Amaral Cavalcante.
Os eleitos de Deus
Por Amaral Cavalcante.
Botei meu tênis de caminhada e fui passear na orla, para
desentravar as juntas e queimar a carga de carboidratos que acumulei nesses
três dias de feriado.
Andei até os arcos, cumprimentando a todos com um leve sinal
de cabeça, gozando da respeitável comiseração que têm os desconhecidos
transeuntes, por um velho senhor de cabelos brancos a caminhar tão faceiro
entre eles. Acompanhava-me o último livro de contos do amigo Antonio Carlos
Viana que eu venho lendo devagarinho, a cada página me surpreendendo com a
simplicidade do seu estilo. Sentamo-nos num banco sombreado ao lado do pensador
Manuel Bonfim que ressonava impassível na sua pose brônzea, indiferente aos
meus encantos com a literatura de Viana.
Na volta, como já era meio dia, resolvi almoçar no velho bar
Santo Antonio, um dos três últimos restaurantes “nativos” que sobraram na orla
e onde ainda se come um peixe fresco torrado no caco, de especial crocância e
sabor ancestral. Os outros dois reminiscentes dos velhos tempos são a Bar do
Joel e a Toca do Pinto, do Cabo Duda, no fim do calçadão, onde se pode
encomendar um repasto dos deuses e encontrar, vez por outra, os fantasmas de
antigos moradores da Atalaia contando potoca.
No “Santo Antonio” encontrei o mestre João Oliva com sua
indefectível bengala, acompanhado de familiares. Pois bem, do encontro deste
setentão com o octogenário João Oliva resultou uma gostosa conversa,
testemunhos de alguns momentos gloriosos e de desastres históricos, hilários e
estapafúrdios, na vida sergipana.
Mas o que mais me impressionou foi a inteireza física do
velho jornalista, sua prodigiosa memória e a graça com que arquiteta futuras
aventuras, lépidas viagens que pretende fazer para rever o mundo, como uma ida
próxima a Buenos Ayres para tomar um bom vinho nos cabarés portenhos ao som de
tangos, enquanto uma ragazza esbanja sensualidade nos braços do seu partner.
Foi um belo encontro numa mesa temperada com mútua
admiração. Ao sair de lá comentei com meus botões: ah! se Deus me quisesse
tanto bem...
AC., em 07/09/2015.
Postagem originária da página do Facebook/GrupoMTéSERGIPE, de 8 de setembro de 2015.
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