Infonet - Blog Luíz A. Barreto - 25/02/2006.
Carnaval e Micareme.
Por Luíz Antônio Barreto.
Sergipe tem um vasto calendário de festas cívicas,
populares, religiosas, alimentadas por forte tradição do povo. Seu carnaval,
atualmente restrito a Neópolis e outras poucas cidades, já foi vistoso,
atraente, mobilizando populações inteiras nas ruas e nos clubes de Aracaju e do
interior. Vários clubes carnavalescos, a exemplo dos sobreviveram, por longo
tempo, animando a festa, reunindo adeptos que se tornavam, no tríduo momesco,
foliões com suas fantasias, adereços, e munidos de lança-perfume, que era de uso
permitido, tanto na ampola de vidro – Colombina -, como na de metal – Rodhia –
e de talco ou “maisena”, andavam em grupo, tomando os lugares públicos, como o
Ponto Chic, na rua de João Pessoa, esquina com a rua de Laranjeiras, onde está
hoje o Ministério do Trabalho.
A primeira forma do carnaval em Sergipe, como de resto em
várias partes do Brasil, foi o Entrudo, realizado no primeiro dia do ano, com
sua “Guerra de Cabacinha”, também conhecido como Limão de Cheiro, seus bandos
de mascarados, grupos folclóricos, especialmente Lambe – Sujos e Caboclinhos.
Corinto Mendonça, doublé de arquiteto e memorialista,
lembrava que por volta de 1895 surgiram os primeiros blocos carnavalescos: Os
Mercurianos, trajando as cores azul e encarnado (vermelho) e os Cardovínicos,
que vestiam as cores branco e vermelho. Já na primeira década do século XX
apareceram Os Filhos de Baco e o Arranca, e também os Fenianos, que disputavam,
como rivais, com os Mercurianos, nos últimos tempos deste bloco. Em 1940
apareceram Os Legionários de Sergipe, grêmio carnavalesco que ficou famoso em
toda a década, dividindo a preferência com os Mercurianos, nos anos finais de
existência deste grupo. Na mesma década de 1940 apareceram, com seus carros
alegóricos e suas fantasias, o bloco Gato na Tuba. Na década seguinte surgiu a
escola de samba Império Serrano, que ensaiava nas imediações da velha Caixa
d´Água. Em 1966 foi fundada a escola de samba Império do Morro, pelo
babalaorixá Gilberto da Silva, o popular Lê, com sede na rua de Gararu, 419.
Além dos bandos de mascarados, dos grupos folclóricos, dos
blocos e ranchos e das escolas de samba, o carnaval sergipano, notadamente em
Aracaju, promovia um Corso, desfile de carros enfeitados e cheios de moças e
rapazes. O Corso era tão presente e importante nos dias de carnaval, que em
1928, por exemplo, foi traçado um roteiro oficial, por onde os carros deveriam
passar, saindo e voltando para a rua de Japaratuba (hoje João Pessoa), passando
pelas ruas de Maroim, Pacatuba, e Itabaiana, pelo lado da Ponte do Imperador, e
pela praça Fausto Cardoso. Em 1932 o carro que fez bonito foi o da Fábrica
Sergipe Industrial, levando operários para o desfile nas ruas centrais da
cidade.
Os bailes se tornaram eventos de multidões, lotando os
clubes, desde o Recreio Clube, que é de 1916, instalado na atual praça Olímpio
Campos, o Clube Esportivo Sergipe, que embora seja mais velho, de 1909, não era
propriamente um clube social, nem o Cotinguiba Esporte Clube, que também é
daquela época remota da vida aracajuana, a Associação Atlética de Sergipe,
construída em 1937, o Iate Clube de Aracaju, que é de agosto de 1953, e outros,
como o Vasco, quando funcionava na rua de São Cristóvão, o Clube dos
Comerciários, na avenida Carlos Firpo, o Clube dos Sargentos, na rua João Pessoa,
o auditório da Rádio Difusora, no Palácio Serigy, entrada pela rua José do
Prado Franco. As orquestras, conjuntos, cantores, animavam os bailes, dando aos
três dias carnavalescos uma animação que varava a noite, entrava pela madrugada
e, na terça feira terminava pela manhã do dia seguinte. O maestro Pinduca (Luiz
dÁnunciação) é uma testemunha privilegiada, pois sua Rádio Orquestra animou
muitos carnavais de Aracaju, nos anos de 1940. Músicos como Eutímio, Miguel
Alves, Carvalhal, Honor Gregório, e muitos outros, conquistaram os aplausos dos
foliões. Orquestras de Pernambuco, como as dos maestros Nelson Ferreira e
Guedes Peixoto, também ajudaram a manter o prestígio do carnaval sergipano.
No interior, ao som dos sucessos de Capiba, na voz de
Claudionor Germano, o carnaval sobrevivia sem maiores públicos. O que animava o
folião interiorano era a Micarema, carnaval depois da quaresma, com seus blocos
bem enfeitados, numa rivalidade que chegava às últimas conseqüências.
Laranjeiras, e Maroim tinham blocos que permaneceram anos seguidos, como o
Chic, o Paladino, o Santa Cruz, dividindo o povo entre torcidas. E os bailes
nos clubes. O Treze, em Própria, o Cruzeiro, em Estância, O Sobrado e a Sede,
em Tobias Barreto, o Gabinete de Leitura, em Maroim, dentre muitos outros que
sediam seus espaços para a animação carnavalesca.
As serpentinas, os confetes, a lança-perfume, as máscaras,
as fantasias, o talco, o ritmo das marchinhas e dos frevos, a cadência do
samba, enfim toda uma atmosfera de festa típica, para a qual rapazes e moças
ganhavam licença dos pais, sem hora limitada, sem patrulhamentos ou
vigilâncias. Carnaval e Micareme ou Micaretas sempre rimaram com liberdade, até
mesmo para as crianças, dançando roda na praça Fausto Cardoso, ou participando
dos bailes infantis dos clubes, trajando roupas preparadas, especialmente, para
o tríduo da folia. Situada entre dois pólos carnavalescos – Recife e Salvador –
Aracaju perdeu a sua referência com relação ao carnaval. O show nas imediações
dos Mercados, e que remontam ao Clube do Povo, tentativa de reanimar a folia,
iniciativa do então Prefeito Heráclito Rollemberg, tem sido os últimos suspiros
dos velhos carnavais.
Foto e texto reproduzidos do site:
infonet.com.br/luisantoniobarreto
Postagem originária da página do Facebook/Minha Terra é SERGIPE, de 01/03/2014.
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