Lucilo da Costa Pinto na Faculdade de Medicina (foto).
Infonet - Blog de Lúcio Prado - 27/09/2013.
Discurso pronunciado pelo acadêmico Lúcio Antonio Prado Dias *
O Centenário de Costa Pinto
Grande médico, professor, intelectual, político e líder
católico.
No local onde o Recife nasceu, justamente na cabeceira da
ponte construída pelo conde Maurício de Nassau, existia o Arco da Conceição,
que era o portão de entrada da cidade. O Arco foi demolido em 1913, por
exigências do trânsito. Recife começava a se modernizar.
Uma alternativa, até o final do século XIX, de chegar, por
exemplo, a Olinda era pegar um pequeno barco que transportava as pessoas da
pequena faixa de terra que ligava a praia próxima ao Forte Brum com a vilarejo
chamado de Santo Amaro das Salinas.
Em Olinda, residia e trabalhava o médico Ricardo José da
Costa Pinto, atuando como ginecologista e obstetra no hospital da cidade,
praticando ainda a psiquiatria no consultório. Talvez isso explique a grande e
variada biblioteca que possuía em casa. Com paixão incomensurável pela leitura,
fazia dela o seu predileto lazer. Casado com Alice Barreto da Costa Pinto,
tiveram o casal 16 filhos. O primogênito recebeu o nome de Lucilo.
Lucilo da Costa Pinto nasce, pois, em 23 de setembro do ano
da demolição do Arco da Conceição, 1913, em Olinda, mais especificamente na rua
Matheus Ferreira, número 13. Vem ao mundo no período em que Recife começava a
sua modernização, início do século XX, como estava acontecendo em outras
cidades brasileiras.
Desde pequeno Lucilo convive com os livros de medicina e de
literatura em geral, fartos na biblioteca de sua casa. Ouve narrações de casos
clínicos, de doenças e do dia a dia dos hospitais, contadas pelo pai. Ali
mesmo, no recesso do lar, aprende as primeiras letras.
Em seguida, é matriculado no grupo escolar João Barbalho,
situado à Rua do Hospício, no Parque 13 de maio, até concluir o curso primário.
Nessa mesma escola, anos depois, estuda a jovem e depois grande escritora,
Clarice Lispector. Ainda no grupo escolar João Barbalho, é colega de turma de
Mauro Mota, que viria a se destacar na intelectualidade pernambucana, como
poeta, escritor e educador, como membro da Academia de Letras de Pernambuco e
da Academia Brasileira de Letras. Apaixonado pela leitura e sempre estimulado
pelo pai, com apenas dez anos de idade, Costa Pinto já havia lido “Os
Lusíadas”, a obra prima de Camões, e recitava seus versos a todo o momento.
Findo o curso primário, Costa Pinto segue para o Colégio
Marista do Recife, situado na Avenida Conde da Boa Vista, onde faz o curso
ginasial, de 1924 a 1928. De 1929 a 1931 faz o curso científico no Ginásio
Pernambucano, situado na Rua da Aurora. Em 1932 é aprovado para o curso de
Medicina da Faculdade do Recife, na época localizada no Derby.
A primeira tentativa de criação de uma faculdade de medicina
em Pernambuco ocorrera no século XIX, em 1895, mas somente em 1914, a
Congregação da Faculdade de Farmácia, da qual fazia parte um grupo de
professores médicos, decidira aprovar, por unanimidade, a sua criação.
Em 1915, o Dr. Octávio de Freitas escolhido, por aquela
Congregação, também por unanimidade, Diretor da Faculdade de Farmácia, conclama
seus colegas a escolherem os futuros professores da Faculdade de Medicina e
assim, em abril de 1915, é instalada a 1ª Congregação da nova Faculdade de
Medicina.
Em 4 de maio de 1920, realiza-se a 2ª Congregação da
Faculdade de Medicina do Recife, que aprova a ata da reunião de 5 de abril de
1915, data reconhecida como a da fundação da Faculdade de Medicina de Recife. A
primeira turma forma-se em 1925. A Faculdade de Medicina do Recife funciona no
prédio da Faculdade de Farmácia de 1920 a 1927, localizada na Rua do Sebo, hoje
Barão de São Borja. Em abril de 1927, a Faculdade de Medicina do Recife passa a
funcionar no Derby, hoje sede do Memorial da Medicina, e que abriga a Academia
de Medicina de Pernambuco, o Museu Médico, a Sobrames Pernambuco e outras
entidades culturais relacionadas à Medicina.
