Publicado originalmente no Facebook/Carlos Alberto Déda.
Os sapatos do Padre Pedro.
Por Carlos Alberto Déda.
Recentemente, ao comentar minhas lembranças do Ginásio
Jackson de Figueiredo, meu amigo e colega Ubiratan Mendes fez referência à
memória da Professora Zamor de Melo e aproveitou a oportunidade para lembrar
outro sergipano inesquecível: o Padre Pedro.
A Professora Zamor de Melo tinha origem em Aquidabã e era
tia dos amigos benebeanos Antônio Carlos Melo Maynard, que foi meu colega nas
Agências do Banco do Nordeste, em Simão Dias e em Aracaju, e Alberto Maynard,
que foi o Chefe do Departamento de Auditoria na Direção Geral daquele banco, em
Fortaleza.
O padre Pedro (Pedro Alves de Oliveira) era de Riachão
Dantas. Aqui em Aracaju ele notabilizou-se por sua fé e por seu trabalho de
dedicação ao próximo. Seguia cuidadosamente os ensinamentos de Cristo, dedicando-se
aos menos favorecidos. Ele foi considerado o sergipano mais importante dos
últimos 100 anos, em enquete patrocinada pela TV Sergipe, no ano 2000. Seus
familiares são personalidades do meio cultural sergipano: os artistas plásticos
J. Inácio, seu irmão, e CAÃ, seu sobrinho; e o professor da Universidade
Federal de Sergipe: Rafael Oliveira, também seu irmão.
O padre e a professora tinham em comum o respeito e a
admiração do povo sergipano.
Conheci o Padre Pedro quando eu era aluno do Ginásio Jackson
de Figueiredo, um colégio de ensino católico. Os alunos internos frequentavam a
missa dominical na Catedral, ministrada pelo Bispo Dom Távora, conhecido como o
bispo dos operários. O Padre Pedro ajudava nas festas da principal igreja do
bispado. Todo ano, na véspera do domingo de páscoa, os estudantes faziam a
confissão para comungarem na missa pascal. A Catedral ficava repleta de
juventude e o confessionário do Padre Pedro era logo identificado pela longa
fila de jovens. A moçada preferia se confessar com o padre que não esmiuçava
nem procurava detalhes das faltas reveladas, ouvia de relance os pecados e
recomendava que o pecador rezasse três padre-nossos e três ave-marias na
contrição de não mais pecar, pedindo a absolvição dos erros cometidos. Padre
Pedro era o exemplo de um verdadeiro sacerdote.
Certa vez, comentando sobre o comportamento de um vigário do
interior sergipano, disse-me meu tio Paulo Déda que conhecera muitos padres, a
maioria dedicados à religião, mas que um deles se distinguia por sua dedicação
em seguir os ideais humanitários pregados por Jesus, especialmente no que dizia
respeito à solidariedade aos indefesos e o amor aos pobres e humildes. Dizia
ele, com absoluta razão, que esse padre chamava-se Pedro, seu conterrâneo de
Riachão do Dantas. E, então, contou-me um fato curioso que repasso aqui.
Em um dia de inverno, estava meu tio em sua loja, Esquina da
Economia, a conversar com o Sr. Camilo, que também era proprietário de uma casa
comercial ali próximo. Observaram que em frente à loja o Padre Pedro prestava
ajuda a um faminto mendigo. Com seu alhar perspicaz de sapateiro, o tio Paulo
percebeu que o padre usava sapatos rotos, velhos mesmo. Convidou-o a entrar na
loja e o convenceu a aceitar um par de sapatos novos como presente. O padre não
teve como evitar a oferta, porque os sapatos velhos e furados causavam dores em
seus pequenos pés devido a umidade, ocasionada pelas pisadas em calçadas
molhadas, e as pedrinhas que entravam pelos buracos no solado. Agradecido, o
padre aceitou o presente.
Na semana seguinte, meu tio constatou que o padre voltara a
usar sapatos rotos. Não se conteve e perguntou o que tinha acontecido. E o
bondoso padre disse que, em sua caminhada pelas ruas de Aracaju, deparou-se com
um pobre trabalhador que usava sapatos velhos, ruins mesmo, e não se conteve:
passou-lhe seus sapatos novos em troca dos velhos. Meu tio, sentindo a
solidariedade aflorar na expressão do humilde conterrâneo, pegou novo par de
calçados e relutou para que o padre os recebesse. Somente depois de muita
conversa é que o bom Pedro concordou com o novo presente.
Mas foi a última vez porque, poucos dias depois, em passos
ligeiros, o Padre Pedro passava em frente à loja, usando as inseparáveis batina
preta e bolsa ao lado, calçando sapatos velhos e rotos.
E concluía meu tio:
- Esse era realmente um padre “santo”.
Aracaju, 29/06/2015
Beto Déda.
Texto e imagem reproduzidos do Facebook/Carlos Alberto Déda.
Postagem originária da página do Facebook/GrupoMTéSERGIPE, de 30 de junho de 2015.
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