A Grande Dama.
Por Petrônio Gomes.
Quando o saudoso Padre Pedro ainda estava entre nós,
frequentávamos a capela do Hospital Santa Izabel para a missa aos domingos, e
quase sempre tínhamos o prazer de levá-lo de volta para casa, mas era preciso
esperar até que ele visitasse os doentes. Ele não gostava que nos levantássemos
repetidas vezes durante a missa, e o trecho do Evangelho era quase sempre o
mesmo que ele tinha decorado. Entretanto, emanava de seus gestos e de suas
palavras aquela pureza que a todos cativava.
Depois, soubemos que também no Hospital de Cirurgia
poderíamos continuar cumprindo nosso dever de batizados e para lá transferimos
nossa visita, dessa vez nas tardes de sábado. Há qualquer coisa diferente entre
as pequeninas capelas dos hospitais e os templos da cidade que habitualmente
frequentamos.Talvez seja pelo fato de estarem elas no próprio recinto dos
nosocômios, onde reina a dor e mais se fala em esperança.
Dos fiéis, entretanto, o maior número consiste de visitantes
ou dos moradores próximos, geralmente pertencentes à faixa etária que prefere
cada vez mais a quietude, como nós, naturalmente.
Logo, nos habituamos com o celebrante oficial, que na
ocasião era o simpático Padre César, dos Salesianos. Depois da Missa, nós nos
cumprimentávamos silenciosamente e nos dispersávamos. Mas desejo aqui tornar
público o meu respeitoso cumprimento a uma senhora que também frequentava essa
mesma capela e nunca deixou de desejar-me um bom dia com um simples olhar. Era
uma dessas pessoas que suscitavam de nós uma reverência, logo à primeira vista.
Refiro-me à dona Maria Virgínia Leite Franco, digníssima viúva do ex-governador
do estado, Dr. Augusto do Prado Franco, e creio não haver necessidade de mais
nada acrescentar.
Por ocasião de nossas bodas de ouro, recebemos dela um
presente, um livro de meditações que já li e reli várias vezes e que se
encontra junto aos que não tenho vontade de me desfazer jamais.
Vi pela televisão a dolorosa cena em que dona Maria Virgínia
contemplava a face do seu filho Antônio Carlos, durante a longa vigília. Depois,
o sepultamento e, por último, a missa em sufrágio da sua alma. O mesmo drama em
três atos, como se um capítulo de nossa vida fosse para sempre arrancado do
livro e escrito em um compêndio separado.
Mas dona Maria Virgínia não tinha o seu pensamento apenas
naquele momento. César também estaria presente na sala, diante dos seus olhos
lacrimados, o outro filho que se fora no ano anterior. E preso ao leito, o
esposo, dr. Augusto, com quem já não tinha condições de dividir a dor imensa...
Certa vez, conversando com minha mãe a respeito desses
dramas que parecem preferir mais as mulheres para vergastar e maltratar, ela me
disse que muitas mulheres lhes pareciam aquelas “fortes do Evangelho”, mas nem
por um instante lembrou que ela própria era um desses exemplos de fortaleza
cristã, pois também sobreviveu à perda de dois filhos. Por sinal, o nome de
minha mãe era Judite.
Foi com pesar que ouvimos a notícia do falecimento desta
grande dama, a quem tive a honra de conhecer, assim como também ao Dr. Augusto,
de quem tenho uma fotografia de grande importância para mim, por ocasião de um
dos dias marcantes da minha vida.
A todos os familiares, nossas sinceras condolências, e a
ela, que a todos abençoava com o olhar, o adeus de quem também muitas vezes lhe
pediu em silêncio a sua bênção de mãe...
Postagem originária da página do Facebook/MTéSERGIPE, de 6 de Junho de 2014.
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