Em 1928, a faculdade é equiparada às demais faculdades
oficiais do Brasil, mas só em agosto de 1946 viria a ser incorporada à
Universidade do Recife. Em 1949, é federalizada e passa a integrar a
Universidade do Recife, com o então nome Faculdade de Medicina da Universidade
do Recife, continuando a funcionar com sede no prédio do Derby com as cadeiras
básicas e nos Hospitais Pedro II, Santo Amaro, Hospital Infantil Manoel
Almeida, Hospital da Tamarineira, Hospital do Centenário e Maternidade do
Derby, com as cadeiras clínicas.
Em 1934, como estudante do segundo ano de medicina, Costa
Pinto conquista o seu primeiro emprego. Recebe convite para trabalhar como
datilógrafo no Ginásio Pernambucano, sendo nomeado pelo Dr. Carlos de Lima
Cavalcante, então Interventor do Estado. Em 1936, ainda cursando a faculdade, é
nomeado professor assistente de Química da Escola Normal de Pernambuco,
professor de Química Orgânica da escola Normal Pinto Junior e nesse mesmo ano,
ainda na faculdade, casa-se com Célia Bastos de Albuquerque, descendente de
família europeia, a mãe, Hortencia Guerrér, era francesa e o pai, Manoel Bastos
de Albuquerque, pernambucano, descendente de portugueses. Do casamento de
Lucilo e Célia nasce oito filhos, Rosa Maria, em 1937, Carlos Gilberto, em
1939, Marcos Túlio, em 1940, Vera Maria, em 1942, estes nascidos em Recife,
Paulo Roberto, em 1944, Sonia Maria, em 1947, Célia Maria, em 1950 e Lucia
Maria, em 1954, estes últimos em Aracaju.
Com destacada militância na política estudantil, é vítima de
forte perseguição a partir de 1937, com a instalação da ditadura de Vargas – o
Estado Novo. Começam as perseguições políticas do novo interventor Agamenon
Magalhães. Costa Pinto é demitido dos seus empregos e cargos. São tempos
difíceis, ainda estudante, desempregado, casado, com família para sustentar. As
perseguições aos comunistas e integralistas são implacáveis.
Em 10 de dezembro de 1938, com 23 anos, Lucilo da Costa
Pinto forma-se médico, mas não participa da solenidade festiva ocorrida no
Teatro Santa Isabel, local tradicional das formaturas de medicina desde 1925
por se encontrar preso na Casa de Detenção de Pernambuco, lugar onde permanece
por aproximadamente seis meses. Somente vem a receber o diploma em meados de
1939. Começa então a clinicar na Rua da Aurora, no centro de Recife,
compartilhando o consultório do pai. Somente a clínica, porém, não lhe dá as
condições mínimas para o sustento da família. Enquanto isso, as perseguições
continuavam, mesmo sendo o Dr. Ricardo Costa Pinto muito respeitado nos
círculos políticos de Recife, com passagem na Assembleia Legislativa de
Pernambuco como deputado estadual. As coisas continuavam difíceis para o jovem
médico Lucilo. Sem emprego fixo, com a prole aumentando, as dificuldades eram
crescentes. Não havia mais espaço para Costa Pinto em Pernambuco.
Em 1939, atendendo convite do professor Joaquim Sobral, que
dirigia o Colégio Atheneu Sergipense, transfere-se para Aracaju para
administrar aulas de Química, deixando para trás, temporariamente, com o
coração partido, a sua querida esposa Célia, grávida do terceiro filho. Ela
ficaria na casa dos pais por um determinado tempo até que o esposo se
estabelecesse profissionalmente. Costa Pinto instala-se na pensão de Dona Rosa,
localizada na Rua da Frente, na Avenida Rio Branco e começa a ensinar no
Atheneu.
