segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

A ameaça da Luftwaffe


(Historinhas sergipanas)

A ameaça da Luftwaffe
Por Amaral Cavalcante.

A Polônia, primeiro pais vítima do maluco do Hitler na sua obsessão pelo trono do mundo, comeu o pão que o diabo amassou com os bombardeios da Luftwaffe. Ficaram os poloneses de então condicionados a procurar um abrigo anti aéreo, assim que ouvissem o estridor das sirenes. Vocês devem conhecer esta história, mas como foi que, muito após a guerra, veio o derrotado esquadrão aéreo do Terceiro Heich perturbar a paz dos sergipanos?

Pois eu conto:

O ex deputado federal José Carlos Teixeira, fundador da Sociedade de Cultura Artística de Sergipe, gozava de grande cartaz no governo central e no ambiente cultural do Rio de Janeiro, onde mantinha relações de amizade com artistas do teatro e da música erudita. O suficiente para incluir o Teatro Atheneu no roteiro das atrações internacionais que percorriam o país, em tournées patrocinadas pelo Ministério das Relações Exteriores. Foi um tempo áureo para o Atheneu, abrigando em seu palco grandes companhias de artes cênicas e seletos recitais com músicos mundialmente famosos..

Este é o caso de um pianista polonês de nome complicado - cheio de consoantes e ipissilones – que aqui chegou precedido de grande estalhardaço na mídia local. A nata social e administrativa compareceu em peso com seus trajes mais sedosos e suas jóias mais coruscantes, seus sapatos altíssimos compradios na loja Denier Cri. .

No centro do palco, sob a luz divinal de um estratégico refletor, brilhava majestosa a jóia da nossa coroa: o precioso piano Steinwey de meia cauda com fama de melhor do mundo, adquirido graças a um Livro de Ouro habilmente passado pelos fundadores da SCAS entre os ricos da época. Este piano, ainda hoje em uso, provocava upas e bravos dos músicos visitantes que não esperavam encontrar, por aqui, tão excepcional instrumento.

Batido o bastão o pianista entrou com escovada casaca e alvos punhos de renda. Frisson! O recital ia começar. Mas eis que, cumprindo a mais corriqueira tradição do Colégio Atheneu, o bedél Manelzinho acionou a estridente sirene que anunciava o final da última aula. Hóóóómmmmm!
O polonês ficou lívido. Olhou pro teto, balbuciou alguns vocábulos ininteligíveis e se jogou pra debaixo do piano, tremendo como vara verde.

O público não entendeu o que se passava no palco, mas todo mundo intuiu que algo estarrecedor estava prestes a acontecer, ameaçando, não somente o esperado deleite artístico como a segura tranqüilidade das melhores famílias sergipanas.

Precisou que o professor João Costa, homem de aguçado raciocínio e fleuma quase britânica, tomasse as rédeas da situação e nos explicasse, usando sua técnica irretocável de impostação vocal, que ocorrera ali uma demonstração tardia de trauma de guerra. Que o virtuose, ao ouvir a sirene, sentiu-se sob um bombardeio iminente da Lufetwaffe e que isso era normal entre os poloneses testemunhas da segunda guerra .

Ninguém contava era com a sirene de Manelzinho para aterrorizar o grande recital.

O pianista polonês foi devolvido ao hotel, ainda catando nica.

Postagem originária da página do Facebook/GrupoMTéSERGIPE, de 31 de janeiro de 2015.

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