colocação, mas a cidade tem muitas áreas para crescer, e mesmo no Centro e
adjacências, onde se concentra a maior quantidade de imóveis antigos, a
adaptação desses imóveis para novos usos é totalmente viável e possível,
precisando que a população seja mais crítica e exigente e que todos estejam
engajados no processo. O poder público, especialmente a Prefeitura Municipal,
deve aplicar os instrumentos previstos no Plano Diretor e que podem
"forçar" o uso de um imóvel abandonado, com o objetivo de fazê-lo
cumprir sua função social. E ainda através de políticas de incentivo à
recuperação e restauração desses imóveis, a mesma Prefeitura pode reduzir IPTU
para aqueles imóveis que forem restaurados, criar linhas de crédito para
viabilizar as obras, entre outras questões. Os proprietários devem ser levados
a entender a importância dos edifícios históricos e se posicionarem de maneira
a preferir adaptar seu uso (comércio, habitação, etc.) ao imóvel preexistente.
E nesse ponto eu quero responsabilizar diretamente os profissionais da área -
Arquitetos e Urbanistas - que devem promover esse convencimento de que é
possível usar o imóvel fazendo apenas algumas alterações. Podem ser usados
diversos argumentos como, usufruir da imponência comum nessas edificações para
dar destaque ao novo uso, economia durante a obra, já que serão evitados custos
com demolições e reconstruções, entre outros fatores. Já a população de um modo
geral deve ser os olhos e ouvidos da cidade. Se vir uma demolição sendo
iniciada, reclama na Emurb, no MPE, joga nas redes sociais, enfim. Talvez não
dê para resolver aquele caso específico, mas faz com que as pessoas comecem a
refletir sobre o assunto e dessa forma a sociedade começa a se conscientizar.
F5 News – Aracaju é realmente uma cidade planejada?
Tainá – Ao meu entendimento, não! Ela teve um projeto de
arruamento, onde foi definido o tipo de traçado urbano a ser adotado para a
cidade (em forma de xadrez), mas planejamento é muito mais do que isso. Uma
cidade planejada, tem princípios teóricos que regulam sua ocupação ao longo do
tempo, devem ser feitos estudos sobre tipo de solo existente, áreas de preservação
ambiental, entre outros fatores que irão influenciar a expansão com o decorrer
do tempo.
F5 News – O que você acha que vai acontecer com as casas
antigas no Centro?
Tainá – Não é possível prever, mas de acordo com o que tem
sido feito para evitar as demolições e abandonos, a situação só será agravada.
*Tainá Sousa é arquiteta e urbanista. Professora do curso de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade Tiradentes e membro do Instituto de
Arquitetos do Brasil – Departamento Sergipe.
Fotos: cedidas arquiteta Tainá Sousa.
Texto e imagens reproduzidas do site: f5news.com.br
Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, em 2 de Julho de 2013.
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