Em 1940, mais estabelecido, autoriza a vinda de Célia e dos
filhos para Aracaju e desta cidade nunca mais irá sair. A família fica também
instalada na pensão de Dona Rosa e lá permanece por quase um ano. Depois
consegue alugar uma casa na Av. Barão de Maruim, na esquina com a Rua Vila
Cristina. Morava na casa vizinha o Dr. Souto, médico militar que trabalhava no
Hospital Santa Isabel e do qual Costa Pinto se torna um grande amigo.
Aracaju, na década de 40, possui pouquíssimos médicos, a
maioria generalistas e alguns cirurgiões gerais. Não havia ainda um urologista
especializado. Cirurgiões faziam procedimentos urológicos como atos cirúrgicos
gerais. É nessa condição que Costa Pinto ingressa no Hospital Santa Isabel,
levado pelo Dr. Souto e, posteriormente, atendendo convite do Dr. Augusto
Leite, no Hospital Cirurgia. Em 1941 começa a clinicar, dividindo o consultório
com o Dr. Garcia Moreno e posteriormente monta consultório próprio no centro da
cidade, no Edifício Aliança, na esquina de Itabaianinha com a Rua Laranjeiras.
Anos depois transfere o consultório para um imóvel alugado na Rua Geru.
Continua nosso homenageado lecionando química, agora também
no Colégio Tobias Barreto do professor Zezinho e no Colégio Nossa Senhora de
Lourdes, conhecido como Colégio das Freiras, na Rua José do Prado Franco.
Leciona também física e ciências naturais no Atheneu. Destaca-se no magistério.
Passa a ensinar Ciências Naturais também no Seminário Menor da Diocese de
Aracaju.
O ano de 1942 coloca o Brasil e particularmente Sergipe na
mira dos canhões de Hitler. Navios mercantes são torpedeados no litoral da
Bahia e de Sergipe e finalmente a ditadura de Vargas declara guerra ao Eixo.
Todos são convocados para o esforço da guerra. Costa Pinto é o primeiro médico
civil a se apresentar no 28º Batalhão de Caçadores e é destacado para patrulhar
o litoral sergipano, inicialmente como tenente e depois como capitão Dr. Costa
Pinto. No último ano da guerra, em 1945, defende a tese “Contribuição ao Estudo
da Fisiologia do Timo”, perante uma rigorosíssima banca examinadora e se torna
Professor Catedrático de Ciências Naturais do Colégio Atheneu Sergipense.
Em entrevista concedida ao jornalista Osmário Santos e publicada
pelo Jornal da Cidade em 29 de outubro de 1990, Costa Pinto relembra essa fase:
“ O concurso que fiz em 1945 foi uma coisa que me marcou profundamente. Fui
enfrentar a banca examinadora para catedrático do Atheneu. Como estávamos na
época da guerra, a luz era cortada. Eu escrevi minha tese com dois candeeiros
de querosene. Levei oito meses de pesquisa. Depois não tive dinheiro para
imprimir e mimeografei. Tinha que dar dez volumes ao Atheneu e dinheiro que é
bom, nada! Então o professor Acrísio Cruz me disse: Olha, eu trabalho numa
secretaria que tem um mimeógrafo. Você quer mimeografar? Fiz 50 exemplares do
meu trabalho. Para garantir o meu ingresso por concurso tive que me submeter à
temida banca examinadora.
A temida banca examinadora a que se refere Costa Pinto era
formada pelos médicos Oscar Nascimento, Clóvis Conceição e Garcia Moreno, todos
patronos deste sodalício, além do professor Alfredo Montes. Não imaginava o
nosso homenageado que muitos anos depois viria a ser patrono dessa mesma academia
que hoje lhe reverencia. Patrono da cadeira 26 da Academia Sergipana de
Medicina em 1994, que tem como fundador o Dr. Cleovansóstenes Aguiar.
Em 1946, Costa Pinto é nomeado médico do Departamento de
Saúde do Estado de Sergipe pelo Dr. Walter Cardoso, que comandava o órgão e é
destacado para coordenar o serviço de controle das doenças sexualmente
transmissíveis e nesse mesmo ano é destacado para representar o estado em um
congresso de Medicina Preventiva em Buenos Aires. Decide então aproveitar a
oportunidade e faz pós-graduação em cirurgia urológica na capital argentina.
Retornando a Aracaju, torna-se o primeiro especialista em cirurgia urológica de
Sergipe, permanecendo nessa condição durante 17 anos.
Em 1947, atuando como médico sanitarista assume a secretaria
municipal de saúde, atendendo convite do prefeito Marcos Ferreira de Jesus.
Lucilo da Costa Pinto foi um importante e destacado pensador
cristão e militante da Ação Católica e da LUC – Liga Universitária Católica -
ao lado do Monsenhor Luciano José Cabral Duarte, Antonio Garcia, Cabral
Machado, Silvério Fontes, José Amado do Nascimento, Luiz Rabelo Leite, entre
outros. Coloca assim a sua intelectualidade, religiosidade e fé a serviço da
religião, contribuindo com estudos sobre os salmos bíblicos e o Santo Sudário.
O movimento da Ação Católica encantou o médico Costa Pinto.
Desenvolvida através de cinco movimentos principais, todos juventudes cristãs,
a Ação Católica começou na Bélgica com o Monsenhor Cardjin, que fez as suas
primeiras experiências com a Juventude Operária Católica e que logo se espalhou
pela França e Canadá. Propugnava a formação na ação, utilizando o método
“ver-julgar-agir”, que corresponde a estudo, diagnóstico e tratamento na
metodologia do Serviço Social. Em Sergipe, desenvolveu-se, entre outras, a LUC
– Liga Universitária Católica, formada por profissionais com curso superior.
Foi iniciada em 1945, no tempo de Dom José Thomaz tendo Dom Avelar Brandão como
o seu principal animador. Depois, ficou sobre o comando de Don Fernando Gomes e
a assistência eclesiástica do padre Luciano Cabral Duarte, após regressar de
seus estudos na Europa.
A empolgação com a Ação Católica pode ser sentida pela
declaração do padre Luciano Cabral Duarte em artigo publicado em A Cruzada em
1950. Para ele, a AC vem: Restaurar. Reacender as chamas mortas. Selar de novo
os antigos e sacrossantos compromissos perjurados. Fazer os cristãos viverem de
tal modo que a sua vida, para os outros homens, seja uma coisa inexplicável sem
Deus. Apontar aos homens a velha e amiga estrada abandonada, a que conduz à
Casa Paterna. Ensinar que não se é cristão por se haver perdido, mas por se
haver achado. Reafirmar a cada passo, a cada solicitação do mal, a cada tropeço
nas escarpas da vida, reafirmar com São Paulo esta coisa formidável:” Eu sei em
quem acreditei”. É isto a Ação Católica. Somente isto. Tudo isto.
Designado pela Diocese de Aracaju, Costa Pinto torna-se
orador oficial em nome do clero sergipano no discurso de boas vindas ao Bispo
Dom Fernando Gomes, em sua chegada a Aracaju, onde assumiria a Diocese.
Milhares de pessoas se aglomeraram na Praça Olímpio Campos, para a Missa solene
a céu aberto, de ação de graças pelo novo Bispo.
Reconhecido por suas qualidades docentes e grande dedicação
ao ensino, além de ser portador de uma didática excelente, recebe convite para
ser professor da Faculdade de Filosofia, lecionando a disciplina de
antropologia. A Faculdade Católica de Filosofia, fundada em 20 de setembro de
1950, no Colégio Nossa Senhora de Lourdes teve sua aula inaugural ministrada em
11 de março de 1951 pelo padre Luciano José Cabral Duarte. O Dr. Costa Pinto
compõe o seu primeiro Conselho Técnico Administrativo, ao lado de Gonçalo
Rollemberg Leite, Felte Bezerra, José Barreto Fontes, padre Euvaldo Andrade e Manoel
Ribeiro.
Em seguida, com a inauguração da Faculdade de Serviço
Social, em 27 de março de 1954, que nasce sob inspiração do Bispo Dom Fernando
Gomes e o trabalho árduo de Albertina Brasil Santos para a sua implantação, o
Dr. Costa Pinto passa a integrar o corpo docente da instituição.
Nos anos 50, Costa Pinto também participa ativamente do
conselho editorial do jornal A Cruzada, ao lado do então Monsenhor Luciano José
Cabral Duarte, Cabral Machado, Silvério Fontes, Antonio Garcia e José Amado
Nascimento. A Cruzada foi um semanário de orientação católica que circulou em
Sergipe durante boa parte do século XX. Criado em 1919 pelo primeiro bispo
diocesano, D. José Thomaz Gomes da Silva. Com a JUC e a Faculdade de Filosofia
compunha a tríade acadêmica e religiosa colocada como meta pelo bispo Dom
Fernando. Em Sergipe, muitos leigos e padres despontaram para as letras através
das páginas de A Cruzada. Entre os colaboradores mais assíduos do jornal , na
época, aparecem Paulo Machado, Santos Mendonça, Garcia Moreno, Santos Souza,
Goes Duarte, Garcia Rosa, Leyda Régis, Antonio Conde Dias, Passos Cabral, José
Amado Nascimento, entre outros.
Foi membro atuante do Instituto Histórico e Geográfico de
Sergipe desde julho de 1950, quando também passa a atuar como médico no
Instituto do Açúcar e do Álcool. Em sua integração com a sociedade integra o
Lions Clube de Aracaju e funda, ao lado de combativos companheiros, o Iate
Clube de Aracaju, do qual foi Comodoro. Torna-se sócio da Associação Atlética
de Sergipe, da qual também foi presidente. Alargando os horizontes culturais
participa da fundação da Aliança Francesa no Estado.
Em janeiro de 1961, graças ao estoicismo e árduo combate de
Antonio Garcia Filho, é fundada e instalada a Faculdade de Medicina de Sergipe
e Costa Pinto, ao lado de Garcia, é uma dos mais entusiasmados pioneiros,
tornando-se o primeiro professor da disciplina de urologia, disciplina esta que
começaria a ser aplicada a partir de 1964.
Atuando mais decisivamente no Hospital Cirurgia, nas décadas
de 50 e 60, foi diretor do Pronto Socorro desse nosocômio por longos nove anos.
Passou a integrar o Centro de Estudos do HC desde a sua implantação, no inicio
dos anos 50. Autor de diversos trabalhos científicos, publicou diversos
trabalhos em revistas científicas, notadamente na Revista “Boletim do Centro de
Estudos do Hospital de Cirurgia”, do qual foi editor. Entre as suas
publicações, destacamos “Calculose e Carcinoma Vesical”, “Próstata Gigante”,
“Carcinoma Prostático” e “Um Caso de Retenção Urinária”.
Para o médico Marcelo Marinho Barreto, que foi o primeiro
monitor da disciplina de urologia de nossa faculdade e acompanhou de perto o
Dr. Costa Pinto, um dos seus mais destacados trabalhos publicados, pelo
ineditismo, foi o denominado “Carcinoma Prostático com Esquistossomose dos
Testículos”, que contou com a participação do anátomopatologista do Hospital de
Cirurgia, o Dr. Konrad Schmitt. Nesse trabalho, os autores apresentam o
primeiro caso da esquistossomose genital masculina no Hospital de Cirurgia, evidenciada
casualmente em exame anatomopatológico dos elementos espermatogênicos de um
paciente que sofrera orquidectomia sub-capsular bilateral, devido a carcinoma
prostático. Na verdade era um caso nunca relatado na literatura médica.
Para Marcelo, Costa Pinto era uma figura admirável, um
professor de uma didática ímpar, bem humorado, contador de casos e histórias
pitorescas para os alunos, mas rigoroso e exigente com os seus alunos. Diz
Marcelo: “Conheci o professor Costa Pinto quando ele operou o avô da minha
esposa, o Dr. Lauro Hora. Criamos uma amizade muito forte a partir desta
ocasião. Comecei então a acompanhá-lo no serviço de urologia tornando-me seu
assistente a partir de 1971. Posteriormente, fui o primeiro aluno a realizar a
prova para monitor da cadeira de urologia, sendo aprovado em primeiro lugar.
Dr. Costa Pinto era dono de uma didática fabulosa e de uma experiência muito
grande na vida profissional, tendo a facilidade de transmitir seus
conhecimentos com simplicidade e elegância”.
Desde estudante no Recife, Costa Pinto participa ativamente
da vida política, sempre como um líder de oposição. Combate o Estado Novo ainda
em Pernambuco. Em Sergipe, liga-se de imediato à UDN, à época um partido de
oposição, atendendo convite de Leandro Maciel, que conhecera através de uma
apresentação feita pelo senador Walter Franco, a quem entregara uma carta de
recomendação enviada por um amigo de seu pai em Recife.
Para o historiador e professor Jorge Carvalho do Nascimento,
o médico Lucilo da Costa Pinto sempre foi um nome muito respeitado em Sergipe.
Na constituinte de 1946 não conseguiu eleger-se, mas a condição de suplente lhe
garantiu ocupar uma cadeira na Assembleia Legislativa. Sua atuação independente
desagradou as principais lideranças partidárias, fazendo com que ele retornasse
à condição de suplente. Nas eleições de 1962 para a prefeitura de Aracaju,
recebe a indicação da UDN para concorrer, mas não logra êxito. Vence a disputa
o Dr. Godofredo Diniz. Em campanha acirrada, com os dois lados em disputa
intensa, o seu jingle de campanha, dizia:
"Costa Pinto, prefeito de Aracaju, Paulo Silva para ser
vereador, Nairson deputado estadual, João Machado federal, a UDN já
ganhou".
Na sua campanha, Costa Pinto destaca como prioridades para a
cidade, a sua pavimentação, arborização, urbanização, construção de escolas,
postos médicos, prontos-socorros e saneamento básico. E diz: "Hipoteco
minha confiança no eleitorado. Prefeito, darei o melhor do meu talento e das
minhas energias pelo bem estar do povo aracajuano", em texto contido no
seu material da campanha.
Aracaju não ganha o prefeito que precisava, mas continua a
contar com o médico humanitário, que não desiste da luta política. Tinha
disposição para trilhar os mais difíceis caminhos sem nenhuma hesitação. Como o
pássaro, nas palavras do médico, professor e membro desta Academia, também um
poeta de rara sensibilidade:
A certeza do apoio invisível confere ao pássaro a incrível
coragem de se arremessar contra o abismo.
Permanece na União Democrática Nacional até a sua extinção,
com o golpe de 1964 e participa ativamente da fundação do MDB com ficha de
inscrição número nove. Como dissemos anteriormente, tinha uma vocação pelas
siglas da oposição. Algumas lideranças políticas ligadas à antiga UDN assumiram
posição pendular, oscilando entre os antigos correligionários e a possibilidade
de assumir a postura oposicionista e partir para o enfrentamento da ditadura.
Não foi o caso de Costa Pinto e de outros, como Umberto Mandarino, Eraldo
Lemos, Edson Mendes de Oliveira. Como o pássaro ressaltado no poema de Garcia,
eles assumiram o projeto liderado por José Carlos Teixeira.
O MDB foi abrigo também para militantes de outras siglas
partidárias, notadamente do PCB e oriundos dos movimentos estudantis. Nesse
diapasão, nomes como o de Jackson Barreto, José Augusto Gama, Benedito
Figueiredo, Wellington Mangueira, entre outros, foram importantes para dar
consistência ao programa do partido.
Podemos dizer que Jackson Barreto e José Carlos Teixeira
foram lideranças fortes e importantes no MDB, com objetivos convergentes, mas
com estratégias distintas. Duas pessoas diferentes que deram vida e encarnaram
o projeto do Movimento Democrático Brasileiro. Singulares.
Em 1966, a oposição encontrou grande dificuldade para lançar
um nome para o Senado. Ninguém aceitava a indicação. José Carlos Teixeira então
convenceu o seu pai, o empresário Oviedo Teixeira, a aceitar a candidatura.
Mesmo assim, não se encontrava um nome para suplente. O médico Lucilo da Costa
Pinto teve o seu nome lançado, na última hora, depois que várias personalidades
recusaram a indicação. A dificuldade foi enorme para compor a chapa. Segundo
José Carlos Teixeira, todas as pessoas lembradas para a suplência ficavam muito
honradas, mas declinavam. “Lembramos do nome de Lucilo Costa Pinto, médico,
professor de prestígio. Mas ele estava viajando, estava no Rio de Janeiro e
chegou a Aracaju, na véspera do encerramento do prazo de prorrogação. Fomos
todos aguardá-lo na Rodoviária Luiz Garcia. Para surpresa geral, ele aceitou.
Alívio!
A candidatura de Oviedo Teixeira foi uma necessidade que se
impôs ao partido, uma vez que o nome natural para disputar a vaga de senador, o
de José Carlos Teixeira, ficava impossibilitado uma vez que ele não contava
ainda com a idade mínima de 35 anos, exigido pela Constituição.
Na capital, a campanha foi coordenada e comandada por Costa
Pinto enquanto Oviedo assumiu a coordenação da campanha no interior. O primeiro
comício foi realizado em Propriá, organizado pelo médico Octávio Penalva, patrono
da cadeira 30 deste sodalício, em 24 de setembro de 1966. Discursaram, além de
Penalva, o candidato ao Senado Oviedo Teixeira, o suplente Costa Pinto, os
candidatos a deputado federal José Carlos Teixeira e Ariosto Amado e mais
alguns candidatos a deputado estadual. Sobre este comício, Costa Pinto,
irreverente, lembrou um fato interessante ao jornalista Osmário Santos: “Neste
comício, o povo estava de braços cruzados. O povo de lá é duro pra comício.
Falaram onze oradores. Um amigo, que era do partido contrário, da Arena,
disse-me: muitos discursos e o povo não bate palma. Costa, eu sei que você é um
bom orador popular, mas aposto uma garrafa de uísque como você não arranca as
palmas do povo de Propriá. E eu apostei. Saí rapidamente de lá e fui à casa onde
estava hospedado, próximo ao palanque. Lá tinha na parede uma espada. Perguntei
à filha do dono da casa de quem era a espada. Foi do meu avô que era da Guarda
Nacional, disse ela. Peguei a espada e uma toalha e prometi trazê-los de volta.
Quando subi no caminhão, que era o palanque. Oviedo me disse: Que armada está
aprontando, Costa? O que é esse negócio enrolado na toalha? Eu, calado. Quando
chegou a minha vez, pra encerrar o comício, o locutor Jaime Araújo passou o
microfone. Pedi pra ele segurá-lo peguei a espada e apontei para o povo e
gritei: eis o símbolo da revolução que nos tortura. Foi um delírio geral.”
Nas eleições de 1970, o MDB voltou a ter grande dificuldade
para compor chapa ao Senado e mais uma vez Oviedo Teixeira foi o candidato e
somente em 1974 conseguiu eleger surpreendentemente Gilvan Rocha, numa eleição
memorável onde o médico consegue derrotar de um só golpe dois grandes caciques
da política sergipana, os ex-governadores Leandro Maciel e Arnaldo Rollemberg
Garcez.
Em 1976 o MDB realiza convenção municipal, numa sessão
comandada pelo presidente do Diretório Municipal do partido, Lucilo da Costa
Pinto. Ficam definidos 51 candidatos. Eleitos: Antonio Mesquita, Arnóbio
Patrício de Melo, Francisco Leite Neto, Genelício Barreto, Gidenal Ferreira,
João Alves da Silva, Jonas Amaral, José Batalha de Góes, Reinado Moura, Soares
Pinto e Lucilo da Costa Pinto, sendo o terceiro candidato mais votado.
O MDB, com a ampla maioria que formou, conseguiu eleger
Costa Pinto presidente da Casa em fevereiro de 1977. Nesse período, o partido
demonstrou grande maturidade política e sob a liderança de Costa Pinto, fez
oposição dura, porém ética ao prefeito da capital e, apesar de sua numerosa
base no parlamento, foi capaz por diversas oportunidades de aprovar projetos de
interesse da cidade, oriundos do executivo.
Em 27 de março de 1980, organizado em 42 diretórios nos
municípios sergipanos, é instalado em Sergipe o PMDB – Partido do Movimento
Democrático Brasileiro, com as presenças do deputado Ulisses Guimarães e do
senador Teotônio Vilela, em solenidade que acontece na Assembleia Legislativa.
Em jantar oferecido aos visitantes no Restaurante Adega do Antonio, faz uso da
palavra o médico Lucilo da Costa Pinto.
Durante a sua passagem pela passagem pela casa legislativa,
Costa Pinto manteve-se fiel aos princípios da honestidade, simplicidade e
justiça, valores próprios do seu caráter e de sua educação. Aos poucos o tempo
vai se encarregando de afastá-lo da vida político-partidária. Ele permanece com
suas atividades médicas no Hospital Cirurgia e no consultório particular agora
localizado na Rua Geru, em casa alugada para esse fim.
Em 1983, aos 70 anos, pela força da compulsória
aposentadoria, afasta-se das atividades profissionais e permanece ministrando
esporadicamente aulas na faculdade, já não operava e dedicava as suas horas de
lazer nos cuidados com a sua criação de periquitos australianos, uma paixão
adquirida para suprir o seu ócio criativo.
Em 1988 sofre com a morte da querida esposa Célia de
isquemia cerebral. Outro duro golpe vem com a morte do filho Marcos Túlio, em
18 de dezembro de 1994. Costa Pinto, fumante contumaz, começa a apresentar
sinais de doença obstrutiva crônica e vem a falecer em 1º de fevereiro de 1995,
em Aracaju/SE, com 81 anos, sendo sepultado no Cemitério Santa Isabel. Em 30 de
junho de 2004, a família sofre a perda de Carlos Gilberto, segundo filho de
Costa Pinto e Célia.
Para seus filhos, Lucilo da Costa Pinto, “foi um grande
médico, intelectual, político, cristão, homem do povo e acima de tudo um grande
pai. Em sua trajetória de vida, deixou exemplos a serem seguidos. Seu legado
nos enche de orgulho e muito nos honra ter vivido e convivido ao seu lado. Hoje
temos certeza em afirmar que fomos agraciados e abençoados com sua presença
entre nós. Obrigado, Costinha, por tudo”, esse o relato feito por seus filhos.
Para mim, em particular, foi desafiador falar sobre uma
pessoa que conheci por volta de 1976, quando fui seu aluno de urologia no curso
de Medicina. Naquela oportunidade, pude perceber o fascínio que ele exercia
sobre os estudantes. Mas pouco convivi com o querido professor. Por isso não
sei dizer-lhes que forças me levaram a aceitar o desafio de buscar no passado a
história do velho professor. Era uma força estranha que me impulsionava de
forma incontrolável a procurar caminhos, portas e fontes. Por isso, não poderia
deixar de agradecer aos filhos de Dr. Costa Pinto, em especial a Rosa, com quem
tive a honra e o prazer de trabalhar no Projeto Rondon, ela na condição de
diretoria executiva da instituição, na década de 70, pelas informações
fundamentais. Aos historiadores Jorge Carvalho e Antonio Samarone, pelo apoio
nos assuntos políticos, à Sra. Carmem Duarte, diretora do Instituto Dom Luciano
José Cabral Duarte, ao jornalista Osmário Santos, autor de Memórias de
Políticos de Sergipe no século XX, ao médico urologista Marcelo Marinho Barreto
e finalmente aos membros da Academia Sergipana de Medicina e em especial ao
nosso presidente Fedro Portugal, pela escolha do meu nome para essa
dignificante tarefa.
Muitas coisas poderiam ser acrescentadas a respeito do nosso
saudoso Lucilo da Costa Pinto, sobre a sua pessoa e as suas realizações. Mas
foi o melhor que pude. Nos versos da poetisa paranaense Helena Kolody há uma
bela imagem que pode ser aplicada à trajetória de vida do Dr. Lucilo da Costa
Pinto.
Deus dá a todos uma estrela, uns fazem da estrela um sol.
Outros, nem conseguem vê-la.
Para encerrar, gostaria de homenageá-lo como também a sua
família, com o poema de Ivan Petrovitch:
Feliz é o homem
que sabe trocar
a superficialidade
pela essência das coisas.
Na leveza do existir
não se deixa influenciar
pelas aparências.
Sabe que o valor do vôo
não é medido pela decolagem
velocidade
muito menos, pelo itinerário.
O valor do voo
* (Discurso pronunciado pelo acadêmico Lúcio Antonio Prado
Dias, por ocasião da celebração do Centenário de Nascimento do Dr. Lucilo da
Costa Pinto, patrono da cadeira 26 .da Academia Sergipana de Medicina, em
sessão solene ocorrida em 25 de setembro de 2013, no auditório da Sociedade
Médica de Sergipe).
Foto e texto reproduzido do site: infonet.com.br/lucioprado
Nenhum comentário:
Postar um comentário